CRÓNICAS PLURICULTURAIS
139. O LIVRO IDEAL
- O senhor anda sempre à procura do livro ideal. Mas não existe.
Ramiro concordou.
- Foi uma frase genial. Nunca a esqueci, até hoje.
Anos e anos comprador e leitor compulsivo de livros, frequentava uma livraria, género biblioteca, bar e tertúlia, onde nos seus solilóquios mais íntimos desejava encontrar uma resposta à pergunta: “Qual o sentido da vida?”. Entenda-se: “o seu sentido último”.
De uma crença incondicional na literatura, ansiava por um livro que lhe desse a resposta, estabelecia prioridades e triagens nas suas consultas de escritos, leituras e compras, sentia-se a toda a hora insatisfeito, desarrumava livros já arrumados, deslocalizando-os e ordenando-os de novo, querendo arrumar o caos, o infinito, organizando-o e tornando-o finito.
Gostava de filosofia, tinha consciência da insuperável insuficiência do conceito de Deus, acreditando existir um muro entre o mundo divino e o humano. Os livros eram um meio de o ajudar a encontrar a explicação última de tudo.
Um dia, porém, ouviu de uma voz feminina, que o atendia e observava com regularidade, por entre uma miscelânea e enciclopédia de buscas, rebuscas e procuras insistentes, que não há um livro ideal.
- E é verdade. Nunca tinha pensado nisso!
Disse, Ramiro, abanando a cabeça.
Consciencializou, de vez, sermos imperfeitos e perfectíveis.
19.05.23
Joaquim M. M. Patrício