A FORÇA DO ATO CRIADOR
As fotografias de Erin O’Keefe são uma abertura à interpretação livre do espaço.
“For me the experience of the image is the meaning.” Erin O’Keefe In Erin O’Keefe & Lucas Blalock - AND/ALSO: Photography (Mis)represented
A arquiteta Erin O'Keefe (1962) revela que começou a interessar-se pelas questões relativas ao espaço através da fotografia. A fotografia é uma das formas de expressão mais mutáveis e de acesso muito fácil e constante. Cada vez mais a imagem fotografada constitui a maneira como se vê e se pensa o mundo.
A fotografia é assim, muito importante para Erin O’Keefe, porque em arquitetura, a experiência do espaço é feita sobretudo a duas dimensões. A memória que se tem da arquitetura é naturalmente construída através dos desenhos mas principalmente através das fotografias que aparecem nos livros e nas revistas. A perceção que se tem do espaço, em arquitetura, é sempre mediada por um filtro, por uma lente e por uma moldura que escolhe e que só mostra determinadas coisas e exclui outras. Por isso O’Keefe revela que a noção de espaço está continuamente pronta a ser modificada a qualquer momento - o entendimento do espaço está, deste modo, sempre disponível para ser subjetivado.
O mais estranho, O’Keefe sublinha, é que, muitas vezes, conhecemos um espaço melhor e mais facilmente através da fotografia. O espaço real apresenta-se muito mais complexo e vasto, tem um inesperado tamanho, tem pormenores imprevistos, tem interrupções súbitas. Porém, através da lente, o espaço aparece mais simplificado, sem escala, mais despojado e limitado - parece pertencer a um todo completo e acabado que é muito mais inteligível.
As fotografias de O’Keefe dividem o mundo em três camadas: os objetos, a lente e o observador. A camada da lente ajuda a manipular e a repensar a ordem espacial. Tal como numa pintura, o espaço da fotografia não tem de corresponder à realidade, não tem de necessariamente de funcionar, não tem de ser coerente. E é isso que Erin O’Keefe explora - a capacidade que uma imagem tem em ser ilusória ao mesmo tempo que capta objetos reais, palpáveis, que existem e que foram feitos para serem fotografados. Os objetos, numa imagem, comportam-se de uma determinada maneira que não corresponde à realidade. O'Keefe está interessada em descobrir e explorar, através da imagem, essas múltiplas relações que, num espaço, dois ou mais objetos podem ter entre si. As suas fotografias sustentam-se assim através da variável em compressão. A sua lente existe para capturar e congelar os objetos no espaço e explorar conceitos de cor, opacidade e sombra, mas também transparência, translucidez e reflexo.
As fotografias de O’Keefe são fragmentos enigmáticos visuais e são feitas para ficarem por resolver. São imagens que existem independentes do mundo real e que têm um conjunto de regras únicas e singulares. São quebra-cabeças inexplicáveis capazes de unir o pequeno ao amplo, a profundeza à planura, a espessura ao raso, o liso à rugosidade, o nivelado ao irregular, o recorte ao todo. Os seus objetos (ultimamente geométricos) são muito tácteis e pictóricos e por isso nunca se sabe ao certo se se está perante uma pintura uma colagem ou uma fotografia… É a lente que introduz a ambiguidade. A superfície plana da fotografia reduz os objetos e a perspetiva a duas dimensões e causa a dúvida. A experiência da imagem assim como a provocação incerta dos objetos no espaço é o que mais interessa a O’Keefe.
Ana Ruepp