A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
CII - COMO VEÍCULO UNIFICADOR EM DIVERSIDADE CULTURAL E LINGUÍSTICA
A dimensão estratégica da língua portuguesa decorre de ter sido capaz de atravessar espaços geográficos deslocalizados territorialmente por quatro continentes, via descontinuidade linguística (língua transcontinental, transoceânica, transatlântica, transnacional), ser partilhada por várias culturas que a democratizaram, enriqueceram e moldaram, dando-lhe novas colorações e valor acrescentado, como língua absorvida, apropriada, enriquecida, miscigenada, incorporando vocábulos africanos, ameríndios, formando crioulos ou protocrioulos (língua transcultural, dinâmica, migratória, mestiça), permitindo-lhe ser permanentemente atuante e viva (língua flexível e dotada de plasticidade), transitando de uma língua de comunicação internacional (de falantes de português como língua materna ou oficial) para uma língua de comunicação global (como idioma de exportação que vai para além do espaço geolinguístico e lusófono da língua portuguesa).
Sendo uma língua global, um diassistema, une povos que a usam como um veículo unificador de um dizer, assumindo-se como um vetor estratégico para todos os que por ela comunicam, não só como fonte crucial de apreensão e interiorização de um modo de vida, de agir e pensar, mas também de afirmação cultural e identitária. Registe-se, no Brasil, ter levado à unificação de um país continental. Ter sido essencial na unificação e pacificação de Angola e na afirmação de soberania em Timor Leste.
Por sua vez, a existência de um idioma comum não equivale a uma inevitável nivelação das diversidades culturais e linguísticas próprias da cada um dos espaços que integram organizações como a CPLP, devendo promover-se e consolidar-se a unidade na diversidade, privilegiando o que é comum quando imprescindível, sem esquecer a heterogeneidade. Exemplos ilustrativos da não incompatibilidade do português como idioma oficial e comum a nível internacional, por confronto com falas locais, é a constatação, na primeira década deste século, do reconhecimento de quase duzentas línguas vivas no Brasil, quatro dezenas em Angola e Moçambique, 20 na Guiné-Bissau, 19 em Timor Leste, 4 em São Tomé e Príncipe e 2 em Cabo Verde (a que acresce o mirandês em Portugal).
23.06.23
Joaquim M. M. Patrício