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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

ANTOLOGIA

  


NO DESERTO CRESCE O MEU DESEJO
por Camilo Martins de Oliveira 


Meti a última carta do Marquês de Sarolea à Princesa de... pelo meio das outras - daquelas que já publiquei e das que irei publicando - por razões difíceis de explicar, a menos que me atreva a revelar uma intuição minha. Vale o que vale, mas cuidei de ver se seria ligeira ou temerária; creio que não é, antes se foi afirmando ao meu "pensossinto" (como diria Camilo Maria)... Ao reler, à luz dessa última carta (a que só mais tarde tive acesso), não só todas as que foram enviadas, como as endereçadas a "Minha Princesa de mim" e que nunca seguiram, ocorreu-me o sentimento fortíssimo de que a Princesa de... era, sim, a destinatária de todas as confidências, mesmo daquelas que se refeririam a outra (outras?) mulher. Camilo Maria - que era metódico e pontual - não gostava de viver no tempo. Considerava a sua circunstância, e comportava-se nela com o respeito devido aos outros e, sobretudo, aos seus próprios compromissos, mas criara para si um espaço de liberdade interior, onde respirava e vivia fora do tempo... Tudo o que aqui digo se encontra, latente ou patente, conscientemente escrito nas suas cartas. Nunca se casou com a "sua" Princesa, nunca viveram juntos, e só eles poderiam saber das intimidades que pudessem ter tido. Ele nunca falou disso, aliás era discreto e, apesar de ser homem por quem - dizia-se - muitas senhoras teriam caído, nunca ninguém lhe ouviu uma insinuação, um canto de galo. Conhece-se-lhe o fundo desgosto que lhe deu a morte prematura do filho único, e o amor carinhoso com que nunca faltou a sua mulher, cedo levada por essa grande dor que, de uma ou de outra maneira, um dia toca a nossa vida. Mas cartas de amor... não sei se escreveu outras! Só lhe conheço estas. Soam-nos no coração como confissões íntimas, ou como se fossem ditas no impulso de um mergulhador quando chega à tona de água e abre a boca. É certo que falava de tudo, tudo lhe interessava e gostava de partilhar. Mas quando falava de si, dirige, a uma única pessoa, lembranças, sentimentos, visões, esperanças íntimas, coisas que se poderiam ter passado ou ser ditas a outras, mas ele só sabe dizer à que, ele mesmo, chamou "misterioso, inesperado encontro"... Era, ou não era, essa pessoa, a destinatária das cartas? Recebeu-as pelo correio, certamente: a ela eram endereçadas. Tê-las-á recebido na alma? Terá a Princesa entendido que aquele amigo lhe dizia: "Preciso de ti, não sei porquê, pus em ti uma confiança essencial à comunicação que sempre quis ter e nunca alcancei..." Com esta confissão, começava Camilo Maria uma carta cronologicamente anterior à última que enviou à "Minha Princesa de mim". E continuava: "Despi-me, para ti, de qualquer defesa e, por ti, cobri as distâncias todas que me deixariam invulnerável. Eis-me. Não escondo, não minto, não disfarço, não calculo, não peço compensação. Espero, como quem grita nas montanhas do meu Tirol e aguarda o eco. Amor é o nome que damos ao que não tem idade e vem da fé cuja esperança é a recompensa invisível, que não se merece nem obriga. Nasceu connosco, no coração da existência. Como condenação a não sermos condenados. O amor humano é procura e sinal. Como no "Cântico dos Cânticos", poderia dizer-te o grito que lanço a Deus:

"No deserto cresce o meu desejo,
por ti tantas vezes destemido.
És a minha fome e o meu pedido
de ver-te, Senhor, a quem não vejo...

Minha sede é seres, e só procuro     
a fonte da sede que me dás: 
no desejo de ti, vivo e duro, 
na sede da sede que me traz

este deserto em que sou  despojo,
lixo de ser graça do teu nojo...
Esqueleto ebúrneo me levanto,

branco de areia, de morte e espanto,
e de mim te grito a minha fome!
E sei que te chamo pelo teu nome!"


Ecce homo! Mas ele não é o que a turba vê, ou julga ver. É, tão simplesmente, esse pobre de tudo que os olhos do nosso coração poderão acolher no coração de Deus. Recordo os versos finais da "Elegia do Amor", do poeta português Teixeira de Pascoaes, que o Alberto proclamava ser o mais lindo poema de amor do mundo: "Vivo a vida infinita, / Eterna, esplendorosa. / Sou neblina, sou ave,/ Estrela, azul sem fim, / Só porque um dia, tu,/ Mulher misteriosa, / Por acaso, talvez, / Olhaste para mim." Depositada esta carta de Camilo Maria, corro a outras, que contam factos do mundo exterior e mais maravilhas.      


Camilo Martins de Oliveira

 

Obs: Reposição de texto publicado em 06.08.13 neste blogue.

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

  


152. ALEGRIA NA ARTE GÓTICA E RECOLHIMENTO NA ARTE ROMÂNICA


A infância, juventude e a idade adulta plena precisa de expandir-se, correr, gritar, perguntar, rir, saltar, indagar mil e uma coisas, numa curiosidade gradual e permanente, num sucessivo otimismo alegre, em paralelo com a visualização de contentamento e abertura que inspira igrejas, basílicas e catedrais góticas, apelativas e monumentais, chamativas e majestosas, glorificando o divino e a criatividade humana, em deslumbramento e magnitude, num processo engenhoso de requintado gosto e leveza, com rosáceas radiantes e pináculos esguios a encimar torres e flechas pontiagudas, querendo rasgar o azul do céu, em vozes e preces flamejantes.


A terceira idade e velhice (“a melhor idade”?) apela ao recolhimento, descanso, silêncio, fuga ao ruído, dada a sua longevidade, maturidade e experiência de vida, menor responsabilidade familiar e social por objetivos já cumpridos, em paralelo com o minimalismo, simplicidade, devoção e ambiente fechado que inspira igrejas, basílicas e catedrais românicas, recorrendo a uma maior espiritualidade e proximidade com o sagrado, o transcendente, dadas as suas caraterísticas mais intimistas, convidando ao meditar e à prece num espaço de familiaridade, numa certa obscuridade interior alheia ao deslumbramento. 


As góticas espalharam-se pelas cidades, onde viviam as pessoas mais ativas e empreendedoras, na idade mais criativa da vida, as românicas pelos campos e espaços rurais em sinal de recolhimento e oração, tendo como referência as ordens monásticas da época, num sentido menos alegre e otimista da vida terrena no seu fim. 


A arte românica, como arte séria, quiçá pesada, com a sua funcionalidade de fim religioso, apela à meditação e ao recolhimento, que as sombras crepusculares do interior dos seus templos acentuam, onde os crentes podiam ler, meditar, orar e comunicar com o divino, através da “bíblia dos pobres”, mesmo ignorando o alfabeto, lembrando o crepúsculo e o poente da vida, o seu entardecer e anoitecer.


A arte gótica, cheia de luz, incluindo os seus vitrais litúrgicos, presta-se à contemplação e à observação, à plenitude e força, cuja monumentalidade, possibilitada pelo florescimento comercial europeu e urbano, apela ao florescer, maioridade e inteira maturidade da vida.     


Sem esquecer que apesar da sua desunião religiosa, a Europa conservou sempre a sua unidade cultural, sendo certo que além das funções religiosas as catedrais também desempenharam funções civis, aí funcionando escolas de música, leitura, escrita, gramática, lógica e retórica, exercendo-se a justiça nos seus átrios, gozando os seus pórticos do direito de asilo.           


Entre teocentrismo e antropocentrismo, entre uma conceção espiritualista em que o Divino é o centro do universo e o Homem circula em seu redor, e uma conceção materialista em que o Homem se endeusa como a mais perfeita criatura divina e obra suprema de Deus, sendo o centro de tudo, o mesmo sucede, em similitude, com o românico e o gótico.         


Era, e é, a arte, a um tempo simbólica e realista, entrelaçada à vida e aos sentimentos humanos, em coexistência com a religião e as fases da nossa existência terrena e incertezas que permanecem após a morte cujo significado, em absoluto, desconhecemos.


29.08.23
Joaquim M. M. Patrício

CRÓNICA DA CULTURA

Há que aprender a liberdade


Averiguar por nós próprios o que incapacita os porquês é saber o que pode ser alcançável.

O que cada um de nós pode e deve fazer para que se concretize a liberdade, é em si um movimento histórico ao bem-estar humano.

Os tempos destituídos de opções reúnem homens com as mesmas desvantagens, os mesmos ressentimentos subjacentes à infelicidade e à cegueira interior, e permitem o acesso ao poder dos que cavalgam as suas injustiças e guilhotinam aspirações.

Aprender a liberdade, é detetar o reaparecer das bolorentas ordens com pessoas diferentes e desigualdades iguais.

Afinal, tão só ligeiras variações, e o escalar das grandes mentiras pode continuar a ter sucesso.

Então, é a mesma vida submetida que persiste, é aquela que nunca assume o comando do sonho. Aprender a liberdade é uma jornada de vida fecunda: uma defesa apaixonada da humanidade.

Numa era de profunda incerteza dos próprios recursos dos homens, e aqui chegados, queremos que nos controlem ou desejamos algo melhor?

Pensar, e a liberdade de poder transmitir o pensar, poderá ser a melhor definição do «indivíduo ligado em rede».

 

Teresa Bracinha Vieira

A FORÇA DO ATO CRIADOR

  


A profundidade do espaço urbano começa no momento em que o espaço interior se transforma em espaço exterior.


“.. Architecture produces desire. The exhilaration we find when we walk into the space between or inside certain buildings produces a kind of psychological space. It can represent an experience we never had before and want to see more of.”, Steven Holl (Holl 2008, 29)


Steven Holl no livro “Urbanisms. Working with doubt”, escreve que a dúvida deve fazer parte de um projeto urbano. É a dúvida que suspende o absoluto e a perfeição e que permite a construção de sistemas mais dinâmicos e abertos. Steven Holl é da opinião de que o poder experimental das cidades não pode ser completamente racionalizado, deve sim ser estudado subjetivamente.


A subjetividade associada assim à dúvida pode ajudar a recuperar a importância de características fenomenológicas no contexto urbano. São o espaço, a matéria, a luz, a cor e o som que acentuam e incentivam as perceções de cada indivíduo e podem dar profundidade à realidade objetiva.


A experiência urbana cheia de contradições e incoerências pode, deste modo, ser imensamente enriquecedora para o ser humano. Para Steven Holl, a verdadeira tarefa do urbanista deve sobretudo acentuar valores relacionais e de conexão, de maneira que a arquitetura de pequena escala possa ser o elemento primeiro, apto a gerar essas necessárias ligações.


Steven Holl explica que é a arquitetura que tem a capacidade de envolver e de introduzir diferentes dimensões ao espaço. A profundidade do espaço urbano começa no momento em que o espaço interior se transforma em espaço exterior, na ocasião em que a circunstância se converte em algo intrínseco e interno. É a flexibilidade, a complexidade e a metamorfose espacial que aumentam e potenciam a expansão de cada indivíduo. Assim que a arquitetura é incomensurável, sem limites conhecidos e aceita justaposições, possibilita que o espaço tenha sempre a capacidade de se tornar e de vir a ser - será espaço em potência.


Para Holl, a arquitetura deve assim ser porosa, em que espaço e movimento se interpenetram constantemente. A arquitetura objeto, sólida, estável e maciça deve dar lugar a fenómenos experienciais diversos e a sequências espaciais independentes de qualquer direção. Através do tempo, é a arquitetura que permite o encontro - livre, experimental e verdadeiro - do indivíduo consigo próprio, com outros indivíduos e com o mundo que o rodeia.


“The recognition of spatial and material phenomena meets the imagination.” (Holl 2008, 29)


Ana Ruepp

O GÉNIO DA LIBERDADE

  


Jacques Julliard, historiador, pensador político e jornalista morreu com 90 anos. Conheci-o em meados dos anos oitenta, acompanhei-o quando então veio a Portugal para apoiar Mário Soares e segui o seu percurso de pensamento e ação, como editor com Pierre Nora, enquanto braço direito de Jean Daniel no “Nouvel Observateur” e nos últimos anos como editorialista da revista “Marianne”. Tal como Jean-Marie Domenach, saudoso amigo comum, prezou, desde cedo, a influência de Charles De Gaulle e de Pierre Mendès-France. Parecendo uma herança contraditória, o certo é que a defesa da democracia, como sistema de valores e não apenas como um processo de escolha dos governos, deu coerência a essa convergência. Assim, ao longo do tempo, foi chamando à atenção para a importância da história política. “O fim previsível da civilização do trabalho (dizia em 1990) e a sua substituição progressiva por uma organização social que permita aos homens encontrar-se de novo, fazem parte da lógica da evolução do sistema, o sistema industrial e capitalista, sobre o qual todos os grandes teóricos sublinharam o caráter transitório. A dura lei da eficácia, a mobilização de todas as energias para realizar rapidamente a acumulação primária dos instrumentos do poder e a tensão obsessiva para um fim único representam na história da humanidade uma experiência sem precedente, cujos adquiridos são provavelmente definitivos”. No entanto, será necessário mudar, lembrando os benefícios auferidos. Contra a ideia de fim da história, haveria que compreender que vivemos o termo de uma história iniciada nas cidades mercantis da Flandres e da Itália do Norte, devendo compreender-se a importância da consciência social, da liberdade e do reconhecimento mútuo numa sociedade em mudança.


Com a morte do comunismo de 1989, o capitalismo foi chamado a repensar-se, visando o desenvolvimento humano. Por isso, o mundo das ideias tem de defender a verdade (em lugar da pós-verdade) e o primado dos direitos humanos, em vez de nos tornarmos escravos das nossas paixões e cúmplices da tirania e do despotismo. Estudioso e militante dos movimentos sociais, com Michel Rocard, Pierre Rosanvallon e Patrick Viveret, foi um dos teóricos da chamada “segunda esquerda”. Premonitório na apresentação de novas linhas para o contrato social, capazes de compreender a “procura de sentido”, os desafios das tecnologias de informação e comunicação, da digitalização, da ecologia integral, da prevenção da destruição do meio ambiente, bem como da defesa da equidade intergeracional, Julliard deixou-nos as bases para uma cidadania inclusiva assente em instituições mediadoras participativas fundadas na “igual dignidade” e no “génio da liberdade”.  Como disse em “La Faute à Rousseau” (1985): “A combinação do sistema de partidos com o sufrágio universal como processo de designação dos governos não é totalmente satisfatória. Certamente que não será substituída de um dia para o outro, mas é urgente completá-la com outros procedimentos. Senão, caminharemos inevitavelmente para um governo não controlado de especialistas, no sentido próprio do termo, para uma tecnocracia”. Rousseau, ao basear-se na “vontade geral”, distinguindo-a da vontade de todos, não deu, porém, valor suficiente ao facto de o Povo não ser uno, mas múltiplo. E a soberania popular tem de o considerar. A valorização da singularidade e da complexidade tem de se fazer em democracia, superando o dilema do cidadão de Genebra entre o individualismo de “Emílio” e o societismo do “Contrato Social”.  Eis por que razão o “Génio da Liberdade” se torna essencial, demarcado do neoliberalismo formalista, e compreendendo o que nos ensinaram Alexis de Tocqueville e Norberto Bobbio – sobre a importância mediadora da sociedade civil e da legitimidade do exercício e sobre a incindível relação entre a liberdade igual e a igualdade livre. 


GOM

A VIDA DOS LIVROS

GOM _ A Vida dos Livros.jpg
  De 25 de setembro a 1 de outubro de 2023

 

Homenagear hoje Eça de Queiroz é reconhecer o lugar cimeiro que o autor de “Os Maias” tem na cultura da Língua Portuguesa e não apenas no Portugal europeu.

 

Eça de Queiroz .jpg

 

DEMONSTRAÇÃO DE GRANDEZA

Quando lemos nas “Notas Contemporâneas” o artigo de Eça de Queiroz sobre “Os Grandes Homens de França”, escrito em 1892 na “Gazeta de Notícias”, encontramos um exercício de fina ironia que demonstra as qualidades do extraordinário prosador. Do que se trata não é de um juízo sobre o futuro, mas de uma crítica relativamente à procura artificial de grandes homens, como se tratasse de um jogo ou de um inventário de celebridades… Tem sentido a lição do autor de “A Ilustre Casa de Ramires”, distinguindo o reconhecimento do valor da cidadania e da contribuição para o bem comum da cultura de uma qualquer feira de vaidades. Falando de Vítor Hugo, Eça diz apenas que “a demonstração fica sujeita a dúvidas, a contestações, a protestos. Fica sobretudo incompreendida pela multidão. Vítor Hugo, pelo menos, é um grande homem – que não necessita demonstração”. Assim ocorre com os realmente melhores, que merecem o nosso reconhecimento. Uma leitura inteligente deste texto permite compreender que as sociedades têm o direito e o dever de reconhecer aqueles que se destacam e constituem exemplo para todos. E cabe a quem pensa e não abdica de ter sentido crítico afirmar, como fez Eça de Queiroz, de modo claro que o reconhecimento obriga a homenagear os melhores como exemplos e com um critério que não se confunda com um exercício ilusório sobre glórias passageiras e vãs.

Compreendamos assim o que o crítico nos quis dizer. Tem razão o reparo sobre a busca frenética de “grandes homens”. Não é disso que se trata quando afirmamos que o reconhecimento dos melhores tem de ficar demonstrado por si mesmo. Por isso, há muito considero que faz sentido o reconhecimento de Eça de Queiroz no Panteão, pelo que fez e pelo que nos legou como exemplo maior para a cultura da língua portuguesa. Haverá outros, certamente, mas importa fazer justiça e destacar este exemplo, já que uma sociedade se afirma e valoriza escolhendo quem não precisa de demonstração. A decisão de homenagear num edifício próprio e com um estatuto especial ilustres figuras portuguesas é apanágio das sociedades antigas, que aprendem a valorizar as suas raízes. Em 1836, o então ministro do Reino Passos Manuel decretou a edificação de um Panteão Nacional ainda sem local definido. O objetivo era dignificar os heróis que tornaram possível a Revolução liberal de 1820 e o início do constitucionalismo. E assim seria possível reerguer a memória coletiva de grandes referências que não poderiam perder-se no esquecimento, como, por exemplo, Luís de Camões. O Panteão Nacional destina-se, assim, a homenagear e perpetuar a memória dos portugueses que se distinguiram por “obras valorosas”, por serviços prestados ao País, pelo exercício de altos cargos públicos, altos serviços militares, na expansão da cultura portuguesa, na criação literária, científica e artística ou na defesa dos valores da civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade. As honras do Panteão podem consistir na deposição, dos restos mortais dos cidadãos distinguidos ou na afixação de uma lápide alusiva à sua vida e à sua obra.

 

CONTRA QUALQUER BANALIZAÇÃO

Para impedir qualquer banalização, urge garantir o que preocupava o próprio Eça, escolhendo quem não precisa de demonstração. Em Portugal, o estatuto de Panteão Nacional está atribuído ao antigo templo de Santa Engrácia em Lisboa e ao Mosteiro Santa Cruz em Coimbra, onde se encontram os túmulos dos dois primeiros reis de Portugal - D. Afonso Henriques e D. Sancho I. No primeiro destes monumentos estão sepultadas diversas personalidades da história portuguesa: quatro Presidentes de República, Teófilo Braga, Manuel de Arriaga, Sidónio Pais e Óscar Fragoso Carmona; e ainda Almeida Garrett, João de Deus, Guerra Junqueiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Humberto Delgado, Aquilino Ribeiro, Amália Rodrigues e Eusébio da Silva Ferreira. Estão ainda recordados, através de “cenotáfios”, os nomes de seis figuras históricas: Nuno Álvares Pereira, Infante D. Henrique, Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Afonso de Albuquerque e Luís de Camões. O mosteiro dos Jerónimos, que funcionou provisoriamente como Panteão, antes de Santa Engrácia estar completada, não tem hoje esse estatuto formal, ainda que tenha os túmulos de Vasco de Gama e de Luís de Camões, na nave do templo, e do historiador Alexandre Herculano, na antiga Sala do Capítulo. Em 1985 o corpo de Fernando Pessoa foi transladado para o Claustro dos Jerónimos, sendo o seu túmulo da autoria de Lagoa Henriques. Importa ainda dizer que em Lisboa, no templo de S. Vicente de Fora, encontra-se o Panteão Real da Dinastia de Bragança, de natureza diferente, onde se encontram sepultados em número significativo os membros da família que reinou após a Restauração de 1640.

Desde a antiga Grécia e depois em Roma, a palavra Panteão designava o templo onde se honravam os vários deuses com culto reconhecido. A palavra é grega e significa literalmente “todos os deuses”. Em Roma, o Panteão que chegou aos nossos dias é uma homenagem ao cônsul Marco Agripa (63-12 a.C.), que o mandou construir em 27 a.C. No ano 80, foi praticamente destruído por um incêndio. Quatro décadas depois, o imperador Adriano (76-138) ordenou a sua reconstrução. Foi o cristianismo que, em virtude da doação de um rei bizantino ao Papa Bonifácio IV no século VII, salvou o monumento da pilhagem e da destruição, adotando o orago de Santa Maria e Todos os Santos. Já no Panteão de Paris, as obras para construção foram iniciadas em 1764, sob encomenda de Luís XV, em ação de graças por ter recuperado de uma grave enfermidade. O templo apenas foi concluído em 1790, depois da Revolução tendo sido então transformado num edifício secularizado, com a função de homenagear os vultos da França que se notabilizassem. Então o Panteão passou a funcionar como lugar de homenagem reconhecida da Pátria aos melhores dos seus filhos. Também na Abadia de Westminster, em Londres, estão sepultados grandes vultos britânicos como William Shakespeare, Isaac Newton e Charles Darwin. É assim a partir duma tradição religiosa e secular que foram criados os Panteões Nacionais. Os modernos Panteões nascem, pois, de uma tradição antiga de raízes heterogéneas, desde o paganismo ao secularismo, passando pela dimensão religiosa. Trata-se, em qualquer caso, de honrar os melhores através do reconhecimento dos cidadãos. É este o espírito que hoje devemos recordar. Eça de Queiroz é uma referência fundamental nas culturas da língua portuguesa, correspondendo a sua presença entre os nossos maiores no Panteão Nacional a um ato de elementar justiça, não um mero gesto formal, mas como apresentação de um exemplo para todos. Um reconhecimento de justiça.  

 

Guilherme d'Oliveira Martins

POEMS FROM THE PORTUGUESE

POEMA DE BÉNÉDICTE HOUART 

  


há colares que são coleiras


há colares que são coleiras
há mulheres que são cadelas
certos homens, cães raivosos
os cães propriamente ditos
não foram para aqui chamados
embora metam o nariz em todo o lado
farejando coisas imaginárias
e, de resto, não falam, ladram
têm com certeza razão


in Vida: Variações, 2008


some necklaces are collars


some necklaces are collars
some women are bitches
certain men, rabid dogs
dogs themselves
have no business here
though their noses cover the ground
sniffing imaginary things
and besides they don’t speak, they bark
they must be right


© Translated by Ana Hudson, 2012
in Poems from the Portuguese

 

ANTOLOGIA

  


CINZAS DE VERÃO
A PALAVRA DE JOÃO BÉNARD DA COSTA


1 - 
1 de outubro. Para mim, os anos começam sempre a 1 de outubro. 1 de janeiro é só o menos estimulante dos dias da quadra do Natal, uma espécie de cinzento P.S. (vale para "post-scriptum") do Dia do Menino Jesus. 

Aos mais novos recordo que, nos meus tempos, era a 1 de outubro que recomeçavam as aulas, após as férias que nos anos sem exame (e dos sete do liceu, quatro eram anos desses) se espraiavam docemente entre 14 de junho e 30 de setembro, dia dos anos da minha avó. Para mim, espraiavam-se literalmente entre 1 de agosto e 28 ou 29 de setembro. 1 de agosto era o dia da viagem, entendendo-se por viagem o percurso entre o nº 86 da Avenida António Augusto de Aguiar, em Lisboa, e a Villa Raul na Arrábida. Os quilómetros (46) não encolheram com o tempo, mas sem pontes sobre o Tejo (travessia em "ferry-boat"), camioneta de Cacilhas para Azeitão e mais camioneta de Azeitão para a Arrábida, o percurso era coisa para quatro, cinco horas a que se somavam as horas de espera pelas mencionadas carripanas, exclusivo de João Cândido Bello. Cedo erguer em Lisboa e pôr do sol na Arrábida, onde, felizmente, havíamos sido precedidos pelas criadas, que já tinham posto a casa mais ou menos em condições. Tudo era diferente, nos rituais do quotidiano. Não havia luz elétrica, a água provinha de uma cisterna e era levada em jarros para os quartos e respetivos lavatórios. Não havia telefonias nem telefones, não havia cinemas nem lojas. Havia a praia e os banhos, os passeios na serra. Um silêncio total. Regressar a Lisboa era passar do século XIX ao século XX. A surpresa de carregar num interruptor e fazer-se luz, da água a jorros, do telefone a tocar. À noite, na cama, eu ouvia os silvos dos comboios de Entrecampos e não mais a nortada a fazer ranger as madeiras das portas e dos tetos. Um ano acabara, começava outro, ao reencontrar (ou perder) colegas e professores nos pátios e nas aulas do Liceu Camões. Nunca mais via os primos e as meninas do Verão. Até outro Verão. Mas não o Verão, como eu não o via, com os mesmos olhos. O tempo ainda não passava a correr e um ano na adolescência é maior do que a légua da Póvoa. Nesse tempo, é que a vida eram literalmente dois dias: os dias do Inverno e os dias do Verão. As coisas então mais importantes para mim também se contavam a dois: os dias do campeonato de futebol e os dias sem campeonato, começou a época, acabou a época. Havia, no defeso, alguns sucedâneos (a Volta em Portugal em bicicleta, por exemplo), mas não era nada a mesma coisa. As temporadas dos cinemas: os grandes filmes chegavam em outubro e desfilavam até junho-julho, quando começam as "reprises". No Verão, muitos cinemas fechavam enquanto os anúncios anunciavam: "Temporada de 1949-50". Havia os amores de Verão e os desamores do Inverno, e só mais tarde começou a ser vice-versa. Havia os pecados de Lisboa e os pecados da Mata Coberta. Havia as missas em capelas de casas ou grutas particulares e havia as missas de S. Sebastião da Pedreira ou do Patronato. Havia um eu de Inverno e um eu de Verão. Como é que eu posso dizer que o ano não começa a 1 de outubro?


2 -
 É fácil darem-me cabo do sofisma. Afinal de contas estou a falar da infância e da adolescência e, descontando os anos sem memória, anos desses, em que a vida eram dois dias, não devem ter sido mais de 12. Numa contabilidade feita de hoje, é menos de um quinto da minha vida consciente, ou supostamente consciente. Como é que faço regra de tão breve exceção? 

Penso que o cinema tem alguma coisa a ver com isso. Afinal de contas, a Cinemateca sempre fechou para férias em agosto. Quando reabre, costumo eu tirá-las e só a 1 de outubro retomo a plena "existencialidade" dela ("existencialidade" ou "essencialidade"?). Mesmo os Agostos em Lisboa, se nada têm que ver com os Agostos de outrora, não são como os outros meses. As salas de cinema estão fechadas, os portões da Barata Salgueiro fecham às 20h, é preciso sair ou reentrar por outras portas. Se os Agostos da cidade já pouco se assemelham ao que me contavam de outras eras ("Lisboa, em agosto, sem a família, é melhor do que Baden-Baden", contava-se que contavam) são, mesmo assim, bastante mais tranquilos do que os outros 11 moradores do calendário. Como em tudo, a diferença tornou-se mais pequena, mas ainda existe e para alguns continua a ser saborosa. De setembro pouco vos posso dizer. Hoje, como ontem, é mês em "off" noutros "in". Mas a 1 de outubro, sim. A 1 de outubro tudo recomeça e prometo a mim próprio e aos outros a promessa de sempre: "Demain je serais sage."Por exemplo, prometo aos leitores do PÚBLICO que para o próximo Outubro não escrevo mais chaladices destas. Ocupar-me-ei com o devido vagar de um discurso do Presidente da República (fez um dos melhores e mais urgentes discursos dele no dia 30) ou de um político da cena internacional (dia 30 também foi o dia de Blair).


3 -
 Mas não estou tão desacompanhado quanto isso nesta crença outubral. Bem sei que a tendência dominante é para o 1 de setembro, mas setembrar ou outubrar não é o mais importante. O que mais conta, nos nossos ritmos e nas nossas rimas, é esta vontade de partir o ano ao meio, não onde manda o calendário, mas onde nos mandam o sol, a lua e os apetites. E aí basta ver por tudo quanto é sítio. Das omnipotentes televisões aos menos lidos jornais, não há quem não faça a sua época estival, mais "silly" ou menos "silly", conforme os usos e os poderes. Por exemplo, aprendi alguma coisa com uma dessas "especialidades" do Verão deste ano, no caso em questão a do "Diário de Notícias". O jornal retomou, em versão livre, o célebre "questionário de Proust", assim chamado só porque Proust lhe respondeu duas vezes. 

Nas respostas deste Verão reparei numa recorrência que me deu que pensar. À pergunta: "Qual o defeito que lhe inspira maior indulgência", houve, é certo, a resposta genial de Agustina ("o amor"), mas uma significativa percentagem (não fiz estatísticas) respondeu com a estupidez ou a ignorância. 
Que a estupidez seja um defeito é discutível (embora um amigo meu, católico, não hesitasse em a considerar um pecado, e mesmo o único pecado veramente mortal), mas que, sendo-o, seja, hoje, tão genericamente desculpável, deu-me que pensar. A condescendência - ou compreensão - com a ignorância ainda mais. Nunca fui muito nessa conversa de "gerações rascas" ou coisas quejandas. Mas quando tanta gente, nova em anos, se mostra tão tolerante com a estupidez e com a ignorância, pergunto-me se alguma coisa mesmo não se está a passar. "Morte à inteligência" foi um grito horrível ouvido há menos de um século nesta mesma península. Ficou para a História a resposta que teve. Essa história e essa História serão as mesmas habitadas pelos doces domesticadores da estupidez? Já estávamos habituados aos insultos aos "pseudo-inteletuais" na boca de qualquer desgraçado que não se sentia amado nem compreendido e sobretudo não compreendia nem amava o que "essa gente" fazia. Será necessário dar vivas à estupidez ou à ignorância? 
Lembro-me de um filme de 1994 - "Forrest Gump" chamava-se - em que o herói (Tom Hanks) era uma espécie de atrasado mental, que só tinha uma pálida ideia dos problemas e conflitos americanos ou mundiais. O filme retratava-o como um típico produto do que se chamou a "baby boomer generation", a que foi dominante entre a ascensão de Elvis e a queda de Nixon. Mas aquilo que no livro (de Winston Groom) serviu de base ao filme - uma sátira, mais ou menos verrinosa, contra essa geração - transformou-se, no filme de Zemeckis, numa apologia do "pobre de espírito", que triunfava, porque milhões de americanos se achavam iguais a ele e queriam que a América e o mundo fossem de homens como ele. Quando vi o filme, tive o primeiro prenúncio que aquele personagem não representava um tempo passado, mas um tempo futuro. O êxito desse elogio à estupidez deixou-me perplexo. Mais ano menos ano, não iria nova minoria reclamar direitos e a comemoração do Dia do Estúpido? Estúpido fui eu, porque, infelizmente, essa minoria é maioritária, na América ou em qualquer outro país. Quando as maiorias se unem, sobretudo em épocas globais, adivinham-se os resultados. 
Em Portugal, sem querer tomar tão pequena parte pelo todo, fiquei a saber que muitos se não incomodavam nada (ou se incomodavam pouco) com a ignorância e a estupidez alheias. "Deixa-os pousar", como se dizia antigamente na velha história do galo e dos abutres? Talvez seja pior. Porque, olhando o "Diário de Notícias" de 28 de setembro, vi, na reportagem da chamada "marcha branca" (convite tendencial a almas pacíficas e misericordiosas) um cartaz que pedia para os pedófilos castração e prisão perpétua. Um grupo de monstros infiltrado entre os manifestantes e que os organizadores não puderam controlar? Ficava mais descansado se fosse assim. Porque o mais provável é que nem maus sejam. Que sejam simplesmente ignorantes ou estúpidos, ou as duas coisas ao mesmo tempo, a mais explosiva mistura humana que imaginar se pode. E isso é, de tudo, o que mais me assusta. 
Resta-me esperar que sejam as últimas cinzas de Verão e não as primeiras chuvas de Inverno.


3 de outubro 2003, in Público

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

  


151. A ORALIDADE, A LITERACIA E O VISUAL 


No princípio era o verbo e a oralidade da palavra falada foi anterior à escrita e ao visual.

Na sua oralidade, a palavra falada é um fenómeno natural, instantâneo, um produto da nossa evolução biológica, podendo nós, humanos, viver sem ler e escrever, por isso mais abrangente que a escrita e o visual.

A palavra escrita e o visual são fenómenos culturais, exigem instrução, destinam-se e propõem-se a vencer o tempo e o espaço, nomeadamente através da imprensa, do livro, do cinema, filmes, séries, documentários.   

Se sempre se entendeu que para se ser civilizado tem de se saber ler, escrever e contar, sendo insuficiente a oralidade, qual o papel que o visual aí desempenha em termos civilizacionais?

Vivendo numa sociedade que converte a vida das pessoas em espetáculo, numa espécie de ecrã global em que a maioria quer aparecer a qualquer custo, projetando o que são na imagem “se não te mostras, não existes”, partilhando a sua vida com todos, via redes sociais, é legítimo questionarmo-nos sobre este modelo societário que secundariza a privacidade em benefício de um narcisismo hedonista e universal, segundo o qual todos têm de estar informados sobre a nossa família, o que comemos, onde estamos, ao sabor do instante num mundo do imediatismo. Porquê? Porque é obrigatório todos terem de estar informados sobre o que fazemos e, cada vez mais, em tempo real?     

Em contra-corrente há o predomínio do intimismo e da privacidade, fomentado pelo aparecimento dos vídeos, dvds, internet, visualizando em casa aquilo que, em tempos idos, só podia ser visto no teatro, no cinema, num ato coletivo e de grupo.

Há que fazer opções, parar e indagar se a vida é vista e memorizada apenas através de uma câmara, se com os olhos e todos os sentidos, se em harmonia e conjugação de esforços recíprocos, tirando proveito do que o real, a memória interiorizada e a matéria memorizada nos ensinam. 

Mas se, na atualidade, o que predomina é o visual, será desejável que haja uma interação permanente entre ele, a oralidade e a literacia, dado que a humanidade começou com a oralidade, dela transitou para a literacia a que acresce, de momento, o visual, em obediência às regras do princípio da totalidade, imprescindibilidade e valores civilizacionais que integram.   

E em abstrato quem vence? Oralidade, literacia, visual?   

Talvez todos e nenhum, na sua autonomia e interdependência recíproca.   

Mas sem escrita, não existiria este texto, pelo que, aqui e agora, neste contexto, vence a palavra escrita.            


22.09.23
Joaquim M. M. Patrício

CRÓNICA DA CULTURA

  


«Quais as hipóteses de encontrarmos aves-do-paraíso? Eu tinha a esperança de conseguir filmar uma das suas danças de acasalamento. Há muitos anos que planeio esta viagem, mas só agora tive as ajudas que necessitava para filmar.

Ele escutou-me em silêncio. Depois tirou um mapa de uma caixa e abriu-me em cima da secretária.

Terão de procurar numa zona não controlada pois as tribos fazem-lhe esperas. Até já houve emboscadas com feridos e mortos nestes encontros pelo desejo de arrancar as penas das aves. Vão ter de levar uma escolta. Tenho um homem que irá convosco por troca de sal e não quer saber da passarada. É uma caminhada de dois dias e com trilhos muito difíceis. Filmar as danças de acasalamento?»

«Sim, claro», respondi.

De repente, sorriu.

Três dias depois aproximávamo-nos do topo de um desfiladeiro. Estávamos a uma altitude superior a dois mil e quinhentos metros. Estávamos cansados e com frio, os pés feridos do esforço da lama e dos pedregulhos que pareciam perpassar as botas com facilidade. De repente, o terreno começou a descer e eu corri muito ansioso por espreitar o vale.»

David Attenborough

E

Pegue-se numa alma de face escarlate

Calcule-se o peso de a pousar no ar

Alongue-se tudo o que se eleva acima do espírito

E sigam-se os toucados de plumas e os cantares dos anuíres

Depois, quase impercetivelmente

A ave-do-paraíso levanta voo e afasta-se pelo vale abaixo

Do centro do meu coração

Escutei-a

As folhas que lhe conhecem as épocas

Abrigaram-na

Que das exposições totais

Bastante

É o esboço nupcial

 

Bendito


Teresa Bracinha Vieira

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