A FORÇA DO ATO CRIADOR
O Upper Lawn Pavilion possibilita o aumento da duração de momentos específicos e insignificantes.
“Rather it is a romantic vignette of a mural play-life of weekend hermits, in a hermitage that is an unassuming permanent-tent whose whole encircling landscape (…) is the rustic setting for a ‘gazebo’ from which to watch the interweaving patterns of weather and seasons.”, Alison Smithson in Diary (1962-82) (Smithson 2023, 51)
O Upper Lawn ou Solar Pavilion é arquitetura que deixa a vida acontecer. É arquitetura que não se impõe, nem demonstra qualquer tipo de poder. É acontecimento que se adapta e que vive da constante mudança e transitoriedade permanente. É recipiente capaz de generosamente gravar, fixar e revelar um lugar particular na sua plenitude. Usa a natureza como testemunha da vida banal que se passa dentro de uma cápsula por vezes fria, húmida, vazia e completamente exposta.
Este invólucro-experiência é fonte infinita de repouso, de ideias e de pensamentos que têm a possibilidade de infiltrar-se na consciência humana. É dador de tempo, que permite a demora. É revelador de diferentes estados e possibilita o aumento da duração de momentos específicos e insignificantes: “Bareness restores to ordinary objects their ‘absolute quality’”, Alison Smithson (Smithson 2023, 59)
O diário do Upper Lawn Pavilion, escrito por Alison Smithson, publicado no livro “Upper Lawn Solar Pavilion” dá a conhecer, tal como num filme, as histórias que se passam dentro de uma casa. Paul Clarke, no texto “Sticks and Stones” (Smithson 2023, 7-15), escreve que a arquitetura dos Smithsons embora se oriente para uma certa simplicidade, desencadeia sobretudo um complexo campo de oportunidades ínfimas no seu habitar. Clarke explica que os Smithsons acreditavam na potência da liberdade de movimentos e no papel performativo dos habitantes na formação da arquitetura. É a ocupação que dá vida. Ao nada ser insignificante, tudo ganha uma enorme importância. A arquitetura é assim feita de momentos insignificantes - das mudanças de luz, da definição de sombras, das diferentes estações, dos ritmos, dos sons e da consciência do tempo que passa.
Clarke escreve que os Smithsons se afastaram de uma arquitetura puramente formal, representativa e estática e iniciaram uma experiência espacial que é enriquecida pela vida, pela materialidade e pelo lugar. Os Smithsons possibilitaram a reconciliação do interior e do exterior, ao sublinhar o mundo tal como encontrado. Os Smithsons transformaram a arquitetura num observatório, de maneira a reencontrar-se com o seu princípio primeiro - um invólucro que vê através de um vidro, de um filtro, de um espelho.
Este pavilhão solar é uma membrana-testemunha que ora se fecha ora se abre. O jardim, a paisagem e a história daquele lugar fazem parte permanente deste espaço. Clarke lembra a atenção dos Smithsons em relação à arquitetura como um fenómeno transitório, de maneira a eliminar qualquer sentido de duração e de permanência. O transitório, para os Smithsons, é a condição necessária para que a arquitetura se possa sintonizar com um contexto específico. A arquitetura é testemunha de um tempo limitado, é aquilo que está entre a terra e o céu. É a transição entre o ser humano e o mundo. O Upper Lawn Pavilion está agarrado às pedras da antiga casa mas eleva-se para o desconhecido, para o incerto e para o intemporal.
No prefácio escrito para a primeira edição deste diário, publicado em 1985, Enric Miralles escreveu que este pavilhão é gerador por excelência daquilo que é essencial. Por ser esvaziado, tudo se modifica à mais minúscula alteração. Este é um espaço protegido e que tal como um caleidoscópio nos oferece infinitas imagens frágeis, irrepetíveis, presas por um acaso. Aqui a vida pode ser vivida de forma mais pura e subtil, em consonância com as flutuações do tempo. O Upper Lawn Pavilio representa assim um sentido de futuro e de experiência única, mas principalmente celebra a vida fugaz que acontece dentro e fora de um espaço.
Ana Ruepp