CRÓNICAS PLURICULTURAIS
215. A FELICIDADE REALIZÁVEL
Consta que a felicidade é quase sempre medida não por aquilo que se tem, mas por aquilo que falta. E que basta que aconteça algo pior para percebermos que, afinal, o que sentíamos não era infelicidade.
Trata-se de uma permanente e incessante busca de ser feliz, o que é normal dentro de certos limites, tidos como razoáveis, tornando-se nociva quando excessiva e irrealizável.
Em princípio, todas as pessoas que gozam de boa saúde e podem atender plenamente as suas necessidades fundamentais deveriam ser felizes, dado que para além da felicidade depender (segundo estudiosos), por um lado, de condições interiores e, por outro, de condições exteriores, tem inerente alguma subjetividade e indeterminabilidade.
Afastando, desde já, liminarmente, uma felicidade que, de tão exigente, é humanamente irrealizável, parece-nos que, correlativamente, daqui decorre ser necessário afastarmos de nós determinados objetos ou desejos que são, na sua essência, inacessíveis, como o exemplifica a obtenção de um conhecimento absoluto em qualquer área do saber. Expurgadas vontades e fins inalcançáveis, há que descobrir e procurar o que é desejável e acessível, fazendo-nos feliz, vivendo objetivamente, com interesses plurais, propensão para o afeiçoamento e sentido crítico, estimulando a autoconfiança e a capacidade de querer estar só, quando necessário, purgando ideias erradas sobre o mundo e a humanidade, imperfeitos por natureza, priorizando o que temos de bom e excluindo a infelicidade diária de que sofrem tantas pessoas.
Excelente preventivo contra a tristeza, o ócio e o tédio é a pluralidade de interesses pelo mundo exterior, que incentiva a atividade, sem prejuízo do conhecimento por nós próprios, defrontando-nos com o silêncio, a introspeção e os mistérios da vida, em equilíbrio e conjugação de esforços, dando luta, em qualquer caso, à inatividade.
Um interesse excessivo por nós próprios, pelo contrário, pode conduzir-nos a egocentrismos de várias espécies, como o narcisista, o megalómano e o pecante, destrutivos por si e incentivadores de infelicidade.
Tem que haver um apetite e gosto natural por coisas realizáveis, de que a felicidade não é exceção, tendo presente a nossa imperfeição de que ela também depende.
30.05.25
Joaquim M. M. Patrício