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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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500 ANOS DE PEÇAS DE GIL VICENTE

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Referimos hoje um conjunto de peças de Gil Vicente escritas há exatos 500 anos. Trata-se de evocação cronológica que não envolve qualquer esquema de apreciação das peças em si mesmas ou de relevância que assumem na dramaturgia do autor ou da época. Mas merece referência esta expressão cronológica, pois significa em si mesma como que um reconhecimento da cronologia que assiste também ao historial do teatro português, mas que tantas vezes não é ponderado como tal…

São peças datáveis de 1520/1521. E será então oportuno recordar que a primeira intervenção, como tal assumida, de Gil Vicente dramaturgo terá sido em 1502, na câmara de D. Maria, mulher de D. Manuel I que dera à luz, expressão mais da época do que de hoje, o herdeiro do trono, futuro Rei D. João III.

Entrou um “pastor” e saudou a coroa. Era junho de 1502: e aí referiu de forma desde logo exponencial o nascimento do príncipe. Assume-se como vaqueiro e esclarece as sua razões: “se tal soubesse / não viera, / e vindo / não entraria, / e se entrasse / eu olharia / de maneira /que nenhum me chegaria”…

O “Auto da Visitação” ou “Monólogo do Vaqueiro”, como já escrevemos, entrou e ainda cá está e ficará! E isso não obsta a que o próprio Gil Vicente dele próprio escrevesse com reticências: “Um Gil, um Gil, um Gil… / que má retentiva ei / um Gil… Já não direi: / um que não tem nem ceitil / que faz os autos a El-Rei!”

Mas não seria exato: pois escreveu cerca de 45 obras, em português e em castelhano, e como já referimos na “História do Teatro Português”, é comumente dado como nascido em Guimarães em 1465: mas tudo isso é questionável: por exemplo, Teófilo Braga defendia a teses do nascimento em 1470. Em qualquer caso, documentos rigorosos dão-no como falecido em 1540.

E em qualquer caso, os diversos estudos e edições apontam para algo como cerca de 50 títulos que, no seu conjunto, constituem não apenas a obra vicentina em si mesma considerada: mais do que isso, representam uma abordagem global do teatro-espetáculo, numa qualidade que em muito transcende a abordagem global da nossa dramaturgia.

Muito haverá sempre a dizer sobre esta obra no seu conjunto e na sua especificidade. É um tema que não terá nunca fim…

E nesse sentido, apraz-nos terminar esta referência com duas citações, uma delas do grande mestre que foi e é Luis Francisco Rebello na “História do Teatro Português” (1967) de que é autor.

Escreveu então Luis Francisco Rebello:

“Entre 1502 e 1536, Gil Vicente escreveu, interpretou e pôs em cena (pois, como em Ruzzante, Shakespeare ou Molière, coincidiam nele o autor, o ator e o encenador) cerca de cinquenta autos de que a maior parte foi reunida por seus filhos Luis e Paula Vicente numa Compilação editada em 1562 e reeditada vinte e quatro anos depois com graves censuras impostas pela censura inquisitorial. Dividiram aquela obra paterna em quatro secções – obras de devoção, comédias, tragicomédias e farsas - mas esta distinção por evidente arbítrio na medida em que aglutina obras disseminantes e separa obras afins.

Mais curial, sem dúvida, é a classificação tripartida (“comédias, farsas e moralidades”) alvitrada pelo próprio Gil Vicente, que engloba nos dois primeiros grupos os autos de temas dissemelhantes e separa obras afins. Engloba nos dois primeiros grupos os autos de tema e inspiração seculares e no último os temas religiosos.

E segue-se uma lista classificada das peças . (in “História do Teatro Português” – ed. Europa-América 1981).

Essas peças, no seu conjunto, constituem de facto uma origem notabilíssima da dramaturgia portuguesa. São quase 50 as que chegaram até nós. E como a referência hoje aqui feita situa a cronologia, citamos agora tão só as que mais ou menos correspondem à cronologia hoje existente…

E podemos então referir: “Farsa dos Ciganos”, “Auto de Deus Padre, “Justiça e Misericórdia”, “Obra da Geração Humana”, “Comédia de Rubena”…

Tudo isto será no mínimo questionável, no que se refere às obras e mais ainda às datas. E em qualquer caso, importa aqui recordar o que o próprio Gil Vicente de si mesmo escreveu:

“Um Gil, um Gil, um Gil… / que má retentiva ei / Um Gil… já não direi: / um que não tem nem ceitil / que faz os autos a El-Rei!”

 

DUARTE IVO CRUZ

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