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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

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Acerca da ambiguidade na linguagem 

‘Language is always more or less vague, so that what we assert is never quite precise.’, Bertrand Russell no Prefácio de ‘Tractatus Logico-Philosophicus’ de Ludwig Wittgenstein.
 

Exprimir simplesmente, implica uma idealização e uma abstracção – associam-se formas a significados. A linguagem é composta por uma série de nomes/formas dependentes entre si que aparecem num determinado contexto. De acordo com Wittgenstein, toda a finalidade da linguagem é ter significado – um significado único, determinado, lógico e preciso. A linguagem é, deste modo, construída e mantém uma relação constante entre a estrutura da forma e a estrutura do facto da realidade. Através teoria do simbolismo, Wittgenstein declara que implicitamente o homem constrói imagens dos factos. E uma imagem é um modelo da realidade e também um facto em si. O que a imagem deve ter em comum com a realidade de modo a representá-la – correcta ou falsamente – é a sua forma.

Mas, na verdade, toda a linguagem é ambígua e vaga, porque um nome ou uma forma não reproduzem a realidade tal como ela é, pois se assim o fosse, não seria um nome ou forma mas a própria realidade. Wittgenstein afirma ainda que a expressão linguística apresenta-se como se fosse uma projecção geométrica. Uma figura geométrica pode ter diversas projecções, e cada uma das projecções corresponde a uma diferente linguagem, mas as propriedades projectivas da figura original mantém-se inalteráveis em qualquer das projecções adoptadas. E a ambiguidade em linguagem intensifica-se assim, com a questão da relação entre a expressão linguística, o conceito formal e a realidade. O que representam, então os nomes/formas, uma intenção, um conceito mental? 


O sentido das coisas. Como interpretamos?

Wittgenstein disse: ‘O sentido das palavras provém daquilo que fazemos e daquilo que somos. Ao buscar o sentido duma palavra, não olhem para dentro de vós. Olhem para a utilização dessa palavra no contexto da vossa vida.’

Uma das propriedades da linguagem está em poder associar mais do que um significado a uma única sequência linguística e só mediante determinado contexto se pode tornar claro qual deles é o significado visado. Ambiguidade existe sempre que a uma forma estão associados dois ou mais significados distintos – ´Não há apenas uma imagem do mundo, há muitos jogos de linguagens diferentes. Diferentes formas de vida e formas de fazer as coisas com as palavras.’, L. Wittgenstein. O número de significados associados a uma dada sequência linguística pode ser muito vasto em consequência da multiplicação de ambiguidades inerentes. Ambiguidade é uma propriedade intrínseca e difere de indeterminação (porque cada frase indeterminada tem um só significado, mas o significado deixa por especificar certas propriedades da situação real – as unidades de significação representam apenas alguns aspectos da realidade, deixando vagos todos os outros aspectos.)

A eliminação da ambiguidade inerente é provavelmente possível com o simples contexto pragmático – dada a situação e dado o conhecimento que se presume que o fruidor tenha. Desambiguar os mecanismos interpretativos passa pela exacta, verdadeira, oportuna, breve e ordenada quantidade de informação fornecida.

‘Tudo o que vejo se torna nas minhas formas e na minha condição.’, De Kooning

A linguagem implica discrepância entre o facto físico e o efeito psíquico, e implica o emprego da ambiguidade para se poderem explorar possibilidades formais. Contradição, paradoxo e ambiguidade são qualidades básicas na construção de uma linguagem – só assim se pode permitir espaço para a interpretação plural acerca da intenção.

O significado intencional tem por finalidade dar conta do êxito duma comunicação entre um emissor e um destinatário. Para que um discurso, dirigido por um emissor a um destinatário, possua um significado não só é necessário que a intenção do emissor seja objecto de reconhecimento por parte do destinatário, mas também que esse reconhecimento seja condição necessária à troca de informação a que o discurso dá lugar.

Sendo assim, a linguagem representa uma realidade – realidade essa que tem uma lógica própria. Através de imagens criadas pelo sujeito (que tentam manter intacta a lógica da realidade) forma-se um discurso. E o discurso não é a realidade em si mas uma realidade própria – aquilo que o emissor escolhe como real no seu discurso e aquilo que o destinatário apreende desse discurso. E assim a linguagem pode ser entendida na sua totalidade quanto mais contextualizada for.

 

Ana Ruepp