Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

A FORÇA DO ATO CRIADOR

BarbaraHepworth.jpg


Barbara Hepworth e a união entre matéria, forma e conteúdo.

 

‘There is an inside and an outside to every form.’, Barbara Hepworth

 

Barbara Hepworth (1903-1975) é uma das principais figuras do modernismo britânico. A experiência de Hepworth ao visitar o atelier de Jean Arp, libertou-a de muitas inibições relacionadas com o seu modo de ver a figura na paisagem – ‘It was very quiet in the room so that one was aware of the movement in the forms’. Não esqueçamos que Arp conseguiu, com as suas esculturas, uma fusão muito completa da paisagem com a figura humana.

Hepworth ao trabalhar a pedra, a madeira e mais tarde o bronze, suavizando arestas, faz com que as suas esculturas sejam a própria natureza. Ao esculpir a matéria diretamente da natureza, Hepworth devolve-a ainda mais rica, profunda e densa. E assim consegue uma perfeita e completa união entre forma e material.

 

‘When I started carving again in November 1934, my work seemed to have changed direction, although the only fresh influence had been the arrival of the children. The work was more formal, and all traces of naturalism had disappeared, and for some years I was absorbed in the relationships in space, in size and texture and weight, as well as in the tensions between the forms.’, Barbara Hepworth

 

Em ‘Modern Sculpture’, de Herbert Read, lê-se que o trabalho de Barbara Hepworth foi inspirado pela ideia de que a mão descobre os pensamentos do material – sublinhando a ideia de que o material tem uma mística, porque transporta em simultâneo forma e conteúdo. Brancusi já o dissera: ‘It is while carving stone that you discover the spirit of your material and the properties peculiar to it. Your hand thinks and follows the thoughts of the material.’

Read explica que o génio extraordinário de Henry Moore dominou a escultura moderna. E vitalidade é a palavra que melhor caracteriza a escultura deste tempo. Vitalidade pelo movimento e pela ação física que carrega, mas sobretudo pela intensa vida própria que transporta, independente do objeto que representa. O poder de expressão adquire uma enorme importância, porque anseia-se por uma vitalidade espiritual que vá para além dos sentidos. Deseja-se por uma penetração da realidade, uma expressão do que significa viver. Hepworth, assim como Moore, dava primazia ao trabalho directo sobre a madeira e a pedra – abandonado o trabalho preliminar em barro. Tal como em Moore, em Hepworth persiste, em toda a sua obra, um aprofundar da vitalidade que anima todas as formas naturais presentes na Terra – não só dos seres orgânicos (dos seres humanos) mas de todas as coisas inorgânicas cuja estrutura se baseie num crescimento (cristais) ou em forças naturais (erosão das rochas pelo vento ou pelas ondas do mar). A clássica ideia de beleza não é o objetivo de Hepworth, mas sim o da integração total da forma no conteúdo. Hepworth, trás consigo a herança de Brancusi, ao concentrar as suas esculturas na pura consciência da forma – na execução de formas simples e diretas, polidas até à precisão, de modo a atingir o verdadeiro significado das coisas, abrindo espaços profundos na matéria. De Brancusi, também assimila a atenção para a firmeza e para o equilíbrio dos volumes, considerando sempre a proporção, a força e a estrutura.

 

‘In Pierced Form I had felt the most intense pleasure in piercing the stone in order to make an abstract form and space; quite a different sensation from that of doing it for the purpose of realism.’, Barbara Hepworth

 

Hepworth encontra inspiração diretamente na natureza: cristais, conchas, rochas e todas as formas cravadas pela força do mar. É de sublinhar, que Barbara Hepworth mudou-se para St Ives, Cornwall, no início da Segunda Guerra Mundial e a partir desse momento, desenvolveu um tipo de escultura até então nunca visto no desenvolver do seu trabalho. Começou a perfurar pequenos bocados de madeira. Até então a escultura era vista como um objeto no espaço e Hepworth desenvolveu a ideia de abrir espaços dentro da forma sintetizada. A ideia de espaço, criado dentro do volume e dentro da matéria, tenta transportar a sensação do sujeito estar envolvido e protegido pela natureza. A partir de então, o seu grande trabalho consistia em criar espaços enfatizados pela luz, que são pintados e vão ficando mais complexos dentro das formas esculpidas.

Herbert Read afirma que o trabalho de Hepworth se aproxima da definição de Brancusi: ‘Beauty is absolute equity.’ É absoluta equidade porque se aproxima dos aspetos mais irracionais de vitalidade, numa tentativa de ordenar o caos do inconsciente através da execução da obra de arte. E assim, Barbara Hepworth consegue a união quase perfeita entre matéria, forma e conteúdo através da abertura de espaços nas formas esculpidas sintetizadas.

 

Ana Ruepp