A FORÇA DO ATO CRIADOR
Mondrian e as 'Noites de Lua Cheia'.
'Une idée etait de faire un filme sur un fond noir et gris avec des taches des couleurs vives.', Eric Rohmer
Num filme em que domina o preto e o cinzento, o vermelho, o amarelo e o azul não podemos de deixar de nos lembrar das pinturas de Mondrian. Numa entrevista a Eric Rohmer (1920-2010) ouve-se que toda a imagética do filme 'Noites de Lua Cheia' (1984) tivera como influência duas das composições do pintor modernista - uma das reproduções aparece na sala de Rémi.
Ora, 'Noites de Lua Cheia' é um filme que reflete tendências pós-modernistas, e traz referências antigas (escolhidas por Pascale Ogier) tais como a Bauhaus e De Stijl.
'Personellement je suis de la génération qui se à détacher de Mondrian, qui à assumi cette influence a sa jeunesse et qui à essayer de réagir contre l'abstraction. Mon goût aux cinema et une réaction contre l'abstraction. C'est assez curieux de voir que la jeune génération reviens à Mondrian.', Eric Rohmer
O filme desenvolve-se sob uma grande espontaneidade e naturalidade - há desencontros, mal-entendidos e equívocos - mas os objetos, os móveis, as lâmpadas e as roupas estruturam-se sistematicamente e compõem imagens luxuosamente pensadas e ordenadas.
O filme conta a história da frágil e etérea Louise (Pascale Ogier), dividida entre Marne-la-Vallée e Paris. Louise é uma personagem deslocada, não em sentido espacial mas em sentido temporal. As duas casas de Louise revelam um controlo absoluto sobre os objectos no espaço, porém afirma-se em simultâneo uma grande distância entre o discurso e o comportamento da personagem.
'Camille: Je t'ai apporté ces catalogues (Memphis Milano). Je pensais que ça t'intéresserait.
Louise: Oh, c'est formidable! Où est-ce que tu les a trouvés.
Camille: À Milan. Je rentre d'Italie. Tu ne savais pas? C'est lá que tu travailles?
Louise: Oui. Enfin, je fais des lampes avec des tubes incroyables, qui sont nouveaux, avec tout un système de mirroir, tu vois, qui réfléchit la lumière... Et puis j'ai fait peindre des petits embouts, un pied. Je travaille sur les couleurs.'
Nas pinturas de Mondrian é dada sobretudo importância aos valores mais primários: a linha, o plano e a cor. Mondrian, ao contrário dos cubistas, desejava passar a uma síntese formalmente rígida e ordenada (em que predominam as cores elementares, o branco, que é luz e o preto, que é não-luz). Argan acredita que Mondrian desejava revelar que as pinturas devem fazer transparecer a estrutura constante da consciência, apesar de todas as diversas e complexas experiências da realidade. Mondrian tentava reduzir ao mínimo a matéria complexa da realidade (em termos de cor, luz, e distância). O pintor transformava fenómenos em ideias feitas, 'que tinham a clareza, o carácter absoluto e a verdade intrínseca do pensamento pensado.' (Argan, 1992)
Para Mondrian, o artista tinha o dever de demonstrar (e de levar a todos) como descobriu uma verdade - porque acreditava que a pintura é um projeto de vida social, capaz de resolver as suas contradições diárias.
Mondrian demonstrava, sobretudo, que ao contrário do que se pensa, as sensações não são confusas, são antes do domínio da lógica e podem ordenar-se.
Sendo assim, o tão magnífico equilíbrio visual da fotografia de 'Noites de Lua Cheia', que contrasta mas ordena a desorientação e as contradições de Louise, é conseguida, tal como nas pinturas de Mondrian, através de uma forte unidade de cores (estas adquirem diferentes significados ao longo do filme) e de uma rigorosa organização espacial.
Ana Ruepp