A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
XXXVII - FRANCOFONIA
Tendo consciência de que enfrenta uma situação difícil para a sua língua, a França continua a pensar em grande, não se deixando vencer pela adversidade. Espera pelo abrandamento da vaga do inglês, pelo refluxo anglófono.
De língua global e culturalmente dominante, foi gradualmente suplantada e secundarizada pelo inglês, nomeadamente após o fim da segunda grande guerra, depois da ocupação nazi e a libertação pelos aliados e vencedores anglófonos.
Os franceses têm uma relação muito particular com o seu idioma, sendo tendencialmente monolingues, aceitando mal a decadência do francês a nível mundial, por confronto com os seus tempos áureos.
Mas continuam a resistir, com empenho e determinação, ao mesmo tempo que querem passar a mensagem que são menos imperialistas em termos linguísticos que os falantes maternos da língua inglesa.
Só que, consoante o contexto, a estratégia muda.
Dado que, por confronto com o inglês, o francês perde, continuando a perder no curto e médio prazo, sem perspetivas de ganhos maiores nos tempos mais próximos, aceita-se o inglês como uma língua global de economia e finanças, e a francesa como uma língua para o desenvolvimento, de coesão, de partilha e solidariedade, uma mais-valia, uma terceira língua, que acresce à materna e ao inglês. Não interessa, nesta perspetiva, que se diga que o francês está a lutar contra o inglês, mesmo que não totalmente verdade.
Porém, para além de acusações de tentativas glotofágicas do francês na organização internacional da União Latina em relação ao espanhol, português, italiano, romeno e catalão, a francofonia olha de um modo muito especial o espaço das demais línguas românicas de expansão global, designadamente o espanhol e o português.
Ao mesmo tempo que defende a diversidade cultural e ser imperioso juntar esforços contra a ameaça do inglês, a França, em particular, é adversa dessa diversidade quando defende uma estratégia de intervenção que ultrapassa a mera ajuda, colaboração e cooperação a países menos desenvolvidos, como sucede, entre os países lusófonos, com Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e a Guiné Bissau. Incluindo algumas investidas em Moçambique.
Há quem veja na estratégia da francofonia para a África de língua oficial portuguesa, com enfoque em Cabo Verde, Guiné Bissau e São Tomé e Príncipe, caraterísticas de imperialismo linguístico, numa tentativa de substituição, a prazo, do português pelo francês, em detrimento dum salutar convívio entre a lusofonia e a francofonia.
Se a lusofonia e a CPLP atravessam dificuldades, há que explorar esses défices e fazer ver a esses países que têm o português como idioma oficial que há quem os compreende melhor, que tem e disponibiliza mais dinheiro para o seu desenvolvimento e necessidades de toda a espécie.
Para o autor francês Chaudenson, segundo o qual quem não sabe fazer, deve dar lugar a outros, há que integrá-los na nova francofonia, juntamente com o único país africano de língua oficial espanhola, a Guiné Equatorial. O que reforça com o argumento de serem países rodeados de vizinhos francófonos e situados em zonas de predominância francófona. O que pode ser extensivo a Angola, com as inerentes adaptações derivadas das suas fronteiras com a República Democrática do Congo (Kinshasa) e a República do Congo (Brazzaville), ambos países francófonos.
Sendo a África fulcral para a continuação do francês como língua global de comunicação internacional, Portugal e a lusofonia têm de estar atentos a estas tentativas de francofonizar alguns países lusófonos, especialmente os mais débeis, o que já não sucede em relação aos países de língua oficial inglesa, dado que, por certo, o “lobo” francês não é tão predador como o anglo-americano.
Há que referir ainda o papel desempenhado mundialmente pela Alliance Française, numa crescente procura de parcerias, por exemplo entre a França, a China e o país africano de destino, dado o interesse chinês em África e saberem não poderem trabalhar em chinês, o que pode e deve, por analogia, ser aproveitado por Portugal e mundo lusófono.
26.06.2018
Joaquim Miguel de Morgado Patrício