A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
XLIX - NÃO AO COMPLEXO DE INFERIORIDADE LINGUÍSTICO (II)
Há que impedir que um dos idiomas em maior expansão mundial seja menorizado ou secundarizado.
Há exemplos, sendo fácil enumerá-los, tanto ao nível político, das elites, figuras públicas ou do cidadão comum em geral.
Abundam situações caricatas e grosseiras, como a de um treinador espanhol (Camacho), de um conhecido clube português (Benfica), useiro e vezeiro no uso do castelhano no nosso país, apesar de residente em Portugal por razões profissionais, nunca se lhe tendo ouvido, via comunicação social, um bom dia, boa tarde, boa noite ou obrigado. O que era extensivo ao espanhol Quique Flores. A que se pode juntar um treinador holandês de um clube de futebol luso que se expressava em castelhano e omitia qualquer palavra em português. Sempre sem protesto, sem a mais pequena e visível reação, ou escândalo, pela nossa parte, por certo porque eles e nós achamos normal, o que não sucederia se algum de nós residisse e trabalhasse em Espanha, falando em português e ignorando o castelhano.
O que é confirmado por confronto com um treinador português quando trabalhava e residia profissionalmente em Madrid, ao serviço do Real (Carlos Queirós), onde desde o primeiro dia se tentou exprimir em castelhano, sem se ter expressado, que saibamos, em português. O mesmo se diga de José Mourinho, de Cristiano Ronaldo, entre outros, falando publicamente, desde o início, o idioma do país vizinho, mesmo que pontualmente mais portunhol.
A velocíssima rapidez com que jogadores e técnicos portugueses se adaptam ou tentam adaptar a um bom uso da língua oficial de Espanha quando aí trabalham ou residem, é inversamente proporcional aos esforços que desportistas e técnicos espanhóis fazem para se adaptar a um bom domínio do português em terras lusas.
E que dizer de alguns profissionais da rádio e tv, que entrevistam alegremente em castelhano cidadãos desse idioma no nosso país, sem qualquer preocupação de tradução, o que é tido como normal, por certo, compreensível para os portugueses, apesar dos entrevistados serem hóspedes em nossa casa, uma vez que não compreendem, nem assim se esforçam por compreender, é claro, a nossa língua!?..
É usual ver falantes de castelhano residentes entre nós falando-o e escrevendo-o com naturalidade, com pouca ou nenhuma concessão a expressões portuguesas, sendo mais fácil ver portugueses a falar ou simular falar castelhano em Portugal, inclusive quando abordados por turistas espanhóis, com a agravante de que ao querermos facilitar, agravamos um complexo de inferioridade que não beneficia de reciprocidade, chegando a ser ridículo dificultar ou impedir que espanhóis que queiram valorizar o nosso idioma, fiquem frustrados ao não conseguirem aprendê-lo ou consolidá-lo, atento o seu desincentivo, quando entre nós.
Também é muito mais comum as nossas elites, políticas ou outras, falarem ou tentarem falar em castelhano (portunhol), em países de língua castelhana (quando não mesmo em Portugal), não sendo o inverso recíproco.
Dão-se muitas justificações, desde a nossa maior adaptabilidade, o ser mais penoso para um espanhol entender ou falar português, serem maus em línguas, até à ausência de qualquer esforço nesse sentido, porque meramente presumem que não vale a pena, não só pela compreensão recíproca de ambos os idiomas, mas também por terem o português como uma língua menor, serem em maior número ou tentarem ser entendidos pelos portugueses, mesmo quando de passagem ou de visita por Portugal. Direi, por experiência pessoal, que tanto em Portugal como em Espanha, sempre usei e me fiz entender no meu idioma, sem pressas e pausadamente, repetindo as palavras, se necessário. Recorrendo ao inglês, em caso de conflito.
Não faz sentido que sendo dois idiomas distintos e de compreensão mútua, essa desproporcionalidade só funcione, normalmente, para um dos lados (muito por responsabilidade nossa), nem me parece ser essa a melhor maneira de divulgar e preservar a nossa língua.
Refira-se que a ser verdade de que quem fala português tem mais facilidade de falar (e compreender) castelhano, seria de prever, por tal vantagem, que houvesse proporcionalmente mais espanhóis a interessar-se pelo nosso idioma.
O que manifestamente não sucede, ao que também não será alheia a tradicional mentalidade imperial castelhana e a sua força centrípeta, corroborada por uma certa altivez ou orgulho ostensivo, mesmo havendo mais falantes de castelhano que de português.
25.06.2019
Joaquim Miguel de Morgado Patrício