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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO

 

LI - NÃO AO COMPLEXO DE INFERIORIDADE LINGUÍSTICO (IV)


Além da desautorização a que é votado o português em várias organizações, congressos, fóruns, encontros, eventos artísticos e desportivos internacionais começando, muitas vezes, pela omissão dos próprios lusófonos nos seus países, citaremos mais exemplos da inferiorização, tendo como referência o nosso país e algumas viagens ao estrangeiro.   


Com alguma frequência nos deparamos com situações em que produtos importados, comercializados e distribuídos em Portugal são omissos quanto a instruções escritas em português, o que nunca deveria suceder, apesar do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 238/86, de 19/08, reconhecer “(…)que o crescente alargamento do mercado nacional a produtos ou serviços de origem estrangeira, quando não acompanhado pelo uso da língua portuguesa, inviabiliza na prática o exercício do direito à informação”, o que não impede que as omissões continuem, incluindo novas tecnologias de ponta, sem que nada aconteça, que se saiba, dada a sua repetibilidade, embora puníveis por coima.


Não obstante a indiferença do cidadão comum, no geral, não denunciando nem reclamando, por maioria de razão se censura a omissão dos entes fiscalizadores, já que deveria ser um dado adquirido que, sendo nós portugueses e residindo em Portugal, o direito à informação no nosso idioma é um direito fundamental. Direito (à informação) que também não funciona quando, por tudo e por nada, se usam expressões ou termos anglófilos, por vezes em exclusivo, eventualmente tidos como mais abrangentes e civilizados, apesar do provincianismo.     


Se antigamente a regra era ter como melhor língua a do vendedor, por uma questão de prestígio, penso que atualmente não chega, pois apesar de dar prestígio, não dá negócio, havendo que inverter o padrão e defender que a melhor língua é a do comprador. 


É incompreensível, por outro lado, que pelo menos até 2006, o nosso idioma estivesse ausente no Estado do Vaticano (desconheço se ainda em 2019), o que testemunhei em visita familiar, em julho/agosto,  apesar de mais falado que o francês e alemão (aí presentes, a par do inglês e castelhano), tanto mais surpreendente quando o Brasil é o maior e mais populoso país católico. Em 3 de Agosto, em visita à igreja de Santa Maria Maggiore, em Roma, havia confessionários em italiano, espanhol, francês, inglês, alemão, polaco, checo, holandês, húngaro, latim, svensk (presumo que sueco), norsk (presumo que norueguês), slovensky (esloveno), ttiêng viêt (?), ttio (?)… Procurei o português e notei a ausência, confirmada por uma segunda procura. Sem duvidar que, por princípio, todas as línguas têm a mesma dignidade, porquê tal omissão, sendo os lusófonos em maior número e maioritariamente católicos, por confronto com os falantes da maioria das línguas aí representadas? Qual a influência e o protagonismo das instituições católicas, entes diplomáticos, governamentais, outras entidades e associações lusófonas, inclusive via CPLP, para alterar tais incongruências!?   


Dia 31 de Julho de 2006. Visita não programada a Nápoles e Pompeia. A guia, italiana, falava inglês, francês, castelhano, holandês e, ao que suponho, japonês, mas não português. Manifestei o meu desagrado. Já o tinha feito quando interpelado a ter de escolher entre o inglês e preferencialmente o “espanhol”, dada a parecença deste com o português, atento o argumento usado. Optei pelo inglês, sugerindo-se a mais-valia em falar português, mais falado que o francês, italiano e alemão, para além do holandês e japonês, enumerando-lhe os países falantes, o que disse saber, acabando, no final, por pronunciar bom dia e obrigado. Sugeriu-se, por escrito, para a necessidade crescente dos guias falarem o nosso idioma, o que foi subscrito por quatro portugueses. 


Em 21 de Agosto de 2006, numa breve estadia em Maiorca (Baleares), deixei uma reclamação/sugestão escrita no hotel, com o seguinte teor (em português): “Este hotel tem muitos portugueses. Mas esquece Portugal e a língua portuguesa. Fala-se italiano, francês, alemão, inglês, há livros em holandês, informações em polaco… Em português, há um canal de televisão. É pouco para um país vizinho de Espanha, a quem dá muitos turistas. Portugal não tem direito a uma bandeira na entrada do vosso hotel!... Incompreensível. Além disso, o português é mais falado que o francês, alemão, italiano, holandês e polaco. Espanha é mais bem tratada em Portugal. Pelo que vejo merece tratamento diferente. Não admira que muitas pessoas digam (e pensem) que Espanha tem uma mentalidade imperial e arrogante. Obrigado”.   


Entreguei-a ao diretor, a quem observei ser gratificante para nós, portugueses, ouvir pronunciar um mero bom dia, boas férias, obrigado, muito obrigado, ou expressões equivalentes, em espetáculos ou eventos sociais, à semelhança de agradecimentos e cumprimentos noutras línguas, mas em que está ausente o português, quando era significativa a presença de turistas lusos.   


Sensibilizei-o não fazer sentido tudo isto e a ausência da bandeira portuguesa, não só pela clientela lusa, mas também por sermos um país vizinho, sendo suficiente este último argumento por uma questão de boa vizinhança e proximidade. Ser uma mais-valia apostar no português, um idioma com futuro, havendo também que pensar no Brasil e demais países lusófonos.     


Deu-me razão, que ia colocar a questão superiormente, ficando a promessa que a nossa bandeira iria ter presença num dos mastros do hotel, que iriam ser impressos livros com informação em português, além de entender os qualificativos da mentalidade espanhola (castelhana), por ser catalão, pedindo-me desculpa. No Natal desse ano, recebi em Portugal um postal de boas festas, onde me era comunicado, após reincidentes desculpas, que a nossa bandeira flutuava à entrada do hotel, havendo folhetos e livros informativos em português na receção e áreas comuns do interior.


Em julho de 2005, de visita à Catedral de São Paulo, em Londres, reclamei oralmente para a omissão de prospetos gratuitos e informativos para os visitantes em português, não o tendo feito por escrito, dada a ausência de recetor, segundo informação obtida. 


Em agosto de 2010, na Turquia, num resort muito frequentado por portugueses, sugeri dever haver um canal de tv na nossa língua, algumas palavras em português em locais públicos de passagem comum e objetos de mesa, em paralelo com as de outros idiomas, o que ficou de ser estudado, dada a crescente procura de turistas nacionais.

 

09.07.2019
Joaquim Miguel de Morgado Patrício