A VIDA DOS LIVROS
De 12 a 18 de maio de 2025
Passa em 2025, o primeiro centenário do nascimento de Joaquim Veríssimo Serrão, antigo Presidente da Academia Portuguesa da História e historiador com importante obra, recordamo-lo hoje.
O testemunho que importa deixar em memória de Joaquim Veríssimo Serrão tem como marco fundamental a entrega total que dedicou ao estudo da História portuguesa. Os diversos domínios da sua investigação correspondem a uma procura sistemática das profundas razões que determinaram a afirmação da autonomia de Portugal no contexto mundial. Desde os alvores da nacionalidade, encontramos motivações complexas que não podem ser resumidas em razões simplistas. Esse facto, levou o historiador a recusar considerações simplistas ou unilaterais. A cada passo, encontramos uma convergência entre razões geográficas, políticas, económicas, sociais e culturais para os diferentes acontecimentos e fenómenos. E às razões prevalecentes em cada momento, vamos acrescentando outras que nos permitem avançar na compreensão de uma existência diversa e multifacetada. Os séculos XV, XVI e XVII, para Portugal e para o Brasil são os períodos que mais ocuparam a investigação do historiador, com destaque para a monarquia dual e para sua evolução, no contexto internacional.
Cem anos, já. Celebramos o primeiro centenário do nascimento de um historiador probo, de um estudioso incansável, que nos deixou uma herança rica e positiva de investigação e estudo sobre as nossas raízes e desenvolvimentos históricos. Nascido em Santarém, em 8 de julho de 1925, Joaquim Veríssimo Serrão licenciou-se em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra em 1948, tendo militado cedo no MUD juvenil. Profundamente interessado pela ligação entre a história regional e a projeção internacional da mesma, dera à estampa, um ano antes, “Ensaio Histórico sobre o Significado da Tomada de Santarém aos Mouros em 1147”, estudo na linha dos ensinamentos de Alexandre Herculano, o verdadeiro fundador da moderna historiografia portuguesa. Em 1948, estreara-se como conferencista, apresentando “A mundividência na poesia de Guilherme de Azevedo”, sobre o talentoso poeta e jornalista de Santarém (1839-1882), com estreitas relações com a Geração de 70, colaborador do Álbum das Glórias com o pseudónimo de João Rialto.
Em 1950, partiu para Toulouse, no sul de França, onde foi nomeado leitor de Cultura Portuguesa da Universidade. Durante este período teve contacto estreito com os mais brilhantes lusitanistas, como Paul Teyssier (1915-2002), León Bourdon (1900-1994) e Jean Roche (1917-2006). Recorde-se que qualquer um dos três considerou sempre a grande importância das culturas da língua portuguesa de Portugal até ao Brasil. Durante este período publicou “A Infanta D. Maria (1521-1577) e a sua Fortuna no Sul da França”. Trata-se de um importante estudo que se insere no papel fundamental desempenhado pela corte portuguesa no movimento cultural renascentista, depois da chegada Portugal de Cataldo Parísio Sículo (1455-1517). Reveste-se, aliás, de especial importância o papel desempenhado pela Infanta D. Maria de Portugal, filha de D. Manuel, estudada exaustivamente por Carolina Michaelis de Vasconcelos. Por outro lado, deu ainda a conhecer importantes investigações sobre António de Gouveia, Francisco Sanches, Diogo de Teive, Manuel Álvares e outros letrados portugueses que frequentaram aquela universidade.
Em 1957 defendeu a tese de doutoramento na Universidade de Coimbra, intitulada “O Reinado de D. António Prior do Crato: 1580-88”, sobre um período pouco estudado da história portuguesa e iniciou funções docentes na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Na década seguinte, o historiador foi particularmente profícuo: além de dar aulas e conferências, publicou trabalhos sobre humanistas portugueses nas universidades de Salamanca, Montpellier e Toulouse, as relações externas entre Portugal e as cortes europeias no século XVI, o Brasil colonial (séculos XVI e XVII) e a crise dinástica de finais do século XVI. Fez ainda parte dos colaboradores da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira e do Dicionário da História de Portugal, dirigido por Joel Serrão, onde assinou diversas entradas.Entre 1967 e 1972, suspendeu a atividade docente, por ter sido nomeado diretor do Centro Cultural Português da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris. Nestas funções destacou-se na divulgação dos estudos portugueses através dos “Arquivos do Centro Cultural Português”. É muito importante a sua ação em Paris pelas iniciativas que levou a cabo e pelos conferencistas e estudiosos que convidou para animarem tão relevante ação internacional, num tempo em que a projeção da cultura além fronteiras estava limitada pelas circunstâncias políticas. As relações que estabeleceu com J. V. de Pina Martins constituíram um exemplo de diálogo cultural muito fecundo, de que foi largamente beneficiária não apenas a história da literatura e da arte, mas também a história das instituições – tendo a Fundação Gulbenkian sido um catalisador extramente importante. Em 1973 regressou a Portugal para a docência na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, da qual foi reitor até 1974, cargo que deixou após a Revolução de 25 de Abril. Pouco depois, com grande coerência, o historiador deu testemunho das suas relações de amizade com Marcello Caetano, publicando “Confidências no Exílio” (1985) e “Correspondência com Marcello Caetano 1974-1980” (1994). Desde 1975 até 2006 presidiu à Academia Portuguesa da História. A sua “História de Portugal” (Editorial Verbo, 1978-2010) de dezoito volumes (Vol. I - 1080-1415; Vol. II - 1415-1495; Vol. III - 1495-1580; Vol. IV - 1580-1640; Vol. V - 1640-1750; Vol. VI - 1750-1807; Vol. VII - 1807-1832; Vol. VIII - 1832-1851; Vol. IX - 1851-1890; Vol. X - 1890-1910; Vol. XI - 1910-1926; Vol. XII - 1910-1926; Vol. XIII - 1926-1935; Vol. XIV - 1935-1941; Vol. XV - 1941-1951; Vol. XVI - 1951-1960; Vol. XVII - 1951-1960; Vol. XVIII - 1960-1968) constitui um significativo contributo para o conhecimento e divulgação pedagógica dos contributos portugueses para a evolução do mundo. Joaquim Veríssimo Serrão foi sócio de mérito, membro honorário e correspondente de inúmeras sociedades científicas, portuguesas e estrangeiras, tendo recebido diferentes distinções, condecorações e prémios, bem como doutoramentos “honoris causa” por universidades francesas, espanholas e portuguesas. Recebeu o Prémio Príncipe das Astúrias de Ciências Sociais em 1995.
Guilherme d'Oliveira Martins
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