CENTENÁRIO DA “ZILDA” DE ALFREDO CORTEZ
Vale a pena reinvocar aqui e agora o centenário da “Zilda” de Alfredo Cortez, pois a peça, como já temos referido, constitui a primeira grande afirmação teatral do autor, abrindo assim uma carreira de criador/produtor teatral de relevo na projeção da modernidade, que se mantém como tal, da criação dramática, repita-se, do autor mas também a sua moda, da renovação/modernização do teatro em Portugal.
Sendo certo, note-se, que a “Zilda”, então a primeira peça de destaque criativo do autor, o que lhe garante uma indiscutível relevância, não envolve em si mesma sinais da modernização que, a partir daí, iria marcar a época e a obra de Cortez: e como bem sabemos aí se marcaram sinais evidentes de renovação/modernização do teatro em Portugal.
Porém, a esse propósito, há que referir que a dramaturgia criada por Cortez, sendo assinalável nos sinais de modernização, em muito transcende o sentido de renovação dessa obra, que como bem sabemos e tantas vezes temos referido, marca mas não esgota a inovação/renovação do teatro em Portugal.
E de qualquer maneira, a “Zilda” constitui simultaneamente a primeira grande afirmação dramatúrgica do autor e como tal, um dos valores referencias do teatro em Portugal, e isto não obstante a proximidade de um certo estilo simbolista que se por um lado não atinge a grande afirmação dramatúrgica do autor e como tal um dos valores referenciais do teatro em Portugal. Isto, não obstante a proximidade a um certo estilo simbolista, que se por um lado não atinge a qualidade indiscutível de obra global de Cortez, por outro lado afirma e testemunha a qualidade e modernidade da sua produção dramatúrgica.
E isso pois, sobretudo porque, tal como escrevemos na “História do Teatro Português”, e em “Alfredo Cortez _Teatro Completo” o teatro de Cortez visa o ser humano a psicologia e a ética.
E transcrevo uma passagem.
Pois digo que o teatro de Alfredo Cortez visa o homem, a psicologia, a ética do ser consciente. Visa a sociedade, os grupos em presença, os entrechoque, as interdependências e oposições, as paixões. Visa sobretudo a sociedade dinamizada, movimentada pelos fluxos e refluxos, pelas forças e contraforças que o próprio homem faz desencadear. O teatro de Alfredo Cortez é um teatro social. E, nessa medida, é um teatro ético, pois, expressa ou tacitamente, direta ou indiretamente, o autor sempre lhe imprime a solução da sua consciência e da sua coerência...
E acrescentamos agora uma citação de Luís Francisco Rebello na “História do Teatro Português”:
“Lúcida e amarga, rigorosa e linear na sua quase ascética expressão, a obra de Cortês sobressai de entre a produção representada nesses palcos no período demarcado pelas duas guerras. Zilda e, dois anos depois, O Lodo, (que todas as empresas recusaram e foi posta em cena pelo próprio autor), a primeira situada no meio da alta burguesia, a segunda num prostíbulo, são como que as duas faces, igualmente sórdidas, da mesma medalha, completando-se uma à outra na denúncia implacável do escândalo de uma sociedade que fomenta e permite os próprios vícios que farisaicamente condena”.
E segue uma apreciação das outras peças de Alfredo Cortês: “À la Fè”, “Lourdes”, “O Ouro”, “Domus”, “Tá-Mar”, “Saias, “Baton”… E acrescento “Gladiadores” e as comédias “Modema” e “La-Lás”.
E iremos ainda acrescentar uma longa apreciação de Luciana Stegagno Picchio citada no livro “100 Anos de Teatro Português” de Luís Francisco Rebello:
“No drama simbolista de Cortez confluem o expressionismo alemão, o surrealismo francês e o experimentalismo de Pirandello (as personagens – 10 homens e outras tantas mulheres - são chamados a atuar, diferenciando-se segundo as necessidades do drama), bem como o grotesco à Raul Brandão. Mas o que há sobretudo é a ironia do Cortez intelectual, que sabe não poder ser compreendido por um público até aí fiel e que não quer fugir à experiência do insucesso”.
E muito mais haverá sempre a dizer acerca do teatro de Alfredo Cortez!
DUARTE IVO CRUZ