CRÓNICA DA CULTURA
Entre a imaginação e o real
A nossa espécie, desde o início, tem usado as histórias para se explicar a ela mesma.
A partir das lendas e dos mitos criámos mundos fantásticos e neles os nossos pensamentos acerca da nossa própria natureza.
Na caverna de Platão, as sombras adivinhavam o mundo fora dela.
Na verdade, os nossos medos, as nossas dúvidas, as nossas formas de alcançar as verdades inventando coisas e dando-lhes significados, têm sido uma constante.
Os homens também criaram deuses para aclararem a sua origem e por linguagens e silêncios chegaram a respostas às perguntas e de novo as perguntas e de novo as possibilidades.
Na verdade, embora seja irreal que os tapetes voem, a clareza desta ideia pode virar muitos percursos e incutir a muitos encontros.
Numa viagem sem canoa as histórias estabelecem uma relação entre o mundo da imaginação e o denominado mundo real, e também desafiam a criar o juiz do próprio homem nele mesmo.
Todos gostamos de viajar na nossa imaginação ainda que não vivamos nela na totalidade, mas ela explica-nos muitas razões da necessidade de criarmos os nossos protetores, os nossos pais invisíveis.
Na verdade, muitos contos nem sempre foram originalmente escritos para crianças e muitos deles dizem de nós verdades bem amargas, e outros esclarecem-nos, sobretudo, quando ficamos por nossa conta.
O mundo das histórias da imaginação, diga-se, tem a sua própria lógica interna: tem as regras de um mundo que também não tem como conhecer certezas; tem a não inocência, e pode até ser tão falhado quanto o mundo denominado verdadeiro, mas trata de coisas reais como o amor, a morte, o ódio, o medo, o poder, chegando até todos os sentires por caminhos diferentes.
O mundo das histórias é assim, mesmo que saibamos que não é assim, nem diferente, antes de outro modo, daquele mesmo indizível que vai deixando pegadas ao tempo para que os nossos passos de adultos se não esqueçam de coisas fundamentais.
Teresa Bracinha Vieira