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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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CRÓNICA DA CULTURA

 

A fragilidade da tolerância

 

Há pouco tempo escutava um empresário que insistia perante todos nós naquele almoço, na necessidade de acedermos a todas as culturas, nomeadamente na tolerância de as compreendermos e fazer nossas na parte em que as nossas e as demais se quisessem abraçar. Falava eloquentemente naquele encontro de amigos e conhecidos e defendeu mesmo a medida indispensável de introduzir nas nossas fábricas assalariados chineses, fazendo uma correta ponderação entre os salários deles na China e os que se praticam em Portugal, e que o valor que resultasse da ponderação seria bom para ambas as partes, já que nós tínhamos mão-de-obra mais barata e eles subiam na qualidade de vida pois aufeririam sempre muito acima do que podia ser a realidade deles na China. E voltava a referir a tolerância como a capacidade humana de entender esta escala tão vasta de intercâmbios que a todos favorecia.

 

Confesso que fui perdendo o apetite face àquele teatro de papel seguro na tolerância e fui-me deslocando para Dante refletindo no Purgatório, no Céu e no Inferno tudo cabendo nas estreitas ruas de Florença de onde nunca nada me sufocava e, no entanto, começava a sentir falta de ar com este congeminar da tolerância exposto convictamente pelo empresário que descobrira a fórmula um de auferir o máximo à custa de uma ideia de porte em espaço cerebral mínimo.

 

Assim, da minha parte, coloquei desde logo em questão esta tese de índole moral num contexto de tirar partido de quem humanamente e por lapso se refugia num outro humano que sem lapso o convida para o explorar.

 

Na verdade tudo isto é tão abrangente que até dá guarida à tolerância que fica inteiramente indiferente à fome ou a quem morre de frio no metropolitano de Londres, ou, o mesmo ao desemprego, ou, não fosse este um dos maiores sem abrigo da vida bem suportado pela tolerância, frágil artefacto usado aos domingos, honrando assim os dias santos de guarda.

 

Ou ainda a fragilidade da tolerância não pudesse permitir a cereja no topo de um bolo que desaba no pechisbeque de pretender fazer de coroa de um rei burlesco, como foi o caso deste que num almoço brindou ao realismo empresarial de um novo e tolerante estilo de interpretar.

Teresa Bracinha Vieira