CRÓNICA DA CULTURA
POSTAL 2º
Querida Dulce,
Gostei tanto da tua pronta resposta. E que postal lindo enviaste. Leio que permaneces em Lassa.
Calculei sim, que preferirias o Palácio Vermelho e suas bibliotecas e capelas - eixo central das coisas - ao Palácio Branco, o palácio dos incríveis tesouros de ouro, possante, mas ainda assim reconhecendo os cestos de vime. E, claro, já foste duas vezes ao Palácio de Potala, outrora casa de Dalai Lama, e dele também já pensaste fugir rumo a uma Índia, daí que o teu remetente me não surja absolutamente claro. Diria, sim, que estás no rebordo de uma paisagem e que te espreitas de outra.
Diz-se, querida Dulce, que no Tibete se começa um outro viver, o viver dos cumes, onde e aonde um olhar captor, nos convida a sentir que, ao mesmo tempo, esse mesmo olhar, nos liberta. Ah! Que extraordinário!, que excesso!, uma entrega sem defesa.
No postal anterior, fazia-te notar as razões da equidistância, aquelas que nos baralham, se não pensarmos o quanto somos furtivos e inábeis no conhecer mundos. Agora, proponho-te, que aí, desates os pés e experimentes sabores novos e descalços, e mais te proponho: deixa que que ao teu peito prevaleça uma segunda escolha. Ao teu nariz chegará um cheiro desconhecido, exalado da indagação. Diverte-te, pois, com ele. Descobre-lhe o enigma, chama-lhe viagem.
Agorinha mesmo, doce Dulce chegou-me à memória o cheiro dos pinhais da nossa infância. O ruído do vento por entre as pinhas. O estalar da caruma sob as sandálias. De repente, ali abri os braços, fechei os olhos, rodei em mim vertiginosamente. Quando parei, tu, habituada àquele ritual disseste-me, tranquila:
Um dia vou escrever-te tantos postais, Isa!, mas tantos!, como se estivesse muito longe daqui.
Abraço desta tua amiga
Isa
Teresa Bracinha Vieira