CRÓNICAS PLURICULTURAIS
91. FICÇÕES DO TEMPO
Santo Agostinho, em Confissões, reconhece três tempos: “Um presente das coisas passadas, um presente das coisas presentes, e um presente das coisas futuras. O presente das coisas passadas é a memória; o presente das coisas presentes é a vida, e o presente das coisas futuras é a espera”.
A realidade existe apenas no presente, que é o tempo permanente em movimento.
Como também opina Fernando Pessoa, em Ano Novo:
“Ficção de que começa alguma coisa!
Nada começa: tudo continua.
Na fluida e incerta essência misteriosa
Da vida, flui em sombra a água nua.
Curvas do rio escondem só o movimento.
O mesmo rio flui onde se vê.
Começar só começa em pensamento”
Ou se deduz do fado Vida Vivida, cantado por Argentina Santos:
“Meu Deus, como o tempo passa
Dizemos de quando em quando
Afinal o tempo fica
A gente é que vai passando”
Daí que passado e futuro sejam referências a um tempo inacessível que já foi ou que potencialmente virá a ser, mas que não é, sendo o presente real, mas efémero e fugidio, pois o tempo é criado por nós, em pensamento e na nossa mente, como o ano velho e o novo que se augura que venha.
31.12.21
Joaquim Miguel de Morgado Patrício