CRÓNICAS PLURICULTURAIS
Fotograma do filme “Peço a Palavra!”
212. A VERDADE
Se se aceita que a verdade existe acima da nossa vontade e não é criada por nós, seja ela genuína ou moral, conclui-se que é uma descoberta, pois há leis da natureza e morais que nos ultrapassam, que foram descobertas pela ciência e codificadas na tradição do direito natural e universalidade de direitos tidos como inalienáveis.
Se se aceita que não há verdade objetiva, de que só há vontade e perspetivas subjetivas, tudo é relativo, não se aceitando qualquer universalismo (científico ou outro) e os direitos indisponíveis, entre estes os direitos humanos, surgindo um indeterminável número de narrativas sem validez objetiva.
Aceita-se, em qualquer caso, que temos de ser nós a decidir-nos por uma vontade normativa e modo convivencial para podermos viver, mesmo que se argumente que a verdadeira essência da condição humana está no caos e se aceite que há uma verdade ficcional onde a verdade autêntica não vem ao de cima.
Se a verdade implica sempre uma decisão, uma opção, como algo que lhe é inerente por natureza, pode concluir-se que ser imparcial é impossível, não é natural nem humano.
As pessoas querem ver-nos a concordar ou a discordar, a aprovar ou desaprovar, tomando uma posição, e não a dizer nada ou não tomar partido.
Mesmo quando ocultamos os nossos sentimentos e maneira de pensar, tentando ser neutros, há sempre uma interação entre duas ou mais pessoas no espaço público, onde há uma soma de regras que é necessário respeitar, assentes numa vontade/verdade convencionalmente estabelecida, que é a verdade possível, onde a tolerância da pluralidade de ideias não pode ser feita sem filtros.
09.05.25
Joaquim M. M. Patrício