EVOCAÇÃO DE AGUSTINA BESSA-LUÍS
Este quadro de celebrações da morte de Agustina Bessa-Luís, ocorrida no passado dia 3 de junho, tinha a escritora-dramaturga 96 anos de idade, leva a uma ponderação-reflexão da sua obra literária sem dúvida, mas também das criações e intervenções que marcaram não só a obra escrita, mas também a criatividade e produtividade do teatro-espetáculo: e tudo isto, numa abrangência de ações, géneros e áreas de intervenção que em si mesmas caracterizam a própria essência do teatro como espetáculo.
Porque não é de mais recordar que teatro é texto mas é texto-espetáculo, ou pelo menos tal será a sua essência e vocação.
E nesse aspeto, Agustina marcou e sempre marcará o teatro português, como dramaturga, mas também como diretora que foi do Teatro Nacional de D. Maria II e sobretudo como pensadora da própria realidade da arte do teatro, na sua expressão essencial de texto e de espetáculo.
E nesse aspeto, importa então recordar algumas das criações/intervenções de Agustina ao longo de dezenas de anos e num somatório devidamente articulado e como tal coerente da diversidade compósita da arte do teatro-espetáculo. Porque, insista-se, o teatro é espetáculo concreto ou potencial.
Como dramaturga, estrou-se em 1958 com uma peça que denominou “O Inseparável ou o Amigo em Testamento”. Luis Francisco Rebello qualifica a peça como “comédia enigmática” e sublinha “um eco de existencialismo literário, pouco frequente na nossa dramaturgia, expresso através de uma ação jogada entre o real e o imaginário”. E refere ainda diversas peças para a televisão: “Os Cartazes”, “Xarope de Orgiata”, “Querido Kock”, “Ana Plácido” e “A Bela Portuguesa”.
Por minha parte, refiro em particular as afinidades de temática entre “O Inseparável” e “A Bela Portuguesa”. De certo modo, essa peça constitui o cerne do teatro de Agustina e o maior vetor da sua análise existencial.
Cito o que escrevi na “História do Teatro Português”:
«As reflexões sobre a verdade constituem o cerne de “A Bela” e do teatro de Agustina e o maior vetor da sua análise existencial; Madame Nachan é assim de certo modo, “o amigo em testamento” que não existiu na forma aparente, mas apenas no segundo plano existencial. Ora essa reflexão profunda, que é o mérito e o desafio do teatro de Agustina»... e segue a reflexão sobre o teatro de Agustina Bessa-Luís, com comparações a uma peça sobre Garrett.
E voltaremos a referir a intervenção de Agustina na criação, na cultura e na produção do teatro em Portugal.
DUARTE IVO CRUZ