Evocação de António Braz Teixeira como diretor do Teatro Nacional de D. Maria II (II)
Vimos em crónica anterior o repertório selecionado por António Braz Teixeira no período em que desempenhou funções de diretor do Teatro Nacional de D. Maria II (1982-1985). Tenha-se então presente que esta escolha e execução reflete e documenta uma abordagem efetivamente adequada à função cultural de um Teatro Nacional, designadamente nos aspetos de qualidade e de equilíbrio peças portuguesas e de outras dramaturgias, e entre autores clássicos e autores modernos.
Importa agora salientar a intervenção de António Braz Teixeira na ponderação analítica de dramaturgos que detalhadamente estudou.
Citei já, noutras ocasiões, a análise ao teatro de José Régio numa perspetiva profunda de conteúdos.
Escreveu António Braz Teixeira sobre a religiosidade expressa ou implícita do teatro de Régio:
“A redenção é puramente individual – cada homem está irremediavelmente só com o seu sofrimento. Só rendendo-se ao Espírito, humilhando-se, recusando-se ao mundo, morrendo e ressuscitando – pois o único sofrimento real é o de não ser Espírito, o de ser homem, cada homem, um ser desgarrado e exilado do espírito – é possível, a cada um, redimir-se” (in “Sobre o Teatro de José Régio” in Espiral nº 6/7 - 1964).
Acrescento agora que tive o gosto de colaborar nessa publicação com dois estudos sobre o teatro de Raul Brandão e sobre o teatro de Almada Negreiros. E relendo a revista, encontro um longo e extremamente interessante artigo de António Braz Teixeira intitulado “Possibilidade e Realidade do Teatro Português”.
Dele extraio uma passagem:
“Descontínuo e intermitente, como que renascendo e morrendo em cada novo dramaturgo, o teatro português tenta novos caminhos no saudosismo virtualmente trágico do «D. Carlos» de Pascoaes, no drama estático de Fernando Pessoa, na redescoberta da pureza luminosa das peças de Almada Negreiros, na atmosfera poética em que, no teatro de António Patrício, o amor e a morte se digladiam e se fundem, na interrogação metafísica sobre a condição humana que obcessivamente perpassa nas farsas trágicas de Raul Brandão, na pluralidade de experiências que, em irrequieta e insatisfeita busca, regista o teatro de Alfredo Cortez, do historicismo ao expressionismo, do drama citadino, apologético ou de cítica social, ao teatro popular ou mesmo regionalista, no simbolismo espiritualista dos mistérios religiosos, dos poemas espetaculares, dos dramas, das farsas e tragicomédias de José Régio, o vigoroso teatro de Bernardo Santarenos, na autenticidade da sua raiz popular e da sua incontida apetência trágica, na dramaturgia social e de aspiração metafísica, de Luis Francisco Rebello, no teatro filosófico de Orlando Vitorino e Afonso Botelho ou nas tentativas de recriação de um novo auto narrativo de Luis Sttau Monteiro e José Cardoso Pires.”
Assim escreveu pois António Braz Teixeira. E como é atual a sua reflexão sobre o teatro português!
DUARTE IVO CRUZ