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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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EVOCAÇÃO DO TEATRO NA OBRA DE MANOEL DE OLIVEIRA

 

Em Serralves, foi recentemente inaugurada a Casa de Cinema Manoel de Oliveira. Merece referência esta sala de espetáculos, a partir da homenagem que a designação contem. Pela vida, excecionalmente longa, pela obra, excecionalmente qualificada e como tal reconhecida, e pela projeção internacional que com toda a justiça alcançou.


Evoca-se pois a obra e a atuação de Manoel de Oliveira na adaptação e realização cinematográfica de peças e demais expressões de teatro. E há que atender à cronologia, não só do realizador/encenador (absolutamente excecional: 1908-2015!...) como também do conjunto de peças que transpôs, seja permitida a expressão, para a potencialidade cénica e cinematográfica.


E isto porque em rigor, a dramaturgia filmada e adaptada por Manoel de Oliveira assenta numa capacidade de espetáculo que tanto se molda à cena como à projeção: sendo certo que Manoel de Oliveira é sobretudo um criador de cinema.


E se considerarmos a cronologia, não tanto dos filmes como das peças subjacentes, encontramos desde logo um texto clássico: o “Auto da Muito Dolorosa Morte e Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo” da autoria do Padre Francisco Vaz.  Datado de 1559, portanto há exatos 460 anos, mas, ainda há relativamente pouco tempo representado em Trás-os-Montes, foi filmado por Manoel de Oliveira em 1963 no filme que denominou “Ato de Primavera”.


E é interessante constatar que a expressão dramática em si mesma é como que transposta para a expressão e criação cinematográfica, não obstante, note-se ainda por cima, a difícil dramaticidade deste longo texto.


Mas há mais textos de teatro adaptados ao cinema por Manoel de Oliveira.


Desde logo, José Régio. “Benilde ou a Virgem Mãe”, peça datada de 1947, e “Mário Ou Eu Próprio – O Outro”, esta datada de 1957, foram ambas filmadas por Oliveira: e quando escrevemos “filmadas” temos bem presente a recriação cinematográfica, digamos assim. E não é fácil transpor para a estética e sobretudo para a técnica cinematográfica um texto criado e vocacionado para a expressão teatral...


O que mostra a globalidade do sentido estético de Manoel de Oliveira no que se refere a espetáculo: com o circunstancialismo de que no cinema, a estética envolve e exige a técnica respetiva!


A sua excecionalmente longa vida permitiu portanto uma excecionalmente longa atividade: e merece referência especial a sucessiva adaptação de obras ligadas à criação literária. Já citamos Régio, mas também Camilo Castelo Branco, Agustina Bessa Luís, António Patrício, e sobretudo, o próprio Manoel de Oliveira, que tantas vezes se assume como escritor, ao criar textos que filmou...


Saúda-se pois esta iniciativa que consagra, num edifício do Arquiteto Álvaro Siza, a obra ímpar de um cineasta português, internacionalmente reconhecido e consagrado.


E voltaremos ao assunto.

 

DUARTE IVO CRUZ