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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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GARRETT NAS ORIGENS DO TEATRO BRASILEIRO

 

Voltamos a Garrett, agora na perspetiva da sua influência na formação da dramaturgia romântica brasileira. Mas começamos a análise numa época bem anterior ao início incontestado do romantismo no teatro do Brasil.`´

Com efeito, já em 1816, na primeira versão do “Bosquejo da Poesia e da Língua Portuguesa”, obra restruturada exatos 10 anos depois, Garrett confere à poesia brasileira um destaque de certo modo iniciático nos estudos literários entre nós. E esse interesse pela expressão literária do Brasil encontra como que uma “retribuição”, em termos da literatura e da criação dramática, na iniciação do romantismo no teatro brasileiro.

É certo que a prioridade romântica do teatro brasileiro é geralmente atribuída a Gonçalves Dias e designadamente á sua primeira peça, “António José ou o Poeta e a Inquisição”. De notar que Magalhães editou em Paris, em 1833, a revista “Niteroi”, iniciática para o romantismo brasileiro. E vamos encontrar já a seguir Garrett, também em Paris, em contacto com escritores brasileiros.

 O  “António José” de Magalhães  foi estreada no Rio de Janeiro em 13 de março de 1838: o  garretteano “Um Auto de Gil Vicente” é estreado em Lisboa cinco meses depois, quase dia por dia – 15 de Agosto de 1838. Ora, se formos comparar a qualidade e “modernidade” das duas peças,  há que reconhecer  desde logo a muito maior expressão cénica e literária da peça de Garrettt.

E mais: Gonçalves de Magalhães, aliás escritor de grande expressão, só voltaria ao teatro em 1839 com a peça “Olgiato”, esta passada em 1470 em Milão, com uma curiosidade: o protagonista-motivador da intriga, o Duque de Sforsa, nunca entra em cena!...

Por esta época, Garrett relaciona-se em Paris com o dramaturgo e artista plástico Manuel de Araújo Porto Alegre, o qual, em 1833, pintou um retrato de Garrett fardado de Voluntário Académico, ao serviço do futuro D, Pedro IV. Como dramaturgo, Porto Alegre inicia carreira com um “Prologo Dramático” (1837) a que se seguiram algumas peças, designadamente “Angélico e Firmino” (1845) e  “A Estátua Amazónica” ( 1851).  Mas na já citada revista “NIteroi”, Porto Alegre publicou em 1851 um estudo que curiosamente se aproxima da análise economicista contida no prefácio de “Um Auto de Gil Vicente”.

Diz  Garrett : ”O Teatro é um grande meio de civilização mas não prospera onde a não há. Não têm procura os seus produtos, enquanto o gosto não formar os hábitos e com eles a necessidade. Para principiar, pois, é mister criar um mercado fictício”. 

!3 anos decorridos, Porto Alegre escreveu: “Sem público não há arte alguma que vigore; sem público não há artistas que progridam (…) o público é o grande educador de todas as artes e seu juiz de facto”…

E mais: em 1843, Porto Alegre empreende a criação do Conservatório Dramático do Rio de Janeiro, consagrado por “Aviso Imperial” datado de 24 de Abril daquele ano. E novamente aí podemos encontrar ecos da reforma de Garrett, consagrada na Portaria de 15 de Novembro de 1836, que criou o Conservatório Geral de Arte Dramático e reformulou toda a atividade institucional do teatro português.

E finalmente, temos Gonçalves Dias,  estudante em Coimbra, afirmando-se expressamente “discípulo” de Garrett e autor, entre mais peças, de um interessante drama histórico, “Leonor de Mendonça” (1847).

Em 1 de janeiro de 1836, o Marquês de Loulé, Ministro dos negócios Estrangeiros na época,  escreve a Garrett, propondo-lhe a nomeação para a Legação de Portugal no Rio de Janeiro  num cargo hoje correspondente ao de Embaixador. Garrett  desempenhara essas funções em Bruxelas, junto da então recente Corte belga (1834-1835/36) . Exerceu também cargos e  funções  diplomáticas diversas: mas terá recusado, com alguma alacridade, essa nomeação para o Rio.

E no entanto, podemos imaginar a influencia que viria a ter na formação e renovação do  teatro romântico brasileiro!  

 

DUARTE IVO CRUZ