Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

LONDON LETTERS



The flood crisis
II, 2014


 

Appalling, indeed. O agravamento das condições meteorológicas faz já das bacias hidrográficas do sul um monumental waterworld. Pessoas e animais, casas e infraestruturas básicas estão debaixo ou sob ameaça de cheia. Mas mais que a gradual subida do nível freático e dos pedidos de socorro, o líquido cinismo da resposta oficial às dificuldades é quase inenarrável. Tanto que o Prime Minister David Cameron se vê forçado a liderar as operações, e a elevar o tom de voz uma décima, quando diretos responsáveis antes encolhem os ombros e optam por pública sessão do blame-game. — Il y a des gens qui n'ont de leur fortune que la crainte de la perdre. A situação é séria. A multiplicação dos incidentes depois do lago consumado em Somerset alastra a Wraysbury, Dachet e Shepperton, até zonas afastadas da costa e das linhas ribeirinhas. Porém, entre a imprevidência e o business as usual de uns quantos, tempo de antena há para political snippers. — Well, criticism is easy, art is difficult! A retroficção é impressa em torno de figurinhas cujo talento num apuro é explorar as media opportunities. No Thames Valley há peixes exóticos e cisnes em águas abertas.

Os serviços de emergência estão finalmente no terreno 24x7. Chegada a national response, importa perguntar com Su Borrows no Berkshire: — O que é preciso dizer ou fazer para um qualquer burocrata enviar o socorro pedido e prometido, dia após dia, uma vez, outra, e outra, e outra ainda! Entre o topo e as bases nos centros decisórios existem muros a abater, pois custam vidas e bens, sobretudo sofrimento. Será que pensam ser apenas uma inconveniência!? Daquelas a vedar à intervenção do nanny-state? Ainda assim, se em Somerset Levels famílias e comunidades ficaram isoladas durante semanas, no Thames Valley, o retrato é já diverso. Com a ajuda militar, rua a rua, as pessoas – muitas in tears – abandonam as suas casas com nada senão os animais de estimação. No meio do drama, todavia, vultos do establishment pontuam os atos segundo o inquérito público que se há-de fazer sobre este imenso desastre.

O perigo está para ficar, aliás. A malha dos UK boreholes que medem os aquíferos subterrâneos indica consistentes valores no vermelho. A terra está saturada, os rios transbordam e a chuva cai copiosamente. Muitas localidades estão evacuadas e o dano nas redes de energia e transportes é pesado na orla costeira, com a base económica das famílias desarticulada. Somerset mostra há dois meses a severidade do desafio; simplesmente foi ignorado. O impensável ocorre, por manifesta falta de liderança, coordenação e comunicação. E por vezes bastaria a existência de um uniforme nas comunidades abandonadas à sua sorte, primeiro, objeto de amáveis declarações para a plateia, depois, e hoje transformadas em curiosidade a suscitar volumoso turismo político.

Lições, e não recriminações, há a extrair de primeiro auxílio cuja avaliação é too late & too little. A demora acompanhada do Head da agência responsável revivificando um best of do lendário Sir Humphrey Appleby, do Yes, Prime Minister, incluindo responsabilizar o governo e as vítimas por iniludível falha, naturalmente em defesa do profissionalismo dos seus funcionários, impõe mitigar a previsível enxurrada em Westminster nas próximas eleições. – So, gentleman, please: Not words, action.

 

St James, 11th February

 

Very sincerely yours,

 

V.