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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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MEDITANDO E PENSANDO PORTUGAL


32. LIBERDADE E SEGURANÇA (II)


Com o 25 de abril democratizámos. 


Mas a nossa democracia não factualizou, embora a consagre, a liberdade como valor prioritário, mas sim a segurança.   


Por razões históricas, a antiga aceitação da liderança por instituições e pessoas onde o poder está estritamente concentrado, continuou após abril de 1974. 


Tal tolerância é uma tradição que tem raízes no passado, em fenómenos estruturantes de cariz totalitário, por contraste com menos anos de constitucionalismo liberal. 


O que tem reflexos no não culto do debate público e exercício do contraditório, não uso da reclamação, nem de expressões assertivas, francas, frontais e diretas, mesmo que incómodas.


E no não uso robusto da liberdade, com todas as inevitáveis e estruturais consequências danosas a nível da educação, ciência, investigação, criatividade e grau de desenvolvimento.


A que acresce a ausência duma classe média maioritária, pagadora de impostos, exigente, instruída, reclamante e reivindicativa. 


Se na luta entre fortes e fracos, quem governa tende a dominar os governados e se estes, mesmo assim, se conformam, não escrutinam ou dizem bem daqueles, não se justifica a liberdade, pois só nos interessa tê-la quando somos perseguidos pela nossa contundência e sentido crítico.


Dizer bem e concordar, não acarreta o perigo de perseguição, exílio, prisão ou morte, pelo que faz falta tal liberdade para podermos opinar sobre coisas não elogiosas, polémicas, escandalosas, que magoam e de que não gostamos, desde que não se opine ou publiquem notícias de consabida falsidade, falte à verdade ou se façam afirmações por maldade ou malvadez, ou grosseiramente investigadas por omissão. 


É esta liberdade que me possibilita, aqui e agora, não me sentir censurado ou espiado, que gostaria de ter permanentemente garantida e vivida, e não apenas formalmente consagrada ou restaurada por lei no meu país. 


Que não se baseia em messianismos fundados num milagre ou salvador que nunca veio, na desistência de pensar ou mero gerir da saudade, no bota-abaixo, de dizer mal de tudo e todos, festança e papança sem responsabilidades, de querer todos os direitos sem deveres. Embora proibir, condenar e mandar alguém para a prisão, por opinar e pensar mal, possa ser um atentado a essa liberdade.   


Trata-se dum itinerário com sucessivas viagens, em que a democratização foi um meio que nos aproximou da democracia pluralista da União Europeia a qual, mesmo em crise, nos exige como pressuposto e objetivo um pluralismo em liberdade, só assim garantido, de momento, entre nós, por confronto com a longa noite de fenómenos estruturantes, totais e totalitários do nosso historial.


Sem esquecer que quem está no topo aprecia predominantemente o status quo vigente, razão pela qual o exercício e garantia dos direitos fundamentais são uma defesa contra os excessos do poder estadual e dos poderosos, pois se perdermos a liberdade (liberdades fundamentais e direitos humanos, onde se integram a liberdade de expressão e o direito à informação), acabamos por perder também a segurança.

19.11.21
Joaquim Miguel de Morgado Patrício