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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

MIGUEL GALVÃO TELES (1939-2015)

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Foi o meu primeiro professor de Direito. Jamais esquecerei esse dia de novembro de 1969. Percebemos desde o primeiro momento que o Direito Constitucional a sério tinha de ter a marca indelével da liberdade e da democracia.
Nunca mais perdemos o contacto. Como jurisconsulto foi um dos mais brilhantes que alguma vez conheci. Desde muito novo, dando continuidade a uma tradição familiar, manifestou-se como alguém dotado de uma sensibilidade, de uma inteligência, de uma argúcia e de uma capacidade singularíssima para procurar soluções por caminhos novos e inesperados. Era sempre capaz de ver para além do que era mais evidente, e assim era capaz de ajudar na solução de complexas dificuldades.
Para o Miguel o Direito não era uma ciência formal ou rígida, era um instrumento dinâmico para resolver problemas. Para si o advogado era o primeiro elemento da administração da justiça, e acreditava que a primeira instância dos tribunais estava no escritório do causídico. Por isso, nos ensinou sempre que o mau advogado é o que usa subterfúgios e procura fugir à essência dos problemas.
Como cultor do Direito Público, entendia que o Estado de Direito e a cidadania se afirmam e reforçam pelo equilíbrio de poderes e pela assunção com todas as consequências da lição de Montesquieu – só o poder limita o poder. Por isso, «As Cartas Persas» eram para ele uma ilustração essencial da exigência de uma salvaguarda dos direitos fundamentais a partir do respeito mútuo, da confiança entre poder e cidadãos, como articulação entre legitimação e legitimidade.
António Araújo designou-o como «il miglor fabro». Não pode haver expressão mais adequada. No mundo do Direito ele foi dos melhores. A sua lição não pode ser esquecida. E nós, seus alunos, nunca olvidaremos o seu desassombro, nos momentos mais difíceis, e nas mais diversas circunstâncias, na defesa da liberdade e daquilo que Isaiah Berlin designou como uma sociedade decente. Coerente, aberto, rigoroso, correto, amigo, solidário – cidadão a toda a prova!

Guilherme d'Oliveira Martins