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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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O CONVENTO DOS CAPUCHOS – PRÉMIO EUROPEU 2022

Convento dos Capuchos

 

A flora que conhecemos na Serra de Sintra é constituída por árvores peregrinas vindas do Oriente, troféus da Índia, trazidos por D. João de Castro, que mudaram a paisagem e o clima desse lugar que entusiasmou Lorde Byron. A Penha Verde, encantadora para William Beckford, está na origem desse povoamento. As ermidas, as fontes, as casas nobres e os maravilhosos pontos de vista definem um lugar paradisíaco. Mas o 4.º Vice-Rei da Índia deixou a seu filho D. Álvaro uma misteriosa disposição testamentária, que chegou aos nossos dias. Falo-vos do Convento dos Capuchos, fundado em 1560, na sequência de um sonho, de encher estes picos da Serra “de ermidas e de suas vitórias, uma coisa cheia de humildade e de grandeza - desterro para poetas, construído por poetas”, no dizer de Raul Brandão. “Suspenso entre a abóbada do céu e a planície ilimitada”, ali se descobre “tudo quanto há de grande, o céu, a terra, o mar”. E quando o rei Filipe I veio a Sintra afirmou que possuía a ventura de ter nos seus reinos o mais rico e o mais pobre dos conventos, pensando no Escorial e nos Capuchos.

 

Visitar o Convento dos Capuchos é um momento raro. Depois de serpentar pela Serra com o ar puro da montanha e do mar, chegamos ao Terreiro das Cruzes, onde se invoca a paixão de Cristo. Tudo é figuração do paraíso, verdejante e fecundo. O acesso ao convento faz-se pelo pórtico das fragas, entre dois blocos de granito. O sino servia para chamar o frade guardião. E entramos no Terreiro da Fonte, lugar de acolhimento, onde só não ouvimos o cantar da água, pela seca que vivemos. E logo o alpendre ressalta à vista, com a cruz imponente e a pintura quase impercetível do frade crucificado, com hábito de menor, capuz e cordão de três nós, da pobreza, da obediência e da castidade. À direita do alpendre está a capela da Paixão. E recordo, há mais de vinte anos, a visita com António Alçada Baptista, Jean-Marie Domenach, Helena e Alberto Vaz da Silva, saudosos amigos. E associo as imagens do filme de Joaquim Sapinho “Deste Lado da Ressurreição”. A intensa espiritualidade obriga a invocar a memória da amizade…

 

A portaria do lado esquerdo é encimada por uma caveira e duas tíbias. As armas dos Castros lembram os fundadores. O templo está sob a grande rocha de granito que domina a gruta, para lembrar o sonho que criou o convento. O altar-mor destaca-se pelo contraste entre a simplicidade e o mármore do altar, com policromia magnífica e belos embutidos. O coro alto associa os cânticos e as visitas mais ilustres. A cortiça que reveste as paredes protege do frio e da humidade. E abre-se, num frémito, o corredor das celas, lugar de oração e de pobreza. Impressionam as portas, baixas e estreitas. Os frades dormiam no chão, em esteiras ou placas de cortiça. No refeitório, uma lasca de pedra rugosa servia de mesa para os alimentos das hortas e os donativos de queijo, azeite, ovos e peixe, além do vinho eucarístico. A cozinha era ampla também para servir os pobres e peregrinos. E a água das duas nascentes, usada com parcimónia era um importante elemento de purificação. As enfermarias e a botica, o pequeno capítulo, o claustro, a Ermida do Senhor no Horto, tudo nos encanta, até que S. Francisco e Santo António, em dois frescos de André Reigoso, se despedem amorosamente de nós…

GOM