Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

OS 60 ANOS DE “FELIZMENTE HÁ LUAR”

felizmente ha luar.jpg

 

Merece referência especifica a evocação da peça “Felizmente Há Luar” de Luís de Sttau Monteiro (1926-1993) peça escrita em 1961, há exatamente 60 anos. Fazemos-lhe referência, a partir do conceito de modernidade que marca ainda hoje a obra dramatúrgica do autor. E é de assinalar designadamente que o temário histórico não afeta a atualidade da peça em si, pela expressão técnico-dramatúrgica, mas também pelas características de estrutura que a peça nos fornece: e é de assinalar, insista-se, na atualidade de técnica e de conteúdo que a peça em si mesma envolve.

E é interessante referir a concentração de elementos históricos e estilísticos de “Felizmente Há Luar”. Trata-se de uma visão/evocação histórica da conspiração e da intervenção política deviamente enquadrada na época que dramatiza, mas que não deixa de relevar uma atualidade que não perdeu impacto, nestes 60 anos ocorridos, e sobretudo nas mudanças que, entretanto, marcaram a evolução do país em si mesmo…

Portanto, uma visão historicista mas em si mesma também política de Portugal na época histórica retratada e dramatizada. E seja-nos permitida uma citação vasta que fizemos na “História do Teatro Português” (ed. Verbo 2001).

Aí escrevemos que “Felizmente Há Luar” dramatiza, com excelente técnica narrativa, a conspiração de Gomes Freire de Andrade. Entretanto, o entrecho leva ao relevo da temática grupal e problemática social em determinantes de tempo e de lugar, de ideologia e de conduta que, para o autor, explicam o devir histórico. O povo, por exemplo, é uma das forças da ação. Necessariamente abstratizado, simbolizado, a sua contraposição dialetal encarna também num jogo de personagens símbolos, aliás por vezes pormenorizadamente descritos: Beresford, Principal Sousa, D. Miguel Pereira Forjaz, Morais Sarmento e Andrade Corvo.

E acrescentamos agora que esta dramaturgia valoriza sobremaneira o recurso a uma espécie de simbolismo técnico-dramatúrgico, tornamos a dizer.

E poderíamos continuar a transcrever citações: mas apraz-nos fazer apenas mais uma, agora de José Oliveira Barata a propósito do “Felizmente Há Luar”. O que transparece é uma visão reticente da expressão dramática a partir de análises da realidade concreta. E vale por isso esta transcrição, quanto mais não seja pela análise tal como é assumida, e isto independentemente da apreciação crítica em si mesma. Diz então Oliveira Barata:

“Independentemente de continuarem a ser válidos todos os argumentos que fazem desta peça um bom exemplo de aproveitamento de um episódio da nossa história, tratado e servido por novas e inovadoras técnicas dramatúrgicas, facilmente nos apercebemos que, apostando num objetivo situado, hoje se pode eventualmente perder muito da eficácia desejada. Por outras palavras, “Felizmente há Luar” escrita e pensada para ser eficaz num determinado contexto histórico, embora não perca os valores intrínsecos da sua intensa arte dramática perde, no entanto, na eficácia didática, uma vez que se alteraram os referentes para que imediata ou mediatamente remetia.” (in “História do Teatro Português”, ed. Universidade Aberta, 1991, pág. 165).

Duarte Ivo Cruz