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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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SÁ DE MIRANDA E A INTERNACIONALIZAÇÃO DO TEATRO PORTUGUÊS

 

Será oportuna esta evocação da obra teatral de Sá de Miranda (1481- 1558), dada a perspetiva de internacionalização cultural e de certo modo técnica, aplicável à criação dramatúrgica em si mesma: e isto, não obstante essa produção, na obra que agora analisamos, ser escassa.


Luiz Francisco Rebello, na “História do Teatro Português” (3ª ed. 1981) refere que a Sá de Miranda se deve “a primeira tentativa de integração” das “novas estruturas dramatúrgicas impostas pela estéticas renascentista”.  De Sá de Miranda chegaram-nos apenas duas peças: “Estrangeiros” (1528) e “Vilhalpandos” (1538), além de um esboço em verso, não consagrado, que intitulou “Cleópatra”.


Temos pois um dramaturgo limitado a duas obras: e no entanto, justifica-se a referência, pois significa, nas suas óbvias limitações, como que uma internacionalização do teatro produzido em Portugal.


Escassa dramaturgia, portanto. Mas importa ter presente aspetos específicos que se prendem com a internacionalização cultural que estas peças, em si mesmas, envolvem. Não é por acaso que tal ocorre.


Sucede efetivamente que Sá de Miranda parte para Itália em 1521, portanto há praticamente 5 séculos. Nestas vésperas de consagração cronológica, justifica-se a evocação, mesmo admitindo desde já que a dramaturgia em si mesma de Sá de Miranda, como vimos é escassa e não é especialmente relevante: mas importa verificar como representa uma “internacionalização” cultural, digamos assim, com base em influências relevantes da época e ainda hoje: e isto, não obstante a qualidade relativa das expressões dramáticas em si mesmas. Pois de facto Sá de Miranda não é especialmente marcado pela técnica já então muito desenvolvida, sobretudo no teatro italiano.


E a esse respeito, é oportuno citar precisamente a opinião da historiadora italiana Luciana Stegagno Picchio, que dedicou ao teatro português estudos de relevo muitas vezes aqui referidos. Pois, a propósito da peça “Estrangeiros” Luciana escreveu:


“Embora a ação de “Os Estrangeiros” decorresse em Palermo e as personagens ostentassem nomes de feição clássica (Amente, Devorante, Petrónio, Cassiano), o todo exalava ainda um saboroso perfume ibérico, composto de grosseiros jogos de palavras, de pescar de olhos, de concessões a um público plebeu acostumado às chalaças vicentinas, tão caseiras, tão pejadas de história local”, assim mesmo!... (in “História do Teatro Português” 1960)


E terminamos esta evocação com uma longa transcrição da dedicatória de Sá de Miranda em “Estrangeiros” ao Cardeal D. Henrique, que citamos na nossa “História do Teatro Português” (2001):


“A comédia, qual é tal, aldeã e mal ataviada. Esta só lembrança lhe fiz à partida, que não se desculpasse de querer às vezes arremedar Plauto e Terêncio, porque em outras partes lhe fora grande louvor, e se mais também acoimassem a pessoa de um Doutor, como tomada de Ludovico Ariosto, que lhe pusesse diante os três advogados de Terêncio, dos quais um nega, outro afirma, o terceiro duvida, como ainda acontece: assim que desde aquele tempo já vem o furto.”


Assim mesmo! E vale a pena recordar como a história do teatro em Portugal, apesar das limitações, é variada!...

DUARTE IVO CRUZ