A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
LXXXIII - O VÍRUS DO ANGLICISMO
Saber inglês é hoje uma ferramenta necessária para quem estuda, investiga, trabalha, viaja e tem de ter acesso ao mundo globalizado. Em todas as épocas há uma língua franca, sendo a de hoje o inglês.
Os avanços técnico-científicos permitiram uma globalização que possibilitou uma maior proximidade, em que o inglês foi promovido a língua dominante nas empresas que controlam a produção, beneficiando-o nos impressos e folhas de instruções, nas etiquetas, caixas, distribuição, transportes, publicidade, ou seja, em todas as apresentações e disponibilização do produto desde a origem ao consumidor.
Esta permissividade tem condições especialmente favoráveis em países que têm falta de autoestima ou uma fraca imagem de si em termos económicos, onde o estrangeiro associado aos mais ricos é que é bom, sinónimo de culto, moderno, desenvolvimento e prestígio. Por vezes há ausência de legislação obrigatória quanto ao uso da língua materna ou oficial nas instruções e nos rótulos dos produtos importados. E quando há legislação, nem sempre os entes competentes a fazem cumprir, sendo injustificável que se invoquem dificuldades na sua implementação ou fiscalização. Não fazer cumprir uma lei também é uma opção e estratégia, tida como uma mera exigência do politicamente correto, sem conteúdo prático.
Por questões de imagem e de redução de custos, a língua da empresa é a da casa mãe, que não se compadece com traduções, com perda de tempo e de dinheiro, o que é agudizado pelo facto de, no atual momento económico, a sua sede ter a maior probabilidade de ser num país anglófono, ou que tenha tão só o inglês como língua de comunicação global.
Opta-se quase sempre pelo idioma tido internacionalmente como mais conveniente, o das empresas multinacionais, em que a língua da empresa é a do país onde está a inovação criativa e o dinheiro, sendo a língua do poder.
Esta imposição do inglês como língua económica, cultural e política, é tida, por vários autores, como imperialismo linguístico e um vírus do anglicismo.
O uso de palavras ou frases estrangeiras no nosso dia a dia, por necessidade ou diversão, não é censurável. O seu abuso, sim, nomeadamente do inglês, sob uma capa apelativa da modernidade, como o exemplificam, entre nós, tantos concursos televisivos, desde o Big Brother, Got Talent Portugal, The Voice Portugal, The Voice Kids, Love on Top, All Together Now, Fama Show, TV Shop, Kitchen Team, Hell`s Kitchen, etc.
Agudizado pelo linguajar e a gíria que usa e abusa de anglicismos na economia, gestão, cultura, ensino, política, novos condomínios de luxo ou de topo, recentes urbanizações universitárias, muitos deles desnecessários ou por preguiça em não encontrar designação adequada no nosso idioma. Ou sem haver a preocupação de pedir ajuda a linguistas ou instituições vocacionadas para o efeito, embora estas devessem estar atentas e antecipar-se a uma cada vez mais virulenta massificação, fazendo falta uma academia que se ocupasse das respetivas traduções, quando necessário. Por que não o Instituto Internacional da Língua Portuguesa, ou similar, no âmbito da CPLP?
Porquê ficarmo-nos cada vez mais por uma língua estrangeira em novos termos e expressões de avanços técnico-científicos, económicos, financeiros, de gestão, entre outras áreas?
O que é agravado pela abdicação a que chegou o público ao excluir, pela primeira vez, a língua portuguesa para o festival da eurodemissão.
Há que estabelecer regras e prioridades, não queiramos ser universais sem diversidade, pois a indiferença, o desdém e a tontice pela nossa língua, ignorando-a ou marginalizando-a, farão o resto.
18.06.2021
Joaquim Miguel de Morgado Patrício