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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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NO ANO NOVO DE 2025, O QUÊ?

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Há regiões em que na noite de passagem de ano tudo o que é velho - roupas, pratos, mobília... - vai pela janela fora para a rua. E também é sabido que na noite de passagem de ano há licenças ao nível do álcool e até com a sexualidade que normalmente não são permitidas. É um pouco como se, retomando agora de modo secularizado os mitos cosmogónicos, se instalasse o caos primitivo, para, em seguida, como fizeram os deuses in illo tempore, ser reposta a ordem do cosmos.

Perante um ano novo que está aí à nossa frente, os sentimentos misturam-se: perplexidade, entusiasmo, dúvida, expectativa, temor, esperança... Que é que nos reserva o novo ano: para mim, para a minha família, para os meus amigos, para o país, para a Europa, para o mundo? Será melhor, será pior que o ano que passou? É preciso pensar, pois a perplexidade é gigantesca — pense-se nas guerras em curso e a ameaça nuclear, pense-se na situação periclitante da Europa no contexto da nova geoestratégia global, pense-se na crise climática mortal, pense-se, sem excluir as suas vantagens, nos perigos da inteligência artificial, do trans- e pós-humanismo...

Por vezes, somos tentados a pensar que é tudo igual, que tudo se repete: morre um ano, surge outro ano, na roda eterna do mesmo... Mas não é assim. Nunca houve na história de cada um de nós, na história do país, na história da Europa, na história da humanidade, na história do mundo, com cerca de quinze mil milhões de anos, um ano como esse que está a chegar. Ele aí vem, novo, pela primeira vez, como criança acabada de nascer. E exactamente como a criança vem aí com confiança. Todos nós, individual e colectivamente, enfrentamos, apesar de tudo, o novo ano essencialmente com confiança: se reflectirmos bem, esperamos, evidentemente com realismo, também com temor, mas essencialmente esperamos confiadamente. Porque o ser humano é um ser constitutivamente esperante, apesar da dureza toda com que a vida nos vai confrontando.

Porque é que os homens e as mulheres, apesar de todos os fracassos, horrores, sofrimentos e cinismos, ainda não desistiram de lutar e de esperar? Porque é que continuamos a ter filhos? Porque é que depois de guerras destruidoras e terramotos devoradores, recomeçamos sempre de novo? Perguntava, com razão, o célebre teólogo Johann Baptist Metz: "Porque é que recomeçamos sempre de novo, apesar de todas as lembranças que temos do fracasso e das seduções enganadoras das nossas esperanças? Porque é que sonhamos sempre de novo com uma felicidade futura da liberdade", embora saibamos que os mortos não participarão nela? Porque é que não renunciamos à luta pelo homem novo? Porque é que o ser humano se levanta sempre de novo, "numa rebelião impotente", contra o sofrimento que não pode ser sanado? "Porque é que o ser humano institui sempre de novo novas medidas de justiça universal, apesar de saber que a morte as desautoriza outra vez" e que já na geração seguinte de novo a maioria não participará nelas? Donde é que vem ao ser humano "o seu poder de resistência contra a apatia e o desespero? Porque é que ele se recusa a pactuar com o absurdo, presente na experiência de todo o sofrimento não reparado? Donde é que vem a força da revolta, da rebelião?"
Neste movimento incontível, ilimitado, do combate da esperança, pode ver-se um aceno do Infinito, um sinal de Deus.
E um propósito: em cada dia de 2025 dedicar alguns minutos de silêncio à meditação sobre o essencial.

 

Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

Escreve de acordo com a antiga ortografia
Artigo publicado no DN  | 30 de dezembro de 2024

A VIDA DOS LIVROS

De 23 a 29 de dezembro de 2024


O Papa Francisco propõe para o Novo Ano de 2025 o tema da Esperança como mobilizador dos cristãos e das pessoas de boa vontade num tempo muito exigente, pleno de incertezas e ameaças, a exigir o compromisso de todos para desfazer os sérios perigos que nos perseguem.
 


Papa Francisco © Paulo Novais/Lusa


“Exorto-vos a todos a viver este tempo forte de Natal com uma oração vigilante e uma esperança ardente”, sendo um “tempo de graça, irradiando a alegria que é fruto do encontro com Jesus” – acaba de proclamar o Papa Francisco. Mas acastelam-se nuvens negras no horizonte e o apelo é mais necessário que nunca.


Lembremo-nos que a singularidade e a solidariedade são faces da mesma moeda, obrigando-nos à recusa da indiferença e à noção positiva de compromisso. A nossa relação de uns com os outros, baseada no respeito mútuo, obriga-nos a uma ligação essencial entre pessoa e comunidade. A pessoa humana parte do que somos e do que nos distingue dos outros, segundo a própria etimologia, enquanto máscara do teatro grego. Já a comunidade é o que nos liga intrinsecamente, tornando-nos responsáveis uns pelos outros. E assim a autonomia individual demarca-se do egoísmo e do narcisismo, constituindo-se como valor ético, como eixo de abertura, de generosidade e de disponibilidade. Não nos reportamos, porém, a qualquer visão idílica de vida, destituída de diferenças e conflitos. Referimo-nos, sim, à necessidade de recusa da tentação do isolamento e da autossuficiência.


«O bem comum consiste no conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana» - afirmava João XXIII na encíclica «Mater et Magistra» (1961). Os poderes públicos devem orientar-se no sentido do respeito, da harmonização, da tutela e da promoção dos direitos invioláveis prescrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Se uma autoridade não reconhecer os direitos ou os violar «não só perde a razão de ser, como também as suas injunções perdem a força de obrigar em consciência», insistia João XXIII há cinquenta anos, num documento moderno que se tornou mais atual do que nunca. De facto, a noção de serviço público não se pode ater apenas ao Estado e ao mercado, mas à comunidade. O Estado social tem de representar a sociedade e os cidadãos, devendo o serviço público corresponder sempre a uma rede de iniciativas e de cidadãos criadores e participantes. Falamos do catálogo de direitos aceites e reconhecidos pelas Nações Unidas, que a encíclica «Pacem in Terris» refere: a existência de um padrão de vida digno; o respeito pelos valores morais e culturais; o prestar culto segundo o imperativo da reta consciência; a liberdade de escolha do estado de vida; a satisfação justa de necessidades económicas; para além dos direitos de reunião, de associação, de migração e de participação política – assim o Concílio Vaticano II consagrou a liberdade religiosa e de consciência. E este conjunto completa-se com o elenco dos deveres de cidadania (e não deveres de servos ou de súbditos): reciprocidade entre direitos e responsabilidades, colaboração mútua entre pessoas, convivência na verdade, na justiça, no amor e na liberdade, bem como salvaguarda de uma ordem moral, cujo fundamento para os cristãos é o próprio Deus. Deste modo, encontramos um fundamento universal e não uma mera lógica de hierarquia formal. Não se trata de referir um modelo de bem comum ou uma noção estereotipada de democracia – mas sim de considerar que a pessoa humana é a medida comum dos direitos e responsabilidades.


Não esquecemos que Hannah Arendt coloca entre as Origens do Totalitarismo a atomização radical do indivíduo e a eliminação da espontaneidade e da liberdade política. O colapso da distinção entre os domínios público e privado conduz à invasão ilegítima do puro utilitarismo. Afinal, o crescimento livre dos interesses privados torna-se incompatível com a necessidade de termos instituições políticas estáveis e com a existência de instâncias de mediação capazes de representar os interesses legítimos, de suscitar a participação cívica, de garantir representação cidadã e de regular os conflitos de forma racional e pacífica. Afinal, o totalitarismo, distinto do mero autoritarismo, torna a ação política impraticável, através da capacidade de falar e de ouvir, porque destrói pelo terror a possibilidade de ações espontâneas entre as pessoas. A solidão e o abandono são causas que subjazem a todos os movimentos totalitários, ainda segundo H. Arendt – lembrando a pensadora o conceito de Santo Agostinho de “Amor ao mundo”. A pessoa humana sente-se em casa, podendo preparar-se na espera do bem e do mal. E assim, em lugar do isolamento e do abandono, o cidadão torna-se um participante comprometido, capaz de agir em prol do comum. E a essência dos direitos torna-se um direito a ter direitos, fundamento da coesão social e da confiança.


Eis por que razão a noção de liderança não se confunde com a aquisição de poder e de proeminência, mas deve corresponder ao serviço, à atenção e ao cudado. Serviço, na medida em que se trata de dar resposta e de corresponder ao que nos é solicitado pelos outros e se espera de nós. Atenção, uma vez que resulta de termos de estar despertos perante o nosso próximo – tornando viva a pergunta bíblica: “onde está o teu irmão?” E devemos considerar o cuidado, entendendo que, mais do que uma solidariedade formal do que se trata é de garantir que precisamos uns dos outros. Daí a necessidade de superarmos a superficialidade e o imediatismo, uma vez que quanto mais cedermos a tais condicionantes mais provável será deixarmo-nos aprisionar pelo mal e pelo desrespeito da dignidade. Jacques Maritain numa das suas conferências do período do exílio americano durante a guerra afirmou: «Dizer que o homem é uma pessoa, quer dizer que, no fundo do ser, ser é mais um todo que uma parte, e mais independente que servo».


Guilherme d'Oliveira Martins
Oiça aqui as minhas sugestões – Ensaio Geral, Rádio Renascença

DE 2023 PARA 2024: TENSÕES E ESPERANÇA

  


Havia regiões nas quais na noite de passagem de ano tudo o que é velho - roupas, pratos, mobília - ia pela janela fora para a rua. E também é sabido que nessa noite há licenças ao nível do álcool e outras que normalmente não são admitidas. É um pouco como se, retomando, agora de modo secularizado, os mitos cosmogónicos, se instalasse o caos primitivo, para em seguida, como fizeram os deuses in illo tempore, ser reposta a ordem do cosmos.


Perante um ano novo que está aí à nossa frente, os sentimentos misturam-se: perplexidades, entusiasmo, dúvidas, expectativas, temores, esperança... Que é que nos reserva o novo ano: para mim, para a minha família, para os meus amigos, para o país, para a Europa, para o mundo? Será melhor, será pior que o ano que passou? Querendo ir mais fundo, até somos tentados a pensar que é igual, que tudo se repete: morre um ano, surge outro ano, na roda eterna do mesmo... Mas não é assim. Nunca houve na história de cada um de nós, na história do país, na história da Europa, na história da humanidade, na história do mundo, com uns 14 mil milhões de anos, um ano como este, o de 2024, que acaba de surgir. Ele está aí, novo, pela primeira vez, como criança acabada de nascer. E exactamente como a criança está aí com confiança.


No entanto, as tensões e perplexidades avolumam-se. Talvez nunca a humanidade tenha estado perante ameaças tão avassaladoras. Quando olhamos para o passado, não somos piores. O que se passa é que nunca a humanidade teve tanto poder de autodestruição: pense-se no armamento atómico, nas alterações climáticas, nas novas tecnologias, concretamente na inteligência artificial, certamente com imensas possibilidades vantajosas, mas levantando também perguntas gigantescas…


Por estes dias, reflectindo sobre o ano que passou, fizemos um balanço da nossa vida e pensámos naqueles que, familiares e amigos, se nos foram, “partiram”, já cá não estão, e temos saudades, fazem-nos falta. Nesse balanço da nossa vida e da vida da sociedade não se ergueu a necessidade de pensar mais? Não constatamos, de facto, que se instalou a banalidade rasante, esquecendo o essencial? Afinal, de que vale dominar o mundo inteiro, se nos autodestruímos?


Agora, é preciso reflectir no que aí vem. Afinal, que queremos fazer de bom para nós, para a família, para a humanidade? Olhando para o país, vai haver eleições, e como avançaremos quando pensamos na situação da saúde, da educação, da justiça, da corrupção, nas manchas intoleráveis de pobreza, e quando, depois de milhões e mais milhões e mais milhões... de euros da União Europeia, continuamos na cauda da Europa? E vai haver eleições na Europa, e o que vai acontecer, pensando concretamente nas eleições dos Estados Unidos da América? E as eleições em Taiwan, com todas as consequências? No contexto de um mundo cada vez mais multipolar, com ambições várias  de domínio imperial global, com mais de dois terços da humanidade a sofrer da desigualdade crescente e da pobreza, que vai acontecer neste nosso mundo insano, com guerras brutais em curso e a ameaça da catástrofe?


Somos cada vez mais interdependentes e, por isso, como repete o Papa Francisco, ou nos salvamos todos ou nos perdemos todos. Assim, os países celebram o Dia da Independência Nacional; pergunta-se, na linha da sugestão do filósofo Peter Sloterdijk: não é urgente um pacto global, assinado por todos, sobre a Dependência Global, com um dia no ano para se celebrar, sempre com mais consciência, precisamente o Dia da Dependência Global?


De qualquer modo, avançamos na esperança, porque o ser humano é um ser constitutivamente esperante, apesar da dureza e brutalidade toda com que a vida nos foi confrontando. Como escreveu Nelson Mandela, “a esperança é uma arma ponderosa e nenhum poder no mundo pode privar-me dela.” Sim. Porque é que os homens e as mulheres, apesar de todos os fracassos, horrores, sofrimentos e cinismos, ainda não desistiram de lutar e de esperar? Por que é que continuamos a ter filhos? Por que é que depois de guerras destruidoras e terramotos devoradores, recomeçamos sempre de novo? Perguntava, com razão, o célebre teólogo Johann Baptist Metz: "Porque é que recomeçamos sempre de novo, apesar de todas as lembranças que temos do fracasso e das seduções enganadoras das nossas esperanças? Por que é que sonhamos sempre de novo com uma felicidade futura da liberdade", embora saibamos que os mortos não participarão nela? Porque é que não renunciamos à luta pelo homem novo? Porque é que o homem se levanta sempre de novo, "numa rebelião impotente", contra o sofrimento que não pode ser sanado? "Porque é que o homem institui sempre de novo novas medidas de justiça universal, apesar de saber que a morte as desautoriza outra vez" e que já na geração seguinte de novo a maioria não participará nelas? Donde é que vem ao homem "o seu poder de resistência contra a apatia e o desespero? Por que é que o homem se recusa a pactuar com o absurdo, presente na experiência de todo o sofrimento não reparado? Donde é que vem a força da revolta, da rebelião?"


Neste movimento incontível, ilimitado, do combate da esperança, pode ver-se um aceno do Infinito, um sinal de Deus. Como se não cansava de repetir o ateu religioso Ernst Bloch: "Onde há esperança, há religião". Aliás, quem se lembra de que 2024 é-o por referência à data do nascimento de Jesus?


Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

Escreve de acordo com a antiga ortografia
Artigo publicado no DN  | 6 de janeiro de 2024

ANO VELHO. ANO NOVO


Os historiadores e fenomenólogos da religião fazem notar que, mesmo nas sociedades secularizadas, encontramos ainda algo dos mitos cosmogónicos, nomeadamente nos festejos da passagem de ano: folguedos e licenças, uma certa tonalidade orgiástica, alguma "confusão" social, na noite de passagem de ano, simbolizam o regresso ao estado indiferenciado e caótico de antes da formação do mundo pelos deuses. Volta-se, portanto, de algum modo, ao caos das origens, para que o mundo se regenere e se reponha o cosmos, um mundo outra vez novo, ordenado, belo: a caos contrapõe-se precisamente cosmos, que quer dizer belo (é do grego kosmós que vem cosmética)...


Aparentemente, é a repetição. Mas, de facto, é mesmo no novo que nos encontramos, dia 1 de Janeiro de 2023, (Janeiro, de Jano, o deus com dupla face: uma voltada para trás e outra para a frente). Embora enraizados no passado e sem esquecê-lo, de facto nunca houve nem nunca haverá um ano como este em que acabámos de entrar. É novo e único na história da humanidade e do mundo.


Depois dos alegres e ledos festejos, também haverá alguns pensamentos de meditação.


É tão certo tratar-se de um ano novo que para nós constitui uma incógnita. O que acontecerá?, como será? Até certo ponto, o ano que começa é programável, mas nunca de modo adequado, pois há o completamente imprevisível: não somos senhores absolutos do tempo, do futuro. Há o que podemos e devemos programar, dito na palavra futuro e há o que chega sem nós, que não podemos programar, dito na língua alemã na distinção entre Futur e Zukunft. Mas é preciso estar preparado, preparar-se, para o que chega sem nós, o inesperado. Por isso, um dos conselhos mais veementes no início do novo ano é cada um, cada uma, prometer a si próprio, a si própria, que dedicará diariamente alguns instantes ao silêncio, para estar consigo, meditando, reflectindo, sobre a sua vida, a orientação a dar-lhe... Quantos desastres pessoais, familiares, políticos, se evitariam, se houvesse este propósito, prometido e cumprido, ao longo dos dias de um novo ano... Desastres e tragédias.


Nestes dias festivos, lembramos mais os amigos, os familiares, aqueles e aquelas que levamos no coração. Ao menos por esta altura, há uma saudação, uma palavra, um encontro. Mas talvez nenhum de nós, nesta lembrança, tenha deixado de deparar-se com um buraco negro: um amigo, um familiar, uma amiga, que ainda no ano passado cá estavam e já cá não estão. E é uma falta e uma tristeza e um queixume e uma pergunta e talvez uma oração (afinal, rezar é perguntar...). A falta que nos fazem! Ficámos com saudades. A palavra saudade é uma palavra tipicamente portuguesa, que não encontra tradução adequada noutras línguas, e até a sua etimologia é discutida, mas, se vier de salutem dare (saudar), significa que, esteja onde estiver o nosso amigo, a nossa amiga, manifestamos o desejo de que passem bem, se vier de solitate (solidão), então exprime o nosso sentimento de solidão, porque não estão presentes e fazem falta. E uma advertência: por vezes, fica um remorso, porque não fizemos a tempo o que devíamos ter feito com eles e por eles; então um aviso: é preciso fazer a tempo e com tempo o que há para fazer; depois, é tarde, o nunca mais...


O dia primeiro do ano é também o Dia Mundial da Paz, iniciativa que se deve ao Papa Paulo VI. A paz, esse bem inestimável! A paz que não é apenas ausência da guerra, mas tranquilidade na ordem, que resulta da verdade, da justiça, do perdão, da fraternidade, da reconciliação. Reconciliação que tem de contar com cada um: precisamos todos e cada um de estar em paz connosco.


Considerando a loucura de num século já irmos na Terceira Guerra Mundial - a primeira: 1914-1918; a segunda: 1939-1945; a terceira está em curso, com toda a sua crueldade, horrores sem fim..., à vista de todos -, Francisco não se cansa de fazer apelo ao diálogo, ao desarmamento, à paz. No passado dia 8 de Dezembro, na tradicional oração da celebração da Imaculada Conceição, em frente da Coluna de Nossa Senhora, na Piazza di Spagna, em Roma, comoveu-se, e ficou com a voz embargada e algumas lágrimas correram, ao lembrar a martirizada Ucrânia.


Rezou: "Nossa Mãe Imaculada, trago-te o amor filial de homens e mulheres sem conta; trago-te os sorrisos das crianças, que aprendem o teu nome diante da tua imagem, nos braços das mães e avós; trago-te a gratidão dos idosos; trago-te as preocupações das famílias; trago-te os sonhos e as ansiedades dos jovens, abertos ao futuro mas refreados por uma cultura rica em coisas e pobre em valores, saturada de informação e deficiente na educação. Recomendo-te de modo especial os mais pequenos, que foram mais afectados pela pandemia, para que pouco a pouco recuperem para abrir as asas e voar, recuperem o gosto de voar alto. Virgem Imaculada, quereria tanto hoje trazer-te o agradecimento do povo ucraniano pela paz que há muito pedimos ao Senhor; pelo contrário, ainda tenho de apresentar-te a súplica das crianças, dos anciãos, dos pais e das mães, dos jovens dessa terra martirizada. Mas na realidade todos nós sabemos que estás com eles e com todos os que sofrem, como estiveste ao lado da cruz do teu Filho. Obrigados, Mãe nossa. Olhando para ti, podemos continuar a acreditar e a esperar que o amor ganhará ao ódio, a verdade ganhará à mentira, o perdão ganhará à ofensa, a paz ganhará à guerra. Assim seja!" Bom ano de 2023!

 

Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

Escreve de acordo com a antiga ortografia
Artigo publicado no DN  | 1 de janeiro de 2023

CRÓNICA DA CULTURA

2022

 

As coisas da condição humana continuam a ser coisas simples, verdades antigas como a necessidade de entender o mundo, a procura da origem, a raiz dos fenómenos e dos sentires.


Poder falar destas realidades, é domínio de quem com extrema sabedoria, consegue a simplicidade de as dizer.


Descuidam – ou não?-  as gentes, no atribuir-se si mesmas utilidades com tamanha facilidade e jeito tão atreito ao seu milímetro, que explicam com aptidão o sucesso dos maus canais televisivos, bem como os seus viveres reveladores de que sem o tal vil metal, se descarnavam espalmadas as consequências das suas próprias descobertas.


Afinal, quando será que num novo ano, nos congratularemos com a coragem da pergunta sincera que as gentes farão ao seu pensamento, não recuando nas consequências do ato?


Afinal referimo-nos a uma prática de honestidade intelectual que descobre o átomo da mente não serventuário, nem dócil ao embuste em que se vive.


Afinal a condição humana continua a não ser apenas o discurso de lugares-comuns que tudo mostram para que pouco se veja.


Afinal o que está em jogo é a felicidade do homem numa historicidade que os tem dominado belicosamente numa relação de poder e não de sentido como afirmava Michel Foucault.


Cremos que a orientação no mundo, é uma necessidade humana que deve ser bem mais desenvolvida do que aquela que se investe nos ginásios para orientação física.


Vive-se um tempo de universo concentracionário e exposto sem pudor. Nem parece o quanto dele é ainda tabu, viagem, liberdade, coisas de substância da condição humana.


Sugere Drummond

(…)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


(extrato do poema “Receita de Ano Novo”)

 

Teresa Bracinha Vieira

ANO NOVO: 2022


Os fenomenólogos da religião fazem notar que, mesmo nas sociedades secularizadas, encontramos ainda algo dos mitos cosmogónicos, nomeadamente nos festejos da passagem de ano: folguedos e licenças, uma certa tonalidade orgiástica, alguma "confusão" social na noite de passagem de ano simbolizam o regresso ao estado indiferenciado e caótico de antes da formação do mundo pelos deuses. Volta-se, portanto, de algum modo ao caos das origens, para que o mundo se regenere e se reponha o cosmos: um mundo outra vez novo, ordenado, belo.


Aparentemente, é a repetição. Mas, de facto, é mesmo no novo que nos encontramos: 2022. Nunca houve nem nunca haverá um ano como este em que acabamos de entrar. É novo e único na História da Humanidade e do mundo.


Depois dos eufóricos festejos — este ano, por causa  da pandemia, quase nada —, também haverá alguns pensamentos de meditação.


É tão certo tratar-se de um ano novo que para nós constitui uma incógnita. O que acontecerá?, como será? Até certo ponto, o ano que começa  é programável, mas nunca de modo adequado, pois há o completamente imprevisível: não somos senhores absolutos do tempo, do futuro. Significativamente, em algumas línguas, existem duas palavras para dizer o futuro; no alemão , por exemplo: Futur e Zukunft. Nós, embora não tão acentuadamente, também temos futuro e advento. Para dizermos o futuro até certo ponto programável, pois é continuidade do presente, e futuro enquanto não programável, pois é o que chega, o que vem, não programável. Significativamente, o último livro da Bíblia, o Apocalipse, diz o que é Deus nesta referência ao tempo: “Deus  é Aquele que era, que é e que há-de vir”, quando esperávamos que dissesse: “e que será”. Sendo Deus Aquele que vem, a História está aberta à esperança que não engana.


Nestes dias festivos, lembramos mais os amigos, os familiares, aqueles e aquelas que levamos no coração. Ao menos por esta altura, há uma saudação, uma palavra, um encontro. Mas talvez nenhum de nós, nesta lembrança, tenha deixado de deparar-se com um buraco negro: um amigo, um familiar, uma amiga, que ainda o ano passado cá estavam e já cá não estão. E é uma falta e uma tristeza e um queixume e uma pergunta e talvez uma oração (afinal, rezar também é perguntar...).


Depois, há a História e votos para o novo ano. Foi no dia 1 de Janeiro de 2002 — há vinte anos — que o euro, a nova moeda dos europeus, começou a circular de modo palpável. Desde então, é possível circular de Lisboa a Atenas, a Helsínquia ou a Berlim sempre com a mesma moeda. Quantos acreditariam ainda há poucos anos que isto havia de ser possível? Afinal, há sonhos e utopias que se tornam realidades. No ano anterior, a 15 de Dezembro, houve a Declaração Comum dos Chefes de Estado e de Governo da União Europeia, aprovada na Cimeira de Laeken: "Num mundo globalizado, mas simultaneamente muito fragmentado, a Europa deve assumir as suas responsabilidades na gestão da globalização. O papel que deve desempenhar é o de uma potência que luta decididamente contra todas as formas de violência, terror ou fanatismo, mas que também não fecha os olhos às injustiças gritantes que existem no mundo". Mas hoje sente-se algum mal-estar e até se fala em ameaças de guerra…


O dia primeiro do ano é também o Dia da Paz. A guerra só traz destruição. Foi a 8 de Dezembro de 1967 que o Papa Paulo VI propôs a criação do Dia Mundial da Paz, que se celebraria no dia 1 de Janeiro de cada ano. Como é hábito, este ano o Papa Francisco também escreveu uma mensagem para este dia. Fica aí um apontamento.


Começa com uma constatação: “O caminho da paz permanence, infelizmente, arredio da vida real de tantos homens e mulheres e consequentemente da família humana, que nos aparece agora totalmente interligada. Apesar dos múltiplos esforços visando um diálogo construtivo entre as nações, aumenta o ruído ensurdecedor de guerras e conflitos, ao mesmo tempo que ganham espaço doenças de proporções pandémicas, pioram os efeitos das alterações pandémicas e da degradação ambiental, agrava-se o drama da fome e da sede e continua a predominar um modelo económico mais baseado no individulaismo do que na partilha solidária. Como nos tempos dos antigos profetas, continua também hoje a elevar-se o clamor dos pobres e da terra para implorar justiça e paz.”


Para a construção de uma paz duradoura, propõe três caminhos. 1. O primeiro é o diálogo entre as gerações como ponte entre o passado e o futuro: ele é a base, forma eminente de amor para a realização de projectos compartilhados e sustentáveis. 2. A instrução e a educação são “os alicerces de uma sociedade coesa, civil, capaz de gerar esperança, riqueza e progresso”. Impõe-se um novo paradigma cultural, através de “um pacto educativo global para e com as gerações jovens, que empenhe as família, as comunidades, as escolas e universidades, as instituiçoes, as religiões, os governantes, a Humanidade inteira na formação de pessoas maduras.” 3. O trabalho é indispensával para “construir e preserver a paz”: ele constitui “expressão da pessoa e dos seus dotes, mas também compromisso, esforço, colaboração com outros, porque se trabalha sempre com ou para alguém.” O trabalho “é uma necessidade, faz parte do sentido da vida nesta terra, é caminho de maturação, desenvolvimento humano e realização pessoal”. Neste domínio, “é chamada a desempenhar um papel activo a política, promovendo um justo equilíbrio entre a liberdade económica e a justiça social.” Bom ano 2022!  

 

Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

Escreve de acordo com a antiga ortografia
Artigo publicado no DN  | 1 de janeiro de 2022

CARTAS À PRINCESA DE AGORA E SEMPRE

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   Minha Princesa de sempre :

   Não recordo, não registei, nem sequer medi o tempo decorrido desde a última carta que te escrevi. Talvez por me sentir mais desvinculado da duração de tudo, finalmente mais preso à memória das coisas e das vidas como essencial substância da minha consciência do presente... como se este mais não fosse do que passado imperfeito! Sou hoje o que fui mais o que não cheguei a ser. Quero assim dizer que prevaleço nesse sentimento de mim em que, mais do que eu e a minha circunstância, me surpreendo como eu e a minha imperfeição. Já me não conjugo no futuro, não consigo completar-me. Tampouco me habita qualquer sentimento de perda, muito menos desejo ou vontade de ser agora o que não fui no devido tempo. Nem sequer rumino vadios pensamentos de culpa minha ou alheia. Não vou gritar, como a Traviata, "É tarde!" Tudo na nossa vida tem o seu tempo oportuno.

   Não é por deitarmos abaixo antigos ídolos ou antiquados símbolos que nos convertemos. Aquilo que for o ser novo e limpo, ou estará já dentro de nós, ou será mais um episódio da nossa imperfeição. Nesta nossa vida presente, queiramos ou não, há um tempo e um espaço que necessariamente nos condicionam quando agimos. O nosso estado de liberdade pertencerá sempre, por enquanto, a essa mística interior, alheia a qualquer espaço ou tempo que possa limitar-nos, algo tão misterioso que apenas podemos imaginar como o antiquíssimo futuro de nós... 

   Sempre te disse e escrevi, minha Princesa agora perdida entre estrelas de um universo em contínua expansão  -  que talvez seja a extensão do Deus desconhecido que procuramos  - , quanto me deixa perplexo, mesmo para além de qualquer angústia, pensarsentir a contradição desta nossa condição humana, hesitação constante (interminável?) entre o finito e o infinito, talvez interrogação sem resposta certa na finitude da nossa temporalidade, mas fé e esperança que o amor dos outros (e de nós) desenha na intemporalidade do infinito que, afinal, dia após dia, incansavelmente vamos desejando e desenhando. 

   Talvez cheguemos a esta idade do fim do nosso tempo apenas para confrontarmos a nossa pequenez com a infinita grandeza de Deus. Momento difícil este, em que finalmente realizamos que Deus não tem tamanho nem tempo, e que o "mundo" que nos espera estará certamente fora de nós e do nosso muito imaginar. 

   No início calendarizado de mais um Ano Novo, e quando completo o octogésimo da minha vida presente, contemplo o meu rio envolto em nevoeiro e procuro a ponte que me levará para fora do tempo e do espaço...

 

Camilo Martins de Oliveira

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

Fernando Pessoa

 

91. FICÇÕES DO TEMPO

 

Santo Agostinho, em Confissões, reconhece três tempos: “Um presente das coisas passadas, um presente das coisas presentes, e um presente das coisas futuras. O presente das coisas passadas é a memória; o presente das coisas presentes é a vida, e o presente das coisas futuras é a espera”.

A realidade existe apenas no presente, que é o tempo permanente em movimento.

 

Como também opina Fernando Pessoa, em Ano Novo:

“Ficção de que começa alguma coisa!
Nada começa: tudo continua.
Na fluida e incerta essência misteriosa
Da vida, flui em sombra a água nua.

Curvas do rio escondem só o movimento.
O mesmo rio flui onde se vê.
Começar só começa em pensamento”

 

Ou se deduz do fado Vida Vivida, cantado por Argentina Santos:

“Meu Deus, como o tempo passa
Dizemos de quando em quando
Afinal o tempo fica
A gente é que vai passando”

 

Daí que passado e futuro sejam referências a um tempo inacessível que já foi ou que potencialmente virá a ser, mas que não é, sendo o presente real, mas efémero e fugidio, pois o tempo é criado por nós, em pensamento e na nossa mente, como o ano velho e o novo que se augura que venha.

 

31.12.21
Joaquim Miguel de Morgado Patrício

 

CRÓNICA DA CULTURA

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CELEBRAÇÃO

 

Minha filha vamos, vamos, a levantar, aproxima-se o dia, o teu dia, e afinal o de todos nós! A cidade e o povo reivindicam-te. A um sinal de assentimento teu, todos vamos a demanda do novo ano. Vai, vai no cortejo das tuas núpcias, canta as glórias das essências. As ruas irão encher-se de coroas e tochas e vinhos e perfumes. É um dia de vitória muito teu. Neste primeiro dia do ano, de pronto, vai soltar-se o teu coração, sem qualquer medo do que lhe está destinado. São assim as núpcias, estabelecem elas alianças com futuros frente a frente para que se vejam, e ainda assim tão longe, ou já amanhã, quem sabe?

Minha filha, concede!, antes que te faltem as forças e que deixe de ser evidente que quem te pretende, te ama, disposto a arruinar-se por ti, sabendo que a ruína é o tanto imenso amor que te tem e terá, e que o ano a viver é o início de uma ideia.

Prodígio! Cantamos todos! Prodígio extraordinário! Vem 2021! Vem ó ano dos futuros que o enlace original é da minha filha! Grande é a sua formusura, superior mesmo à dos segredos dos escultores e pintores e poetas e arquitetos e músicos. Centras tu, filha minha, meu amor, a força feminina da história catalisadora dos movimentos e das ações. O teu herói será a separação e o reencontro, e tu o enfrentarás como aos perigos dos caprichos da Sorte.

Minha filha luta, assume o desafio a exigir núpcias. E eis que te vais surpreender em cálculos e desfechos e em perceções contraditórias, mas o sonho e o que nele viste, vai existir também na realidade.

Filha vamos a levantar, aproxima-se o dia, o teu dia, e afinal o de todos nós! Nada temas! Se prisioneira, se prisioneiros, as crianças serão destino, sempre!

Teresa Bracinha Vieira

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

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69. A DUPLA FACE DE JANO

Segundo a lenda, Saturno teria dado a Jano o dom da dupla ciência, a do passado e a do futuro, representando-o os romanos com duas faces voltadas em sentido contrário.

Jano tornou-se o deus do início de todas as coisas, entre elas o início do ano, o 1.º de janeiro, “a porta que abre o ano”.

Responsável pela abertura das portas ao ano que se iniciava, era o guardião das portas, tendo presente que toda a porta olha para dois lados, com duas faces, uma contendo o ano velho que findou e outra o ano novo com os seus mistérios e segredos futuros.

Jano mostra-nos que tudo tem duas faces, que tudo tem em si princípio e fim, daí ser representado por duas faces contrapostas e opostas: uma envelhecida (passado) e outra jovem (futuro).

Há sempre o ano velho e o novo, no sentido de que tudo tem, pelo menos, duas faces, nada sendo imutável e permanente.

Mas nem tudo é a preto e branco, bom e mau, numa dualidade constante, com referência a uma pretensa analogia com as duas faces do ser humano.

Jano também simbolizava o deus das metamorfoses, das transformações, da mudança, da sabedoria, podendo ser representado com uma face masculina e feminina, ou outras dualidades, como guerra e paz, sol e lua.

Para Ovídio a face dupla de Jano exercia o seu poder sobre a terra e sobre os céus.

E de deus que presidia aos começos, do início de todas as coisas, como o início do ano (januarius significa janeiro), tornou-se no deus das quatro estações possuindo, então, quatro cabeças, em vez de duas.

Para os romanos, o primeiro mês do ano era dedicado a Jano, celebrando-se as januárias, no início de janeiro, em sua honra, por analogia com as atuais celebrações de ano novo, num renascer permanente ano a ano, querendo descartar o passado (ano velho) e viver o futuro (ano novo), numa afirmação e formulação anual de rituais, balanços, expetativas e desejos que no essencial se repetem e que marcam a natureza transitória da nossa passagem no mundo que conhecemos.

No final e início do ano há sempre promessas e juras de metamorfoses em que acreditamos ou teatralizamos acreditar.

Há o passado (ano velho) e o futuro (ano novo) que, para Santo Agostinho, são figuras de linguagem de um tempo que já foi ou que virá a ser, mas que não é, em que a realidade existe apenas no presente, que é o tempo em movimento.

Um melhor e mais auspicioso 2021.

 

01.01.2021
Joaquim Miguel de Morgado Patrício