Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
António Sérgio incluiu no segundo volume dos Ensaios (1929) a conferência proferida em 1925 em Lisboa com o título desta crónica e que tem constituído tema para muitos debates e reflexões no último século. Afinal, tratava-se de discutir as razões do nosso atraso. É um tema recorrente, que não pode, porém, ser alvo de simplificações. As nossas dificuldades ancestrais não podem resumir-se a uma causa, a um tempo ou a alguns protagonistas. Portugal sempre foi uma sociedade complexa e por isso coexistiram ao longo dos tempos razões várias, positivas e negativas, a determinar a nossa evolução. Na célebre conferência referida apontava-se a contraposição tornada célebre entre Fixação e Transporte, obrigando a uma leitura atenta capaz de associar uma cópia de razões que se completam e que até, por vezes se contradizem. Nas duas escolas encontramos “a política da Produção e a Política da Circulação; a política da Agricultura e a política do Comércio; a política nuclear e a política periférica; a política de D. Pedro e a política de D. Henrique; a política da boa capa e a política do mau capelo”. Contudo, o ensaísta não se ateve a ideias exclusivistas, porque a faina da periferia, “a corrente vital do exterior para o interior, ou centrípeta”, seria mórbida e extenuante se não fosse “forte e regular a vitalidade do seu núcleo, e saudável a corrente que vai de dentro para o exterior, ou centrífuga, na lida económica de Portugal”. No fundo, dizia Sérgio, “se não descobrisse o Oriente, falharia a nação o seu papel”. Mas cumpre reconhecer que realizámos obra muitas vezes em condições depauperantes – e assim se compreende a voz crítica de Camões, “com o maior prestígio nas falas do Velho do Restelo – timbre da honra, do saber, da experiência, da autoridade”. E quando lemos os economistas do séc. XVII como Luís Mendes de Vasconcelos, Severim de Faria e Duarte Ribeiro de Macedo compreendemos a importância da proteção e do fomento da riqueza nacional na agricultura e na indústria e num plano de hidráulica… Uma base europeia sólida defendida pelo Príncipe Perfeito, na linha de seu avô materno, o Infante D. Pedro, merecia a melhor atenção, para que o Transporte não destruísse a Fixação. A leitura de textos antigos obriga, porém, a muito cuidado para evitar as análises apressadas assentes nas referências impressionistas desta ou daquela medida nos últimos séculos.
Eis porque as explicações sobre o atraso português exigem séria ponderação.
A complexidade tem sempre de ser considerada (com atenção especial à educação e ao conhecimento), como tem ensinado Jaime Reis. “O atraso económico, a falta de desenvolvimento social, o baixo nível de urbanização, mesmo a formação religiosa dominante poderão eventualmente constituir razões para a lenta alfabetização de todo o conjunto de países do Sul da Europa. Não servem contudo, como elementos diferenciadores do caso português relativamente aos demais membros deste conjunto, demasiado parecidos com Portugal nestes aspetos para se encontrar neles uma interpretação convincente para o nosso comportamento diverso em termos educacionais” (O Atraso Económico Português 1850-1930, INCM). De facto, a complexidade leva-nos a ter de compreender que qualquer decisão de política pública, em especial com relevo para a educação, a cultura ou a ciência, que tudo condicionam, tem sempre um cariz fortemente económico, sendo consensual e durável. É preciso assim mobilizar os meios humanos e materiais adequados. A consideração das políticas nacionais exige, portanto, a compreensão de que o atraso não pode ser uma fatalidade, e de que são indispensáveis a concertação, o planeamento, a accountability e a rigorosa avaliação de resultados (com critérios comummente aceites). Nos diversos campos referidos estão as razões do atraso, mas também a indicação do começo dos remédios para delas nos libertarmos.
Educar é o melhor modo de antecipar o futuro. E se falamos de futuro é porque a aprendizagem é a compreensão da importância presente da experiência. O futuro é a compreensão do presente. António Sérgio (1883-1969) seguiu o exemplo de Francis Bacon e de Montaigne privilegiando o método dos Ensaios. E que são os ensaios senão a demonstração do saber todo de experiências feito. Ao longo da vida preocupou-se com o testemunho pedagógico para as gerações futuras, usando essencialmente o método crítico. Hoje, mais do que nunca, é necessário lermos e ouvirmos os seus ensaios, onde nos propõe, em lugar de receitas ou de caminhos pré-fabricados, vias múltiplas centradas na liberdade e na responsabilidade, articulando a importância da singularidade individual (ou não fosse ele sempre um idealista racional) com a solidariedade voluntária (baseada na ação do cooperativismo). Note-se que, no fugaz tempo em que foi Ministro da Instrução Pública, deixou duas marcas muito evidentes, que merecem lembrança: a criação da Junta de Orientação dos Estudos (Decreto nº 9332, de 29 de dezembro de 1923) e do Instituto do Cancro. A Junta foi criada no sentido da abertura dos nossos investigadores e estudantes ao contacto internacional, através de bolsas de estudo e de formações avançadas (que teria continuidade na Junta de Educação Nacional, no Instituto de Alta Cultura, chegando ao Instituto Camões). Devemos lembrar que José de Azeredo Perdigão, um sergiano confesso, desenvolveu, na linha do mestre o apoio ao conhecimento na Fundação Calouste Gulbenkian, com belos frutos na abertura de horizontes centrados no valor e na liberdade. O Instituto Português para o Estudo do Cancro (Decreto nº 9333, de 29 de dezembro de 1923), hoje Instituto Português de Oncologia, que o Professor Francisco Gentil animou, dando projeção internacional e grande prestígio, é um exemplo premonitório da necessidade de ligação estreita entre a ciência e a saúde. Poucos governantes têm a seu favor uma tão importante marca simbólica de valor perene.
António Sérgio foi um polemista aguerrido, por isso podemos afirmar que, na senda de figuras que tanto admirou, como Alexandre Herculano e Antero de Quental, preocupou-se em modernizar Portugal, seguindo a lição da Regeneração e da Geração de 1870, na perspetiva de superar a mediocridade, sem iludir defeitos e limitações. O empenhamento na causa da Instrução Pública é significativo e facilmente o verificamos na leitura da sua vasta bibliografia. Foi importante a passagem por Genebra com sua mulher D. Luísa Sérgio e compreendemos como António Sérgio pensou a modernização do País através do estudo e do conhecimento. Leia-se a série de ensaios publicados na revista “A Águia”, da Renascença Portuguesa, sobre a “Educação Cívica”, que continua a ter atualidade pela defesa de uma cidadania ativa e pela ideia de República Escolar, na linha do pensamento de John Dewey, um dos mais fecundos pedagogistas do seu tempo. E a verdade é que aí encontramos uma preocupação fundamental em que o rigor e a exigência se aliam à motivação e à tomada de consciência fecunda de cidadãos livres e iguais, autónomos e responsáveis, empenhados e solidários. Para Sérgio a escola era lugar natural de cidadania, e as mais recentes investigações das neurociências confirmam a importância de considerar desde a infância a aprendizagem da cidadania e do compromisso solidário. A sociedade não está fora da escola, faz parte intrínseca da vida escolar e da comunidade educativa. Do mesmo modo, o cooperativismo constitui um desafio prático, que ainda hoje continua por cumprir, sendo um elemento que a história recente tornou mais atual. A ação cooperativista de António Sérgio constitui uma indelével marca política que, apesar das resistências, continua a ser relevante. De facto, nem o Estado nem o mercado só por si podem responder às exigências da sociedade e da economia. Assim, para que não haja um Estado produtor, centralizado e burocrático ou um mercado vulnerável e incapaz de garantir eficiência e equidade ou de assegurar uma concorrência sã e equilibrada, impõe-se a criação de uma economia cooperativa, capaz de realizar um Estado catalisador e ordenador e um mercado justo...
A obra do escritor é rica em reflexão, mas pode dizer-se que o espírito de reformador está enraizado na sua atitude intelectual. Trata-se de procurar linhas de orientação e de ação capazes de garantir a superação do nosso atraso. Daí a dualidade transporte / fixação, na qual há uma procura determinada no sentido do melhor aproveitamento dos recursos próprios – a começar nas pessoas e a continuar nos recursos disponíveis – no território, na inserção internacional e na cooperação científica e técnica. Quando António Sérgio publicou a sua Antologia dos Economistas Portugueses (1924) ou quando proferiu a conferência sobre “as duas políticas nacionais” (1925), dada à estampa no segundo volume dos Ensaios, lembrou que três autores seiscentistas, Luís Mendes de Vasconcelos, Severim de Faria e Duarte Ribeiro de Macedo, iniciaram a doutrina da política da Fixação, contra a política do Transporte; e o reformismo português, desde aí até agora, será o desenvolvimento dos princípios que defenderam nas suas obras. Em Vasconcelos é a Fixação, pela agricultura; em Severim, pela agricultura e pelas indústrias; em Macedo, finalmente, são as minúcias de um programa de fomento industrial”. Logo no final do século XVII, porém, o dinheiro das minas do Brasil, mais tarde os empréstimos do fontismo e as remessas dos emigrantes adiaram a realização das ideias dos reformadores. Mas o seu espírito continua, ressalvadas as distâncias e qualquer anacronismo, vivo e pertinente, em nome de um reformismo que foi assumido por Herculano, pela geração de 1870, pela “Seara Nova” e pelo moderno pensamento democrático. Como afirmou: “parece-me que os males de que nos queixamos são fatalíssima consequência da estrutura da sociedade, - e que só portanto terão remédio se nos metermos firmemente a transformar essa estrutura, o que não é possível com pregações, nem com políticas de autoritarismo, nem com reformas só pedagógicas, - mas com reformas sociais e pedagógicas entrelaçadas como fios de um tecido único, as quais preparem o nosso povo para um uso razoável da liberdade e para empreender por si mesmo a sua emancipação social-económica”. Neste folhetim que prossegue, a modernidade faz-se de consciência crítica. O tempo é revelador de uma cultura de várias realidades…
O debate de ideias não pode ser desvalorizado. O intelectual não pode ser substituído pelos comentadores das ideias gerais. A democracia só progride através da ligação entre a capacidade de ver o futuro e de encontrar catalisadores de energias no sentido de responder à necessidade de tornar a sociedade melhor. Não há ação coerente e eficaz sem pensamento, e não há reflexão séria sem capacidade de ouvir. Não há projetos relevantes se não os basearmos na experiência e nos bons exemplos. Infelizmente, prevalece a tentação de limitar o debate político ao imediatismo e aos efeitos teatrais. Se olharmos atentamente a história política percebemos que só pode haver resultados práticos positivos se houver planeamento de médio e longo prazos e capacidade de mobilizar duradouramente as vontades da sociedade. As reformas estruturais não se confundem com o método do café instantâneo, é fundamental tempo e é ilusório julgar que se muda a sociedade contando apenas com opiniões superficiais ou modas passageiras. Eis por que razão urge refletir, dialogar, debater e encontrar soluções duráveis que possam antecipar, prevenir e mobilizar.
Conversando com Sérgio Campos Matos, falámos da importância das antigas tertúlias de sábado à tarde, na Travessa do Moinho de Vento, em casa de António Sérgio. O encontro de diversos pontos de vista, o debate e a reflexão pressupunham o apelo sério ao sentido crítico… Aí se encontravam Álvaro Salema, Agostinho da Silva, Castelo Branco Chaves, mas também jovens como José-Augusto França, Fernando Ferreira da Costa e Natália Correia. O ensaísta combatia a ignorância do país, acreditando num impulso emancipador de “cidadãos, com dotes intelectuais, iniciativa realizadora, eficaz organização; com clareza, frieza e equilíbrio de entendimento; autodomínio e atenção aos factos; ordem nas ideias; - senso crítico”. Demarcava-se de uma ancestral política que designava como de “transporte”, apelando para mais do que uma mera política de “fixação”. Tornava-se essencial a vontade, a ponderação de diversas perspetivas e a compreensão dos motivos económicos e das complexas dinâmicas culturais. Deste modo, sobre o célebre tema das “Duas Políticas Nacionais”, António Sérgio considerava Portugal como um território com dois países dentro dele – um país tradicional e fechado e um país moderno e aberto, envolvendo o dualismo entre o litoral e as cidades, o interior e a província, o racional e o castiço. Eis por que não podemos dispensar o debate de ideias nem o papel de quem deseja refletir para além do que mais grita ou de quem corre atrás do efeito fácil. Só entendendo essa dualidade será possível encarar o desenvolvimento como algo que não pode ser concebido a preto e branco. Só poderemos progredir se compreendermos o que permanece e o que muda, o que resiste e o que avança.
Apenas o conhecimento e a reflexão, a aprendizagem, a ciência e a cultura podem ajudar-nos. Fala-se hoje de recuperação e de resistência, a Europa e os europeus, o mundo e os cidadãos são chamados à responsabilidade, para que ultrapassem a irrelevância. Os dilemas entre a saúde e a economia, entre sustentabilidade e crescimento só se superam com estudo, trabalho e compreensão da complexidade… Escrever história, segundo António Sérgio assemelha-se à feitura de um colar: “o que faz de um qualquer número de pérolas um colar é o fio invisível e interior que as une – que as liga a todas numa certa ordem”. Hoje sabemos que é a liberdade a democracia que aí se devem encontrar, para que a reflexão ponderada se una à legitimidade popular.
«Diálogo com António Sérgio» de A. Campos Matos, Edições Colibri, 3ª edição, 2019, reúne um conjunto de textos antológicos, a partir de originais do próprio autor dos “Ensaios”, montados em forma de entrevista, o que permite um contacto direto com a obra de um autor fundamental do século XX.
VOCAÇÃO PEDAGÓGICA A abrir o Diálogo com António Sérgio, Agostinho da Silva, num texto publicado em 1983 no JL diz-nos: “Creio que nenhum dos grandes vultos da história da cultura portuguesa poderá ombrear com Herculano tanto como Sérgio. Ligam-nos exigências do documento, a privacidade do pensar lógico (se é que há outro), a vocação pedagógica, a integridade do comportamento, a incansável intervenção cívica, a dedicação a um projeto de Portugal, a insistência numa reflexão de conjunto, e, na expressão e variedade de estilo, ainda mais vincada no de Vale de Lobos. Excede-o Sérgio na conceção filosófica, que vai além do kantismo”. Nada melhor do que, neste número celebrativo do JL, invocar o ensaísta pela mão de um sergiano de provas dadas, como Campos Matos, sob a memória de Alexandre Herculano e através da recordação de Agostinho da Silva. Passados cinquenta anos depois da morte de António Sérgio, é fundamental voltar a lembrar o que José Cardoso Pires perguntava no célebre número especial de “O Tempo e o Modo” (1969): “Quantos anos levará o País a inventariar criticamente o espantoso trabalho deste homem de exceção?”. É uma tarefa que nos está confiada e exigida, compreendendo o que o próprio ensaísta nos ensinou – a ler criticamente uma obra de ideias, contrapondo e confrontando argumentos, provas, evidências, dúvidas, incertezas… Uma leitura acrítica será sempre uma traição, já que o pensamento flui permanentemente e só pode tornar-se vivo se for posto à prova, confirmado ou infirmado… “Sou apenas pedagogista, uma sorte de pregador, um filósofo, um campeador pela cultura e pelo bem do Povo cujo único cuidado são as pedras vivas que sofrem; e se às vezes problematizo sobre temas de História faço-o como ensaísta de soluções hipotéticas acerca da maneira de interpretar o que foi”… (Ensaios, II). O estudo histórico visa, no fundo, a melhor compreensão da humanidade, como realidade que se projeta no presente, a partir do passado com compreensão dos desígnios futuros. A leitura de um texto, ainda atualíssimo, como Educação Cívica demonstra bem como António Sérgio considerava a aprendizagem como fator essencial de desenvolvimento, pensando a história não como modo de mudar a mentalidade de quem a estuda, mas como forma de viver melhor e com mais exigência. Daí a importância do ensaísmo. “Entre nós (como diz Sílvio Lima), o ensaísmo renascentista só entre navegadores perpassa: esse, porém, muitíssimo limitado na sua alçada (a técnica navegatória, a observação material), por isso que no domínio filosófico e humano a estrita ortodoxia do catolicismo de Trento impunha barreiras de tal forma rígidas que tornavam impossível o mais pequenino ensaio”. A singularidade de Montaigne e a procura do “que sais-je?” romperam esse constrangimento tradicional, abrindo horizontes, como Antero afirmou, melhor que ninguém, ao tratar do tema no Casino Lisbonense, a propósito das “Causas da Decadência”. “O espírito ensaístico é o espírito crítico, é o da dúvida metódica, e o de plurilateralismo de visão racional; é o da plena consciência do caracter hipotético de todo o nosso pensamento e interpretação das coisas”…
O QUE É A CRÍTICA? E que é a crítica? O entendimento da complexidade e da dificuldade das coisas, o ceticismo ativo, a sinceridade connosco. E eis que se trata de usar o método positivamente. Assim como as navegações pressupuseram um crer consciente e positivíssimo, não puderam ser “a acertar” ou pelo uso do improviso. Não. “Atos sem dúvida de estupenda audácia são planeados e encaminhados por uma grande obra de Inteligência. Nada de aventureirismos nem de sonambulismo, mas um modelo acabado de razão prática: o claríssimo pensamento precedia o nobre feito”. A fixação e o transporte constituem, deste modo, bons exemplos de reflexão para Sérgio, a propósito das duas políticas nacionais de Portugal. Estas não podem ser vistas de forma simplificada e unilateral: a doutrina da fixação “não é uma ideia exclusiva, não pretende que desistamos de comerciar e de transportar; muito pelo contrário; (Sérgio) sustenta, porém, que a atividade comercial marítima não será sólida e vigorosa se não assentarmos ao mesmo tempo, e na mais pujante vitalidade, a base económica metropolitana e a prosperidade do nosso agrícola, de que depende o emprego para os demais cidadãos; que a faina da periferia, que essa corrente vital do exterior para o interior, ou centrípeta será mórbida, e extenuante se não for forte e regular a vitalidade do seu núcleo, e saudável a corrente sanguínea que vai de dentro para o exterior, ou centrífuga, na lida económica do País…”. Longe da ideia de que as inércias podem ser criadoras de riqueza, o ensaísta fala-nos na necessidade de planeamento, de cooperação e de uma organização das instituições e das elites de modo a fomentar o progresso. Na linha de pensamento da Geração de 1870, o ensaísta recusa o fatalismo do atraso e propõe não só uma explicação para incapacidades antigas, mas também saídas futuras para superar bloqueamentos e fragilidades ancestrais.
UM PENSAMENTO ATUAL Que propunha, afinal, António Sérgio? “Procure adquirir cada cidadão português uma noção geral da maneira prática de darmos ao país da realidade o lugar que lhe compete; procure governar a sua vida económica por meio de instituições cooperativas; procure compreender alguma coisa dos interesses económicos da sua terra, de como esses interesses tomarão corpo nas cooperativas e nos sindicatos, de como os grupos desses interesses se organizarão no município, e os interesses provinciais nas assembleias provinciais que devem ser corpos legislativos com larga alçada administrativa, sobretudo pelo que respeita às finanças e à economia”. Urgia compreender as condições materiais complexas e diversas e a necessidade de elites locais, “capazes de dirigir com espírito largo os negócios concretos da região, de civilizar o povo com quem estão em contacto e de inspirar as decisões do governo central”, chamando o Estado as associações e a sociedade civil a colaborar com ele. Descentralizar pelo espírito, seria dar responsabilidade aos cidadãos e realizar o autogoverno, a partir da educação cívica e da escola. Alexandre Herculano falou, por isso, da governação do país pelo país. Daí a necessidade de erradicar uma espécie de parasitismo e de indiferença, pelos quais a sociedade se torna passiva e incapaz de progredir. Por isso, aquando exerceu funções de Ministro da Instrução Pública, num breve período, A. Sérgio deixou-nos a fundamental Junta de Propulsão de Estudos, para apoiar os estudiosos e investigadores nas principais instituições científicas do mundo, porque “cultura não é receber, ingerir, mas essencialmente criar – criar em nós próprios uma mente lúcida universalista, crítica”.
10. GILBERTO FREYRE E O LUSO-TROPICALISMO ANTÓNIO SÉRGIO E O MUNDO QUE O PORTUGUÊS CRIOU
António Sérgio, após louvar e enaltecer a abertura, cosmopolitismo, antirracismo, entre outras caraterísticas dos portugueses, no seguimento do luso-tropicalismo, coloca uma questão, que tem como decisiva: se assim é, qual a razão para o nosso horror à ciência, ao labor e saber científico? Quais os fundamentos para o nosso conservadorismo, o não culto da democracia?
Parece haver uma contradição, um contrassenso. Porquê?
Em prefácio à obra “O mundo que o Português criou”, de Gilberto Freyre (Livraria José Olympo Editora, Rio de Janeiro, 1940), escreve também A. S.:
“(…) admitido o plástico do caráter da Grei - determinante do êxito que ele alcançou no Brasil - não nos releva abster-nos, por isso mesmo, de buscar a causa do seu insucesso na Europa em qualidades intrínsecas do Português? Não estaremos obrigados, por conseguinte, a sinalar como réu do nosso destino europeu o dado complementar e correlativo do homem, isto é, o ambiente físico em que ele nasceu?
E acrescenta:
“Ai de mim! Formulador de perguntas, a tal interrogação hei de responder com outras: não seria acaso nas regiões do Brasil que o Português encontrou pela primeira vez condições de ambiente francamente propícias para um género determinado de cultura básica? (…) admitida a hipótese, poder-se-ia dizer: por ser desse modo, desde o princípio da nossa história que andámos buscando nos recursos do Oceano - no sal, na pesca e no comércio marítimo - as possibilidades de subsistência e de esplendores de vida de que sempre a nossa terra se nos mostrou avara”.
Assim, após reconhecer o mérito intelectual e científico de Freyre sobre o mundo que o português criou em regiões tropicais, quer em termos de amplidão e de originalidade, interroga-se do porquê da modéstia do que fizemos e fazemos na Europa, a que associa (e a que não serão alheios) fatores agro-clímacos a nível europeu.
Uma outra contradição, por certo, uma vez que os dotes que nos fizeram nos trópicos são os mesmos que na Europa nos desserviram.
A que acresce, diremos nós, o argumento permanente de que foi sempre demasiado pequeno para o nosso ego o nosso ponto de partida, sentindo-nos asfixiados nesta ponta ocidental da Europa, pelo que estamos permanentemente de partida, necessitando sempre de aventura. O que nos dificulta o conhecimento de nós próprios na Europa e enquanto europeus, fazendo lembrar a velha dialética do Velho do Restelo, nos Lusíadas, de Camões.
E após agradecer a amabilidade de Freyre por ser seu prefaciador, tornando-o conhecido dos leitores no Brasil, agradece em nome da gente do seu país”(…) o sólido prestígio que deram os seus livros à nossa capacidade de colonização, com a preclara autoridade que conquistaram”, tendo como inútil querer formular no seu país (ou no nosso) qualquer juízo sobre ele, uma vez que tanto lá como cá “(…) se escreveram sobre os livros do historiador-sociólogo apreciações sagazes e de cabal justiça, a que eu nada acrescentaria que tivesse préstimo”.
Quanto às formulações, indagações e possibilidades que levanta, questiona:
“Será assim como eu digo? Estará aí a verdade?
A mim cabe a pergunta, o responder é para os sábios.
Só formulo um problema, uma interrogação, uma hipótese, como simples apêndice de um admirador curioso a um dos temas da obra de Gilberto Freyre”.
Eis um testemunho de uma figura não apoiante do Estado Novo e não detrator da obra de Freyre.
Cinquenta anos depois da sua morte, António Sérgio (1883-1969), o célebre autor dos “Ensaios”, deve ser revisitado, na sua obra multifacetada, com renovado interesse.
TESTEMUNHO PEDAGÓGICO Preocupado, ao longo da vida, com o testemunho pedagógico para as gerações futuras, o ensaísta foi um cultor incansável do sentido crítico. E hoje, perante a crise do pensamento político, é necessário lermos e ouvirmos os seus ensaios, nos quais nos propõe, em lugar de receitas ou de caminhos pré-fabricados, vias múltiplas centradas na autonomia e na responsabilidade, articulando a importância da singularidade individual (ou não fosse ele um idealista racional) com a solidariedade voluntária (baseada no cooperativismo). Note-se que, no fugaz tempo em que foi Ministro da Instrução Pública deixou duas marcas indeléveis que ainda hoje merecem referência: a criação da Junta de Orientação dos Estudos (Decreto nº 9332, de 29 de dezembro de 1923) e do Instituto do Cancro. A Junta foi criada no sentido da abertura dos nossos investigadores e estudantes ao contacto internacional, através de bolsas de estudo e de formações avançadas (que teria continuidade na Junta de Educação Nacional, no Instituto de Alta Cultura, chegando ao Instituto Camões). Devemos lembrar ainda que José de Azeredo Perdigão, um sergiano confesso, desenvolveu, na linha do mestre, corajosamente o apoio ao conhecimento na Fundação Calouste Gulbenkian, com belos frutos na abertura de horizontes e no apoio a personalidades, independentemente do seu alinhamento político. O Instituto Português para o Estudo do Cancro (Decreto nº 9333, de 29 de dezembro de 1923), hoje Instituto Português de Oncologia, que o Professor Francisco Gentil animou, dando projeção internacional e grande prestígio, é um exemplo premonitório da necessidade de ligação estreita entre a ciência e a saúde. Poucos governantes têm a seu favor uma tão importante marca simbólica de valor perene. É notável como num período curtíssimo encontramos duas decisões cruciais, por partirem da compreensão de que o desenvolvimento humano tem de se centrar na educação, na ciência e na cultura – e de que a dignidade humana só se defende com atos concretos orientados para a abertura de horizontes e para a cooperação além fronteiras.
POLEMISTA AGUERRIDO Se António Sérgio foi um polemista aguerrido, o certo é que, hoje, na distância do tempo, podemos afirmar que, na senda de figuras que tanto admirou, como Herculano e Antero de Quental, preocupou-se em modernizar Portugal, seguindo a lição da Geração de 1870, não na lógica do pessimismo, mas na perspetiva de superar a mediocridade, sem iludir defeitos e limitações. O empenhamento na causa da Instrução Pública é significativo e facilmente o verificamos na leitura da sua vasta bibliografia. Foi importante a passagem por Genebra com sua mulher D. Luísa Sérgio e compreendemos como António Sérgio pensou a modernização do País através do estudo e do conhecimento das mais modernas tendências do pensamento. Leia-se a série de ensaios publicados na revista “A Águia”, da Renascença Portuguesa, sobre a “Educação Cívica”, que continua a ter interesse e atualidade pela defesa de uma cidadania ativa e pela ideia de República Escolar, na linha do pensamento de John Dewey e dos mais fecundos pedagogistas do seu tempo. E a verdade é que aí encontramos uma preocupação fundamental em que o rigor, a exigência se aliam à motivação e à tomada de consciência fecunda de cidadãos livres e iguais, autónomos e responsáveis, empenhados e solidários. Para Sérgio a escola era lugar natural de cidadania, e as mais recentes investigações das neurociências confirmam a importância de considerar desde a infância a aprendizagem da cidadania e do compromisso solidário. A sociedade não está fora da escola, faz parte intrínseca da vida escolar e da comunidade educativa. Do mesmo modo, o cooperativismo constitui não uma receita teórica, mas um desafio prático, que ainda hoje continua por cumprir, sendo um elemento que a história recente tornou mais atual. A ação cooperativista de António Sérgio constitui, aliás, uma indelével marca política que, apesar das resistências, continua a ser relevante. De facto, nem o Estado nem o mercado só por si podem responder às exigências da sociedade e da economia. Assim, para que não haja um Estado produtor, centralizado e burocrático ou um mercado vulnerável e incapaz de garantir eficiência e equidade ou de assegurar uma concorrência sã e equilibrada, impõe-se a criação de uma economia cooperativa, capaz de realizar um Estado catalisador e ordenador e um mercado justo...
REFLEXÃO NECESSÁRIA A obra do escritor é rica de reflexão, mas pode dizer-se que o espírito de reformador está enraizado na sua atitude intelectual. Daí a riqueza e atualidade da sua obra, na qual pretende descobrir a chave das nossas limitações e das nossas fragilidades. Trata-se de procurar, na linha das “causas da Decadência” de Antero, linhas de orientação e de ação capazes de garantir a superação do nosso atraso. Daí a dualidade transporte / fixação, na qual há uma procura determinada no sentido de um maior e melhor aproveitamento dos recursos próprios – a começar nas pessoas e a continuar nos recursos disponíveis – no território, na inserção internacional e na cooperação científica e técnica. Quando António Sérgio publicou a sua Antologia dos Economistas Portugueses (1924) ou quando proferiu a conferência sobre “as duas políticas nacionais” (1925), dada à estampa no segundo volume dos Ensaios, lembrou que três autores seiscentistas, Luís Mendes de Vasconcelos, Severim de Faria e Duarte Ribeiro de Macedo, iniciaram a doutrina da política da Fixação, contra a política do Transporte; e o reformismo português, desde aí até agora, será o desenvolvimento dos princípios que defenderam nas suas obras. Em Vasconcelos é a Fixação, pela agricultura; em Severim, pela agricultura e pelas indústrias; em Macedo, finalmente, são as minúcias de um programa de fomento industrial”. Logo no final do século XVII, porém, o dinheiro das minas do Brasil e mais tarde os empréstimos do constitucionalismo e as remessas dos emigrantes adiaram a realização das ideias dos três reformadores. Mas o seu espírito continua, ressalvadas as distâncias e qualquer anacronismo, vivo e pertinente, em nome de um reformismo que foi assumido por Herculano, pela geração de 1870, pela “Seara Nova” e pelo moderno pensamento democrático. Como afirmou o ensaísta: “parece-me que os males de que nos queixamos são fatalíssima consequência da estrutura da sociedade, - e que só portanto terão remédio se nos metermos firmemente a transformar essa estrutura, o que não é possível com pregações, nem com políticas de autoritarismo, nem com reformas só pedagógicas, - mas com reformas sociais e pedagógicas concatenadas, entrelaçadas como fios de um tecido único, as quais preparem o nosso povo para um uso razoável da liberdade e para empreender por si mesmo a sua emancipação social-económica”.
Guilherme d'Oliveira Martins
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«Antologia dos Economistas Portugueses», com seleção, prefácio e notas de António Sérgio (Biblioteca Nacional, 1924) é um clássico da nossa bibliografia a não perder.
UM PENSAMENTO OPORTUNO O pensamento económico português foi marcado ao longo dos séculos pelo estudo das condições que caracterizam a nossa situação quase paradoxal de um território europeu virado ao mar, mas com inequívocas carências, com exigentes solicitações globais em razão da presença dos portugueses no mundo. Tal é o pano de fundo dos movimentos que obrigaram sucessivas gerações a partir – ora para a Índia, ora, em ocasiões diferentes e com destinos diversos, para a emigração. Se a longa costa atlântica portuguesa permitiu contrariar a situação periférica, o certo é que houve sempre uma tensão entre a defesa de um melhor aproveitamento dos recursos próprios e a consideração das oportunidades dos movimentos de pessoas e mercadorias… São bem conhecidos os alertas de Infante D. Pedro das Sete Partidas na célebre Carta de Bruges ou as queixas de Francisco Sá de Miranda: “Não me temo de Castela, donde guerra inda não soa, / mas temo-me de Lisboa que ao cheiro desta canela o reino nos despovoa”. E não esquecemos o conde da Ericeira na defesa do espírito manufatureiro, a que a chegada do ouro do Brasil não deu continuidade. Houve, assim, plena consciência de que era preciso fixar riquezas depois de partir em sua busca. Essa procura teria de ser compensada de alguma forma, para que a míngua de pessoas não impedisse a criação e consolidação de uma cabeça coerente e de uma orientação eficaz para o império.
OBRAS PIONEIRAS DA NOSSA CULTURA Falando de obras pioneiras portuguesas no tocante à economia, cabe referir, os fundamentais autores seiscentistas – Mendes de Vasconcelos, Severim de Faria e Ribeiro de Macedo. Em 1608, Diálogos do Sítio de Lisboa de Luís Mendes de Vasconcelos (c. 1542-1623) é o primeiro exemplo de uma tomada de consciência sobre a importância da capacidade criadora da economia. O autor viveu na passagem do século XVI para o século XVII, foi Capitão das Armadas do Oriente egovernador em Angola. Nesse livro – onde discutem um Filósofo, um Soldado e um Político – encontramos a exaltação das qualidades da cidade de Lisboa, sobretudo quando comparada com Madrid e, tratando-se do tempo de Filipe I, durante a monarquia dual, António Sérgio diz-nos que o autor procurava convencer o rei “a mudar de Madrid para Lisboa a capital do seu império”. Por outro lado, combate-se “o estonteamento da nossa política ultramarina, que consistiu em se perverter o objetivo comercial com as ideias de conquista”. Luís Mendes de Vasconcelos defende, assim, a criação e a fixação, não apenas no domínio teórico, mas com exemplos práticos do que hoje classificaríamos como ordenamento do território, em especial para o aproveitamento agrícola nas lezírias do Tejo e na região de Lisboa. Ainda para Sérgio, este reformismo assenta na “política fixadora, a da produção metropolitana, com base na estabilidade do comércio do ultramar, e da sua nacionalização”; bem como num conceito de glória e heroísmo –“a glória do político e do militar, o heroísmo do servidor da pátria está em concorrer para a prosperidade dela”…
REMÉDIOS PARA O DESPOVOAMENTO Já o clérigo e teólogo formado pela Universidade de Évora, Manuel Severim de Faria (1583-1654) subscreve, com preocupações paralelas, Dos Remédios para Remédios para a falta de Gente (1655), onde critica a prioridade bélica em detrimento do comércio e da manufatura – somando-se esse mal á falta de investimento, aos defeitos do arranjo agrário, à concentração fundiária, ao absentismo e ao despovoamento... De mais a mais, o império do Índico apresentava-se frágil por falta de organização mercantil, e por defeitos no arranjo agrário. Daí se advogar a prioridade para o comércio, a indústria e as manufaturas, único modo de fixar recursos, devendo a preocupação de criar riqueza prevalecer sobre a conquista. Só favorecendo o governo do Reino a introdução de ofícios e técnicas modernas poderia o mesmo alcançar a independência económica da nação. O jurisconsulto e diplomata Duarte Ribeiro de Macedo (1618-1680) publicou o Discurso sobre a introdução das artes no Reino (1675). Em coerência com a sua correspondência com o Padre António Vieira e D. Francisco Manuel de Melo. O escritor considera ser fundamental a compreensão de que só haveria um meio para evitar a dependência do exterior pelas importações, e esse seria impedir que o dinheiro saísse do Reino através da criação de artes e manufaturas. A introdução de uma tal orientação evitaria o dano que fazem ao Reino o luxo e as modas; obstaria à ociosidade; tornaria o país povoado e abundante com gentes e frutos; aumentaria as rendas reais (“porque o peso que levam poucos, dividido por muitos, é mais fácil de levar e pode ser maior”); e atrairia ouro de Espanha, aproveitaria mais as colónias e daria ao porto de Lisboa, superior ao de Constantinopla, a primazia do comércio do mundo. Escrevendo na França de Colbert, Ribeiro de Macedo considerava que haveria que seguir os caminhos mercantilistas de França e Itália e que a Inglaterra começava a trilhar. Saliente-se ainda que, tal como o Padre Vieira, o diplomata defendeu a necessidade de encontrar um entendimento com judeus e cristãos-novos de modo a angariar novos meios e capacidades. Dois outros diplomatas merecem referência pela valia dos seus escritos de orientação convergente com a de Duarte Ribeiro de Macedo – refiro-me a Alexandre de Gusmão (1658-1753) e D. Luís da Cunha (1662-1749). O primeiro defendeu o combate à ociosidade, o aumento da agricultura, o aproveitamento das ribeiras para navegar e regar, o estabelecimento de fábricas, o aumento da indústria e o favorecimento do comércio dentro e fora do reino. O segundo insiste na necessidade de dar um uso positivo à propriedade agrícola e de favorecer o investimento nas artes. Tratava-se de colher nas experiências das nações civilizadas os melhores exemplos com resultados práticos.
LIÇÕES PARA DIVERSOS TEMPOS Quando António Sérgio publicou a sua Antologia dos Economistas Portugueses (1924), lembrou que os três autores seiscentistas “iniciaram a doutrina da política da Fixação, contra a política do Transporte; e o reformismo português, desde aí até agora, será o desenvolvimento dos princípios que defenderam nas suas obras. Em Luís Mendes de Vasconcelos é a Fixação, pela agricultura; em Severim de Faria, pela agricultura e pelas indústrias; em Ribeiro de Macedo, finalmente, são as minúcias de um programa de fomento industrial”. Logo no final do século XVII, porém, o dinheiro das minas do Brasil e mais tarde os empréstimos do constitucionalismo e as remessas dos emigrantes adiaram a realização das ideias dos três reformadores. Mas o seu espírito continua, ressalvadas as distâncias e qualquer anacronismo, vivo e pertinente, em nome de um reformismo que foi assumido por Herculano, pela geração de 1870, pela “Seara Nova” e pelo moderno pensamento democrático. Regressar aos clássicos é, no fundo, um privilégio, sobretudo quando podemos usufruir através da sua leitura de ensinamentos duradouros e perenes.