Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
A razão iluminista tinha como desígnio a reconciliação e emancipação plena do Homem. Mas, de facto, sem esquecer evidentemente conquistas irrecusáveis, como, por exemplo, as Declarações dos direitos humanos nas suas várias gerações, deparamos com duas guerras mundiais e as suas muitas dezenas de milhões de mortos, o comunismo mundial e também os seus milhões e milhões de vítimas, deparamos com Auschwitz e o Goulag, o fosso cada vez mais fundo entre a riqueza e a miséria, a Natureza ferida, a desorientação e o vazio de sentido...
E, desgraçadamente, sabemos que o número das vítimas não cessará de aumentar, de tal modo que frequentemente a História nos aparece, como temia Walter Benjamin, à maneira de um montão de ruínas que não deixa de crescer. Mas, mesmo que fosse possível realizar no futuro uma sociedade totalmente emancipada e reconciliada, nem assim, desde que iluminada pela memória, a razão poderia dar-se por satisfeita, pois continuariam a ouvir-se os gritos das vítimas inocentes, cujos direitos estão pendentes, pois não prescrevem.
O teólogo Johann Baptist Metz não se cansou de repetir, com razão, que só conhecia uma categoria universal por excelência: a memoria passionis, isto é, a memória do sofrimento. Se a História não há-de ser pura e simplesmente a história dos vencedores, se a esperança tem de incluir a todos, quem dará razão aos vencidos?
A autoridade do sofrimento dos humilhados, dos destroçados, de todos aqueles e aquelas a quem foi negada qualquer possibilidade é ineliminável. Trata-se de uma autoridade que nada nem ninguém pode apagar, a não ser que o sofrimento não passe de uma função ou preço a pagar para o triunfo de uma totalidade impessoal. Mas precisamente o sofrimento, que é sempre omeu sofrimento, oteu sofrimento, como a morte é sempre a minha morte, a tua morte, é que nos individualiza, dando-nos a consciência de sermos únicos, de tal modo que nenhum ser humano pode ser dissolvido ou subsumido numa totalidade anónima, seja ela a espécie, a história, uma classe, o Estado, a evolução... O sofrimento revela o outro na sua alteridade, que nos interpela sem limites.
Assim, se as vítimas têm razão - a razão dos vencidos, como escreveu o filósofo Reyes Mate -, com direitos vigentes que devem ser reconhecidos, não se poderá deixar de colocar a questão de Deus, um Deus que as recorde uma a uma, pelo nome, chamando-as à plenitude da Sua vida. "Essa é a pergunta da filosofia", dizia Max Horkheimer, da Escola Crítica de Frankfurt. Mas é claro que para essa pergunta só a fé e a teologia têm resposta. Ele próprio o reconheceu, ansiando pelo “totalmente Outro”.
Se a História do mundo tem uma orientação, ela só pode ser a liberdade. Ser Homem, ser livre e ser digno identificam-se. Com razão, I. Kant não se cansou de repetir que o respeito que devo aos outros ou que os outros podem exigir de mim é o reconhecimento de uma dignidade, isto é, de um valor que não tem preço. O que tem preço pode ser trocado: é meio. O Homem não tem preço, mas dignidade, porque é fim em si mesmo.
Quando nos interrogamos sobre o fundamento da dignidade do Homem, encontramo-lo no seu ser pessoa. Pela liberdade, a pessoa está aberta ao Infinito. Se se reflectir até à raiz, concluir-se-á que o fundamento último dos direitos humanos é nesse estar referido estrutural do Homem ao Infinito que reside: nessa relação constitutiva à questão do Infinito, à questão de Deus precisamente enquanto questão (independentemente da resposta, positiva ou negativa, que se lhe dê), o Homem aparece como fim e já não como simples meio.
O Homem é senhor de si, autopossui-se, e é capaz de entregar-se generosamente a si próprio a alguém e por alguém. A Humanidade faz a experiência de si como história de libertação para mais humanidade, portanto, para mais liberdade. O Homem indigna-se desde o mais profundo de si contra a indignidade, revolta-se contra toda a violação arbitrária e impune da justiça e do direito, e é capaz de dar a vida pela dignidade da humanidade em si próprio e nos outros seres humanos.
Houve muitos homens e mulheres que, ao longo da História, livremente, morreram por essa dignidade. Mas mesmo que tivesse havido apenas um a fazê-lo, seria inevitável perguntar: o que é isso que vale mais do que a vida física?
Precisamente aqui, nesta experiência-limite, deparamos com o intolerável: como é que pode ser moralmente admissível que quem é sumamente digno, pois se entrega até ao sacrifício de si pela dignidade, morra, desapareça e apodreça, vencido para sempre? Por isso, neste acto de suma dignidade, encontramos um dos lugares em que a questão de Deus enquanto questão é irrenunciável e irrecusável.
A experiência do Deus bíblico surge essencialmente da experiência do intolerável de as vítimas inocentes serem entregues para sempre à injustiça. O Deus bíblico é definitivamente um Deus moral: é o Deus que não esquece os vencidos.
Por isso, a História não é um continuum, onde a razão estaria permanentemente do lado dos vencedores. A História está aberta ao salto último da meta-história, à Palavra definitiva que só Deus pode pronunciar, Palavra que ressuscita os mortos e reconhece para sempre às vítimas os seus direitos. Sem esse reconhecimento definitivo da dignidade de todos, bem e mal, justiça e injustiça, honra e cinismo, verdade e mentira, dignidade e indignidade, tudo é igual, pois, como escreveu Bernhard Welte, tudo seria para nada, já que irá ser engolido pelo nada para sempre.
Anselmo Borges Padre e professor de Filosofia Escreve de acordo com a antiga ortografia Artigo publicado no DN | 12 de fevereiro de 2022
Que escreveria Mr Charles Dickens entre Cleveland e Philadelphia após visionar as convenções partidárias republicana e democrata nas eleições para a US White House? Aquele é o melhor dos candidatos, aquele é o pior dos candidatos, é o discurso da sabedoria, é o discurso da temeridade, é o voto do acreditar, é o voto da incredulidade, é a mensagem da luz, é a mensagem das trevas, é a primavera da esperança, é o inverno do descontentamento, tudo temos diante de nós, nada temos diante de nós, todos vamos diretos para o céu, todos vamos diretos no caminho contrário.
As arenas da aclamação de Mr Donald J Trump e Mrs Hillary R Clinton dizem tanto das dissemelhanças presentes quanto dos futuros imperfeitos. — Chérie! Aux grands maux, les grands remèdes. O novo comissário britânico em Brussels recebe a pasta da segurança em pleno European bloody Summer. Com o Isis a reivindicar ataques em France e Germany, dois jihadistas assassinam um padre católico numa igreja da Normandy. Face à barbárie sacrílega, crentes da cruz e do crescente oram juntos na catedral de Notre Dame (Paris) — Humm! Do not burn the candle at both ends. A IMF Director Christine Lagarde vai a julgamento como negligente ministra das finanças, pelo pagamento de €400m públicos a famoso empresário num diferendo com um banco estatal. Três banqueiros irlandeses são condenados a penas de cadeia por fraude financeira de €7bn. Pope Francis medita no Auschwitz Camp (Poland).
Rainy and cloudy summertime at the City. O habitual murmurinho em torno do Thames River sobe de volume no weekend. Não bastara a tradição corbynista dos protestos em Westminster Disctrict como nova modalidade de repouso semanal para as massas em processo apressado de consciencialização classista, eis ruas e pontes fechadas ao trânsito em virtude da invasão de milheirais ciclistas na RideLondon 100. A cor da corrida é escoltada pela tensão dos nativos. Problemático é circular nas 100 milhas condicionadas entre a partida do Queen Elizabeth Olympic Park, em Stratford, as voltas pelo Surrey e a meta em pleno Mall! Uma emoção, todavia, aberta com excêntricos amadores na Saturday’s RideLondon FreeCycle rodando desde a Central Lon de Blackfriars, Trafalgar Square e Chelsea Embankment ao East de Tower Hill ou West Knightsbridge. A quadrar os espíritos, HMaj Government delay o projeto Hinkley Point C. Para aferir do alvo, interesse pátrio e efeitos externos, note-se que a primeira central nuclear do UK em 20 anos vale £18bn a edificar em Somerset e tem financiamento chinês e tecnologia gaulesa. Na valsa política avulta analogamente um aviso à navegação emitido pela House of Lords. Os pares eurófilos querem a Brexit sob escrutínio prévio e prefiguram uma crise constitucional se acaso enveredarem por refrear a vontade popular expressa no referendo de June 23rd. Já a Prime Minister RH Theresa May prossegue impassível nos preparativos de an orderly departure da Union. Recebe no No. 10 o Irish Taoiseach Enda Kenny e visita Rome, Warsaw e Bratislava, avistando-se com os homólogos Mr Matteo Renzi, Mrs Beata Szydło e Mr Robert Fico. O tom tranquilo destes encontros é sintetizado na capital italiana pela Premier: ― “[W]e have talked not just about a successful Brexit but also about how we work together (…) to respond to the complex global challenges we face.” Donde: terrorismo e emigração sobre a mesa.
A suavidade diplomática da senhora contrasta com agendado furor legado pelo seu antecessor. Na hora de dizer adeus a Downing St, RH David Cammeron elabora listagem de honrarias para amigos, aliados e… Remainers. Destinadas a premiar feito ou serviço mor. as reações de insatisfação variam no tom e no grau, não no sentido. Uns recordam ter o autor distinguido o seu cabeleireiro com notável MBE (Member of the British Empire) já em 2014, enquanto outros comparam o gesto atual com o cash for honours’ scandal que prende RH Tony Blair a censura de trocar peerages por apoios que salvam o Labour Party da bancarrota em 2006. Seja como seja, o dignificado rol declara a grandeza pública de privadíssimo thank you a pessoas que o ido PM quer inscritas na restrita elite de cavaleiros e damas radicada na ordem de cavalaria criada pelo King Edward III em 1348 ― em cujo livro fundacional de Bruges surgem os brasões de João I de Portugal e dos Algarves. A seleção de Cam tropeça no eixo gregário das insígnias. Exemplo dos novos virtuosos? Ms Isabel Spearman, conhecida como "Samantha Cameron’s Girl Friday" por organizar as roupas e o calendário social de Mrs Cameron, bem como Mrs Thea Rogers, a special adviser do ex Chancellor George Osborne a quem são creditados moderno penteado e sã dieta do outrora residente no No. 11. O apreço pela domesticidade escolta a estima por quantos ainda andaram com o honorável Dave na desafortunada campanha euroreferendária. Aqui aparecem Mr Ian Taylor e Mr Andrew Cook (que pede excusa), duo com doações milionárias a Tories e ao Stronger In, a par do trio de estrategas do Project Fear — Mr Will Straw, Mr Dan Korski e o mastermind RH G Osborne. Afinal. esta é linhagem de meritocratas que tem por divisa o eduardino Honi soit qui mal y pense.
Também o turismo político que regularmente disputa o centro histórico de London traz consigo coisas de pasmar. A última tirada digna de nota sai de protesto contra o racismo e o fascismo, no segmento anti escravatura. Depois da maré contra as estátuas dos arquitetos do império, guilty of colonialism, avança vaga dos justiceiros históricos. O pregão honra o melhor costume de piratas e flibusteiros, porquanto algures coteja com engenhoso mapa do tesouro.
Os ativistas sustentam com estridência que o reino deve triliões de libras a quantas terras demandou e aos descendentes de quantos nos séculos por lá adquire, trafica e escraviza. Uma destas profissionais de cartazes marchados pelas ruas explica caso particular: o justo face ao passado do comércio humano de há 500, 400 ou 300 anos é agora pagar-lhe cheque por slavery post traumatic disorder. Aprecio a inventiva. Cá por casa, sugerem-se as ricas embaixadas em volta para envio de merecidas faturas. As invasões bárbaras são campo fértil. Dos vikings aos romanos e teutónicos passa-se para saxões e a cada investida equivale reparação com vários zeros na coluna do haver. A soma final não terá sequer centúria, latitude ou senso como limite. — Ho-ho! Even Master Will puts the fallen king claiming for peculiar trade with the slave Catesby in Richard The Third: A horse, a horse! My kingdom for a horse! | Withdraw, my lord; I'll help you to a horse. | I have set my life upon a cast, / And I will stand the hazard of the die.