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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

  

 

96. PACIFISMO E BELICISMO (II)


Para os pacifistas, os realistas são seres humanos doentes, sendo premente analisar como pode a humanidade sobreviver a uma doença letal de que são portadores fabricantes do terror absoluto, numa sociedade contemporânea tecnicamente evoluída, em que a ciência perdeu a inspiração humanista, ao invés de uma visão pacifista da vida em sociedade, que é parte integrante de uma perceção mais ampla do ecossistema que habitamos. Não se trata apenas de banir ou evitar a guerra, em especial a nuclear, mas também de impedir o esgotamento dos recursos naturais, combater a poluição ou prevenir todas as fraquezas demenciais de cientistas e homens de poder.

Para os realistas, os pacifistas são irrealistas, nefelibatas, desajustados socialmente, ecologistas frenéticos, absurdos e ridículos, elementos incómodos, dissidentes ou agentes de propaganda desfasados da realidade e merecedores de piedade e desprezo,  pessoas e militantes de grupos ou movimentos que se colocam contra a realidade da vida, que desde sempre conheceu a guerra e a violência coletiva e ocultando, muitas vezes, uma opção político-social sob a máscara do neutralismo pacifista. 

Combatidos pelos realistas e belicistas em geral, pode aparentar ser compreensível a penalização dos pacifistas, embora aparente ser incompreensível que recebendo a Paz permanentes e sucessivas louvações, aqueles sejam quase sempre incompreendidos e desacreditados. Se a Paz é desejável por todas as pessoas, parece uma incoerência julgar os pacifistas com tanta severidade.

Porém, se tivermos presente a monumental distância que tantas vezes separa as palavras dos atos dos profissionais da guerra e da política, talvez se compreenda melhor por que são tidos como seres incómodos. 

É evidente que o pacifismo tem a sua argumentação. Por exemplo, não basta aos belicistas invocar Clausewitz, para quem a guerra não é mais que a continuação da política por outros meios, onde a intenção política é o fim, enquanto a guerra é o meio (diferente da diplomacia), dado que Clausewitz desconhecia os meios nucleares, que poderão causar uma guerra final, pelo que se impõe o fim à guerra para a evitar.   Levadas as argumentações ao extremo, uns e outros podem-se tornar uma espécie de cruzados disponíveis para uma guerra justa, em defesa da sua causa, onde o idealismo não belicoso dos pacifistas se funde com o idealismo duro dos belicistas, rumo a um idealismo comum em que, por vezes, as divergências se atenuam.   


11.03.22
Joaquim Miguel de Morgado Patrício 

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

  

 

95. PACIFISMO E BELICISMO (I)


A tradição pacifista tem uma verdade essencial, que é o valor da paz. 

Só a verdadeira boa vontade, o espírito de tolerância, a crença num estado de coisas melhor para o mundo, através de uma educação consciente podem solucionar os males da guerra.

Para os pacifistas de todos os tempos, ninguém é capaz de justificar moralmente o porquê da guerra, pela simples razão de que não tem justificação.

Anula e contradiz o imperativo primordial da ética “Não matarás”.   

A guerra, à semelhança dos genocídios e massacres, não faz parte da natureza humana, nem é espontânea, é organizada e pensada, sendo criada e sustentada por manipulações, propagandas ideológicas e construções políticas. 

É um mal absoluto e total. 

Para os belicistas a guerra é a única realidade histórica que acompanha, em permanência, o ser humano.   

Hobbes tinha-a como inerente à humanidade, como parte necessária do homem, porque o egoísmo e a ferocidade ilimitada é nele natural.   

Hegel tem a guerra como inevitável, a violência como o motor da história, sendo o herói hegeliano um guerreiro, tendo como referências históricas Alexandre (o Grande), César e Napoleão.

Os positivistas, os materialistas e os belicistas atuais, defendem que as guerras declaradas pelos Estados não são compreensíveis por remissão para critérios morais, dado tratar-se de um direito (dever) exercido com base no seu interesse soberano e não na sua justificação.

A responsabilidade do cientista é só para com a verdade científica, não para com a verdade moral ou social. Este realismo de matriz hobbesiana, tem a política internacional como uma espécie de estado de natureza em que cada Estado se assume como lobo, numa guerra de egoísmo sem fim. 

Eis que surge, então, um embate crescente entre pacifistas e realistas de base hobbesiana.

 

04.03.22
Joaquim Miguel de Morgado Patrício