Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
O antropólogo Gregory Bateson foi quem cunhou o termo «cismogénese» para referir a tendência das pessoas para se definirem por oposição umas às outras.
Esta atitude reflete o quanto um mero desentendimento pode gerar, ao fim de um certo tempo de discussão, a adoção de posições de confrontação muitíssimo intransigentes.
Na verdade, extremam-se posições, rejeitando pontos de vista que anteriormente não constituíam os abissais fossos em que passam a expressar-se.
Por óbvio, existe uma relação entre a cismogénese e a sensatez política, e, entre ela, e os candidatos a uma liderança política, podendo mesmo, este processo, criar raízes a nível cultural.
Um dos focos a ter em conta para que se evite o excesso destas posturas, reside na necessidade de que se aprenda, no diálogo, a considerar o comportamento oposto.
Contudo, se algo similar se passar entre sociedades, também cada um só se define por oposição ao vizinho.
Ora, se usamos aquecedores franceses, e os ingleses usarem ferros elétricos portugueses, será porque todos encontraram vantagens na comunicação, experimentação e aprendizagem destas tecnologias.
E se no debate, uma das partes colocar uma alternativa de postura ainda do desconhecimento da outra parte, como será possível que as posições se possam extremar, se, pelo menos um dos dialogantes, não tinha imaginado a possibilidade inovadora agora exposta, e, em rigor, nela se não pode identificar, afirmando-se por oposição ao que desconhecia e desconhece.
Na verdade, a confrontação em diálogo deve conter alternativas, expondo-se a base de sustentação para as mesmas, e deve constituir uma contribuição duradoura para o pensamento humano. Diria até que estes confrontos implicam o assumir de um tipo de encargo para uma real prosperidade da sociedade, no seu todo.
Entre as crises agudas e as ameaças crónicas só um novo paradigma para uma nova escala evolutiva fará sentido, sendo este paradigma possível, entre maturidade e competência política e civilidade participativa e criativa dos cidadãos.
As formas básicas de poder social que podem operar à escala da família ou a tipos de ampliação de domínio político, apregoam amiúde as virtudes das suas opções de estar, num pregão coletivo de uma verdade que está sempre deles mais próxima, apesar de nunca afirmarem expressamente tal assunção de vizinhança
O modo como cada um desenvolve o seu eixo de poder social, gera uma espécie de sistema de irrigação das ideias, em jeito de torniquete, e em torno de uma ordem que muito tem de administrativa, supervisionando tudo o que lhes pode interessar com o juízo único e convicto, de que será mau se lhes escapar alguma avocação.
Na medida em que o pregão das virtudes se pode passar a fazer por silêncios tácitos ou preposições q.b., ou até expresso pela boa educação e pelo prumo da mesma, bastando que se aparente, ou deveras se creia ser inquilino pela via mais confortável, dos princípios pela maioria aceites como aprazíveis e logo as concordâncias aos centros de poder se estabelecem em paz à falta de melhor.
Esta postura é outra das que mais expõe a aceitação do pregão das virtudes.
Ao aprofundarmos esta questão, verificamos que a mesma combinação de características se encontra no mesmo perfil de gentes, não se questionando por que razão tem de ser assim para que tudo funcione, e sendo que deste modo, o que funciona, é o decorativo debate sobre a desigualdade nas sociedades, admitindo, expressamente ou não, que tudo o que é altamente problemático sempre se manterá.
Então, uma resposta possível ao pregão das virtudes é o de o confrontar com a similitude do poder, que paga ao barbeiro para cortar o cabelo ao escravo, ainda que depois o alimente.
Este o compromisso ou a imagem de um dinheiro de terrível equivalência, sendo que a ambos há que romper.
Tem-se observado que o domínio no acesso a formas de conhecimento, atribui o grau de certeza aos poderes, cuja evidência de vontade de dominar é a da saciedade absoluta.
Também se sabe que apenas quando se juntam grandes números de pessoas, criam-se sociedades que necessitam de poderes que as dirijam e que tomem decisões por elas.
Ao tentarmos falar das sociedades grandes, não descuramos que nelas, o poder de características totalitário, ou o que não convoca cooperação como ato cívico, é tão mais exercido quanto menor for o contacto destas sociedades que o sofrem, com outras, cujos conhecimentos partilham, inclusive através de negócios, casamentos, viagens, etc.
No entanto, nos núcleos societários de pequena dimensão, as pessoas demonstram grandes capacidades de autogoverno, e costumam ser sociedades participativas nas comunidades e gestoras de destinos comuns, como foi em Portugal o caso ainda recente de Vilarinho das Furnas.
De facto, não havia nestas realidades, imperadores e quejandos que tivessem de obrigar a limpar as fontes de água sob pena de tortura ou execução de bens.
Na verdade, o mando carece de circo que lhe reconheça o poder, lhe obedeça e o admire, conjunto de verdades que se não observam nos meios pequenos, mais geridos por peritos rituais conhecedores de um terreno solidário, no qual a paz faz a união.
Contudo, também nas sociedades familiares a hierarquização de um mando inquestionável e violento, tem lugar, e pode até tratar-se de uma família muito pequena, mas com uma escala de densidade de falta de cultura absolutamente osteoporótica ao que acresce o poder económico dominado apenas por uma pessoa.
Seja como for, aquilo que tudo isto parece representar é que, o grande perigo da falta de cultura numa sociedade, iniciou-se desde muito cedo, podemos até afirmar que a partir do momento em que o trabalho criativo do oleiro, passou a desenvolver-se de jeito monótono, quase mesmo padronizado, e o labor feminino, à cautela foi isolado, tudo então se tornou caminho minado a um envolvimento de todos por um mundo diferente.
Reconhecer o abismo entre o que se diz poder fazer e o que de facto se consegue fazer, é compreender a realidade do poder.
Os incontáveis becos sem saída a que esta situação nos tem levado constantemente, equivale a fazer do Estado uma máscara que não existe, existindo.
Ora, não se duvide que sempre houve quem - no mais profundo e competente esforço -, nunca desistisse de acreditar que fazendo parte de um pacote histórico do atual conceito de civilização, devia à sua alma a prova de que se podia repensar uma nova ideia de política, e estes exemplos, continuam a ter lugar, apesar das dolorosas solidões das lutas nestes graus de empenho.
Na verdade, em prol de algo aparentemente fora do alcance, vão os mensageiros por palavras e obras, demonstrar que se algo tem corrido mal, será pelo hábito de viver o que se vive, em aceitação constante e sem a repelente abstenção do esforço de cada um, em favor de uma sabedoria política que necessariamente implicasse uma ajuda mútua.
Se a cooperação social, o ativismo cívico ou o cuidarmos uns dos outros, fazem parte das características da civilização, então a sua história, se começou a ser escrita, foi de há pouco, e por capítulos geograficamente distantes, o que hostiliza a hospitalidade levedada de os pensar em conjunto.
O mensageiro, creia-se, é uma das descobertas que levou sentido às comunidades morais alargadas.
Da roda do oleiro, à navegação marítima por mares nunca navegados, entre outras invenções, é muito provável que por aí viva a cartilha de algo novo, novo e propício às sociedades humanas, o que nos surpreenderá, pois afinal, podemos lá chegar e vindos de dentro.
O inevitável parece demorar a ser menos inevitável
Se um dos efeitos colaterais dos modos de vida incultos é o de que a falta de liberdade não acarreta um desafio sério ao pensamento, é porque, enfim, não nos desviamos muito do ponto de partida.
Cremos que fomos todos catalogados como sociedade segundo os nossos meios de subsistência, e sempre em posições hierarquizadas, descurando a abrangência de complexidades que, admitimos, foram atentas a um grupo de investigadores que ou não as partilharam aos colegas, ou não as conversaram com as pessoas.
Desde a década de 80, afirma-se que vivemos uma outra era «pós-moderna» e por ela se justifica a hiperespecialização, que muito leva à cegueira do imensurável restante à volta dos homens.
Em resultado de tudo isto, a história continua a expor relativas liberdades e relativas democracias, conquistas imperialistas e trabalhos de escravatura, desigualdades sociais fundas, desmedidas pobrezas, domínios violentos e fome e abandono e solidão, indiferença e sofrimento, numa ausência total de formas de vida dignificante e tudo em consequência de um processo que está a revelar-se difícil de ser eliminado.
O inevitável parece demorar a ser menos inevitável.
A percentagem de jovens e idosos profundamente infelizes, são a melhor realidade de que na idade do meio, algo funcionou ou está a funcionar mal, e que se continua a não preparar terrenos aráveis no reino dos homens.
Os homens crescem em número, mas o número de homens mais livres e com maior possibilidade de habitarem um planeta menos destruído, até ambientalmente, não constitui uma esperança.
Há que desmontar as armadilhas que favoreceram as doenças endémicas das políticas do mundo; há que pegar em formas de vida aperfeiçoadas a cada dia pelos homens em autocrítica, percebendo os erros e corrigindo-os, e sobretudo, acreditar que as lágrimas brancas não são necessariamente de sangue, mas também brancas de pureza e força contra a barbaridade dos valores burocráticos instalados.
Fanfarronices, egos, duelos, vaidades, selvajarias, desafetos, egoísmos insanos, não passam de formas de guerra cujas gordas franjas já foram detetadas fora dos tradicionais terrenos das bombas.
Não há, pois, que seguir em frente sem nenhuma alternativa.
Desde logo há que recordar o adágio mongol, «conquistar o mundo a cavalo é fácil; o difícil é desmontar e governar».
A maioria das principais descobertas da história não foi feita por pessoas que não acreditavam em descobertas.
Na realidade, os seres humanos têm capacidade de encontrar maneiras de inovar percursos, imaginar mesmo construir a sua própria história como se, desde o prévio ao que são, tivessem sabido voar, antes mesmo de conhecerem as aves e delas o seu canto.
Por que razão hoje até surge como contraintuitivo imaginar futuros criativos de mudanças, sem as quais, afinal, os seres humanos serão sempre pouco livres?
Fora do nosso controlo moldam-se coletivamente destinos de liberdades ilusórias, enquanto se dança uma dança fora do alcance último do entendimento da mesma.
As próprias tecnologias determinam grandemente a configuração que as sociedades adotarão nos tempos vindouros, até que, algo abrupto, imponha que elas visem criar possibilidades sociais, que não existiam antes, e que, sobretudo, beneficiam os seres.
Com frequência se assiste, de jeito meio desamparado, ao entender das necessidades das mudanças que vão resistindo como podem à ideia de ruturas.
Com frequência se desconhece que esse compreender se acumulou ao longo dos tempos, sobretudo nas mulheres, numa interminável série de descobertas bem representativas, não obstante, a humildade com que foram sempre expostas.
Este saber das mulheres é tão profundo que ainda hoje enriquece as vidas de milhões de seres, mas como é um saber que faz o pão, e lhe dá o tempo do levedo, conhece exatamente a hora da mudança dos ciclos.
Assim, as mulheres, aves afinal que escutavam os voos das aves antes de as conhecerem.
Assim a necessidade de inovação de uma sociedade que, qual ave que antes de o ser soubera cantar, e, em última análise, uma das maneiras de melhor representar a nossa espécie, arroja outras possibilidades sociais que podem fazer surgir muitos dias do sim!
E se tal como aconteceu com a escravatura que foi abolida ao longo da história, se o mesmo acontecesse com as guerras na volta do mundo?
Como é evidente, há várias formas de escravatura e nunca se têm mostrado definitivas, mas os tempos em que as sociedades têm vivido com formas de liberdade não residuais, também não será de esquecer.
As evidências mudam as nossas ideias e, nomeadamente as que se referem às desigualdades sociais. Contudo, não existem muitos pensares escritos sobre o oposto do modelo em que vivemos.
Mostra-se difícil publicar o modo como um escadote pode ser subido ao contrário: de cima para baixo, sem o peso da bagagem que nos ensinou o oposto.
Fazemos silêncio quando os humanos vão contra as correntes tal como acontece nas artes e, porventura esse silêncio equivale a uma falta nossa, no não abordar as questões em perspetiva diversa da habitual.
Na prática, quando mudam as polaridades, os indivíduos registam dificuldades no reconstruir da maioria das ligações expressas pela criatividade.
O grau de confiança que se deposita no ato de criar depende da facilidade com que o mesmo é entendido.
De um modo ou de outro, vive-se aceitando ser membros de um séquito que se descodificou o suficiente para o não contestar em demasia, o que atrai invariavelmente a maioria das pessoas, ditas normais, a uma submissão paternalista.
Todavia, na volta do mundo, as organizações antecipam o colapso, mas não sem que antes, a todos nós-primeiros, tenha sido dada a opção de um outro primeiro passo.
Sendo sempre possível reinventar as nossas liberdades e o modo de nos organizarmos, qual a razão que impede que os nossos quadros de referência sofram metamorfoses?
Os princípios fundamentais podem estar a revelar aspetos da realidade em que vivemos, que ainda têm sido ignorados, como se não tivessem ocorrido eventos, avanços mesmo, nas áreas das ciências físicas, ou nas criações artísticas que já deviam ter implicado uma recalibração da atenção à narrativa convencional da nossa civilização.
Com efeito, continuamos a viver de acordo com conceções, afinal desadequadas, das que levariam a um maior bem-estar da sociedade humana, onde se permanece a registar a escravização, o genocídio, a indiferença face ao sofrimento, como se a única possibilidade de alterar esta terrível forma de obrigar os seres à sujeição, de uma tida por natural desigualdade e infelicidade, não pudesse existir fora das possibilidades de intervenção, que, até hoje não assumimos, e até hoje falhámos.
Afinal de contas, a nossa forma de olhar para o passado, parece concebida ao objetivo de uma mesma interpretação, descuidando contextos.
Quem sabe, se um futuro desconhecido no presente dos dias - se dele quisermos saber como estrada -, não implicará, afinal a recusa dos desfechos inevitáveis das realidades do sofrer que se têm vindo a aceitar, e enfim, seja por aí o início do encher da cova de um dente de Deus.
O silêncio, se lhe dermos o tempo, pode sim, ser tocado também pelos olhos.
Existem nas verdades primeiras o poder tocar e entender o silêncio aprendido pelos olhos.
Silêncio e olhos atravessam muralhas como quem a esse saber chegou com os pais, e outros mundos mais velhos, como o mundo substantivo do pão.
Muitas vezes usamos os olhos como se bastassem para fazer perguntas, e até bastam, de tal maneira que substituem palavras do lado de dentro do nós: as palavras que perguntam e as que respondem.
O silêncio é uma ferramenta terapêutica à qual deveríamos dar mais uso, já que nos permite ouvir e ver os outros com mais atenção e delicadeza.
Também redefinimos prioridades com o nosso olhar para o ajustar ao que importa.
Os olhos acomodam pensamentos e estes ao silêncio dão tempo para compreender Debussy, quando o explica como aquilo que está contido entre uma nota e outra.
Steiner referia-se à arte de fazer silêncio dentro do silêncio, redescobrindo um tempo mensageiro que só o olhar segurava, um tempo carteiro mesmo, como até já afirmara Baudelaire, para quem só os olhos do silêncio, conheciam a primeira dimensão reveladora.
O mar dos olhos de Sophia ou o silêncio dos olhos de Machado de Assis, constituem encontros decisivos, abraços únicos que nos dotam de uma fecúndia tal, que em nós se sonha o que vamos sonhando na verdade.
Os olhos, os olhos também servem para tocar, e é certo que lhes pedimos beijos, muitos mesmo, e quase de certeza castos, na conceção do puzzle.
Não me fugi de ti nem de mim Senhor que de tantas graças me confundiste a paz e isso sei, bem sei, e dessa realidade em mim confusa me culpei e sem carrego que merecesse, enfim, fui aos teus braços um dia para saber de mim.
Estavas tu tão só e tão sonhador
que falhei mal vi a tua feliz dor.
Fiz-me então a um caminho Senhor àquele que se traçaste para mim, não fora ainda assim minha vida percorrê-lo e aqui te digo que, sem dele ter sabido, afinal ou conhecido o ardume, ardume um muito ardume naquele barco de vela areento e nós nele.
Tu, tu em mim qual boda paciente tão comungada tão ar-do-vento.
Eu em ti, tão longe.
Nós.
6.
E tu tu no mundo por Deus pouco ou nada entendeste filho de quem sabias ser - qual mostra de vitória - e logo te deste e sim
fugindo para um jugo mal pressentido a troco de turva e estranha glória.
Agora amor a segurança de nós invicta
quebrou-se.
Ao quinto dia ninguém se espera eis que o reino da ausência subiu tão alto que bandeira, essa, sim, dele, tua