Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
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O espaço abstrato produz, impõe e reforça a homogeneidade social
Na opinião de Henri Lefebvre, as vanguardas modernas, do início do séc. XX, concretizaram novas formas da arquitetura e da cidade mas como sendo uma resposta à economia moderna. Estas vanguardas simplesmente não resolveram a questão do espaço.
Os administradores e os urbanistas fazem do espaço um valor de troca e por isso existe uma tentativa por parte de Lefebvre em reconstruir o espaço, sobretudo o espaço urbano, como um espaço social e orgânico. Lefebvre explica que o funcionalismo moderno elimina qualquer tipo de complexidade. Na verdade, o espaço resulta de uma construção social natural e complexa, baseado em valores, ações, pensamentos, significados e símbolos.
Para Lefebvre, a vida social para existir tem de ter como base um espaço que valoriza o conhecimento e a poesia, o encontro e o símbolo, a informação e os momentos de revelação, a claridade emocional e a presença do ser. Por isso o espaço urbano é por natureza um espaço polifuncional. O indivíduo contemporâneo ocupa à sua maneira o espaço que lhe é oferecido, mas os espaços urbanos modernos só se referem a si próprios e eliminam qualquer possibilidade de intuição e de imaginação. O espaço não pode ser mero contentor de consumo abstrato, deve sim ser um influenciador ativo nas nossas relações e comportamentos sociais, ao trazer heterogeneidade, complexidade e contradição.
Para Lefebvre, a importância e o poder dado ao espaço abstrato trouxe à nossa vida quotidiana uma lógica reducionista, homogénea, plana, fragmentada e invisível. É o espaço abstrato que produz, impõe e reforça a homogeneidade social. É com o passar do tempo que um espaço se transforma naturalmente num espaço social, real e palpável. Um espaço muito regularizado, comercializado e efémero serve somente determinadas e reduzidas necessidades e movimentos.
Lefebvre apela, assim, à urgência de criar uma nova linguagem para o espaço, de modo a afastar-se dos interesses de poder e das estruturas estabelecidas. Os espaços do mundo moderno (por exemplo a auto-estrada e o centro comercial), não foram resultado de intuições e de desejos coletivos que se manifestaram com o passar do tempo, são espaços produzidos tal qual como um bem de consumo corrente, que hipertrofiam uma só função, um só fluxo e um só comportamento. Sendo assim, os espaços abstratos, efémeros, homogéneos e monofuncionalistas são um meio muito eficaz e concreto de controlo abusivo por parte de um sistema vigente.
Em 1972, Henri Lefebvre em entrevista (Régnier, Michel. 1972. “Entretiens avec Henri Lefebvre.” L’Office National du Film du Canada. Youtube.) explica que o período urbano atual ainda é pensado de acordo com os princípios estabelecidos durante o período industrial. Para Lefebvre todas as noções símbolos, ideias, conceitos, práticas e representações deveriam ser repensados para de facto passarmos a um período verdadeiramente urbano.
Os problemas urbanos são problemas mundiais e devem portanto ser atualizados. O espaço urbano ainda não foi na realidade reformado, porque as noções de tempo e de espaço numa cidade ainda estão por desvendar. Sendo assim o espaço segrega-se, a população dispersa-se e todos os elementos da sociedade dissociam-se da vida social. Na opinião de Lefebvre, ainda está por descobrir a solução para a reunião e o encontro entre as pessoas que habitam uma cidade.
Nunca na verdade foi feita uma reforma urbana, tal como aconteceu na primeira metade do séc. XX com a reforma agrária. Marx, Engels e Lenine pensaram que a força mais eficaz que seria capaz de questionar a estrutura da antiga sociedade e assim conceber uma sociedade completamente nova, seria a classe operária e o proletariado e assim se deu a reforma proletária sobre o solo cultivado. Porém semelhante reforma não se deu na cidade.
Para Lefebvre a questão da propriedade do solo construído, do solo da cidade é tão importante quanto a questão do solo cultivado. A cidade precisa de uma reforma urbana, que seja profunda o suficiente para ser capaz de influenciar toda a sociedade e toda a sua estrutura. Para Lefebvre, vivemos numa sociedade de classes e isso está bem visível na forma com a cidade está construída.
A questão da especulação imobiliária tornou-se uma questão preocupante, porque sem mecanismos eficazes de controlo da força do mercado imobiliário e dos interesses instalados, por parte do estado, nunca se irá permitir que nenhum planeamento, por melhor que seja, se cumpra.
Para Lefebvre, grave é sobretudo a questão do solo construído que é ainda e sobretudo controlado pelo capital privado. O solo da cidade é tão importante como o solo cultivado. Sem uma reforma urbana nem arquitetos, nem planeadores sozinhos serão capazes de transformar uma cidade e por conseguinte fazer emergir uma nova sociedade.
Ao mesmo tempo que a sociedade atual se urbaniza cada vez mais, assiste-se a uma espécie de ruralização do fenómeno urbano. Assiste-se a uma assimilação num determinado meio de comportamentos, valores, atividades e atitudes consideradas rurais. Aqui ruralização significa que as pessoas vindas de um meio rural para a cidade não se conseguem adaptar e integrar a nível cultural, social e económico. Simultaneamente assiste-se também a uma reruralização do campo - que contribui para uma maior separação entre a cidade e o campo. Os subúrbios e as periferias não são uma síntese harmoniosa e não ajudam na transição entre estas duas realidades. Segundo Lefebvre, a urbanização da sociedade e a sua simultânea ruralização gerou um processo dialético contraditório.
Ao falar em segregação, Lefebvre refere-se aos espaços particulares que as diferentes camadas e classes de uma determinada sociedade ocupam. Ao estar tudo separado, através do fenómeno moderno da funcionalização, a vida social e pública deixa de existir. Lefebvre explica que no passado as cidades não apresentavam espaços especializados e tinham uma vida urbana intensa - por exemplo a praça do mercado ao apresentar um conjunto de atividades e ao ser polifuncional permitia o encontro entre pessoas mas também permitia a expressão de opiniões e decisões políticas por parte de um ou vários grupos.
Para Lefebvre, um espaço especializado é um espaço morto. A comercialização dos espaços supõe que cada espaço esteja separado para que possa ser vendido e comprado. A especialização do espaço, na opinião de Lefebvre é um fenómeno que advém da divisão do trabalho em parcelas, é consequência de uma sociedade profundamente especializada. Cada espaço de uma cidade atual é preenchido por uma determinada atividade que ocorre num momento preciso do tempo. Se esse momento termina, por qualquer motivo, a atividade perde-se e o espaço esvazia-se. Vivemos, por isso numa sociedade que se constrói através de infinitos espaços fragmentados, isolados e perdidos.
Lefebvre explica que entre 1960 e 1970 foram colocadas ilimitadas esperanças no urbanismo. Durante essa década acreditou-se ser possível fazer do urbanismo uma ciência nova, eficaz e reformadora da vida social. Mas na verdade, o urbanismo por si só, por enquanto, reduz-se a um conjunto de considerações ideológicas e de ações concretas que equilibram uma determinada vontade pública e um interesse privado específico. O urbanismo atual deseja somente a rentabilidade imediata e corresponde a medidas de curto prazo.
Lefebvre adianta porém que não se deve abandonar a ideia de criar uma nova sabedoria ou ciência do espaço, que não se funda através de leis administrativas mas que se gera sim por uma nova longa elaboração da noção de espaço e da noção de tempo-espaço. Esta nova noção de espaço deverá prender-se naturalmente à noção de espaço habitável - e está nas mãos dos filósofos e dos poetas encontrar o verdadeiro significado de habitar. A ideia de espaço como: vivência, presença, memória, multiplicidade, complexidade, permanência, obra de várias atividades humanas, constante relação com um lugar e com o cosmos, materialização de pequenas realidades (onde se pode conhecer e sentir mais, permitindo a construção de diferentes interpretações e pontos de vista diversos acerca da ideia de que se tem do mundo) - é uma ideia poética muito poderosa e poderá reformar a cidade em que vivemos.
“Le Corbusier a cru faire un travail révolutionnaire mais en réalité il a fait le project architectural du capitalisme monopolistique d'état et aussi du socialisme d'état!”, Henri Lefebvre (Régnier 1972)
“(Social) space is a (social) product.” (Lefebvre 1991, 26)
No livro The Production of Space, Lefebvre avança com a ideia de que ao mudar-se a vida e a sociedade, deve inevitavelmente revolucionar-se o espaço. Lefebvre acredita que a pessoa humana comum é um ser social capaz de produzir a sua própria vida, a sua própria consciência e o por isso também produz o seu próprio espaço: “...each living body is space and has its space: it produces itself in space and it also produces that space.” (Lefebvre 2008, 170)
Lefebvre explica que a cidade é a materialização de dois circuitos de capital. O circuito primário diz respeito ao investimento de capital em mão de obra, em materiais e em máquinas de maneira a produzir produtos que possam ser vendidos no mercado e de modo a gerarem lucro que de novo poderá ser aplicado em novos investimentos. O circuito secundário diz respeito aos bens imóveis, ao capital investido em propriedade e no seu lucro. É através destes dois circuitos que se avalia a estabilidade, o rejuvenescimento e o declínio de uma cidade moderna.
Na cidade, na opinião de Lefebvre, o capital é hegemónico. Por isso é o capital que produz o espaço da cidade. O espaço ao ser produto de uma sociedade é necessariamente uma rede de relações sociais - é um produto social. Cada sociedade produz um espaço único, adaptado às suas necessidades e condições.
Na sociedade, os seres humanos produzem espaços sociais. As relações sociais, que são abstrações concretas, não têm existência real, mas existem e concretizam-se através do espaço. O espaço é assim, um produto e um meio de produção. O espaço é tão importante ao produzir o ambiente em que vivemos, porque somos constantemente moldados e influenciados pelo espaço que nos rodeia. O papel do governo é vital na determinação e conceção espacial de uma cidade - ao ter a capacidade para atrair investidores, ao possuir grande parte da propriedade e ao ter a competência legal para impor condições e sanções.
O espaço urbano é assim propriedade daqueles que têm dinheiro e poder. É pensado e concebido por um determinado conjunto de pessoas com determinadas necessidades e vontades mas é de facto vivido e experienciado por outro conjunto de pessoas (o indivíduo comum) que tem de se adaptar e obedecer a regras pré-estabelecidas. Para Lefebvre, o espaço real e vivido é um resultado do concebido e do percecionado. E as ideias dos proprietários e gestores de um determinado espaço nem sempre coincidem com as ideias do indivíduo comum que experiência e que utiliza esse espaço. Existe, por isso, naturalmente uma tensão entre o indivíduo comum e o capitalista. Na opinião de Lefebvre, essa tensão, materializa uma forma de repressão e esmagamento do indivíduo comum pelas classes dominantes.
Espaço é e sempre foi um instrumento hegemónico poderoso. Sobretudo se é a concretização do domínio, da manipulação, da exploração e da influência extrema de um conjunto de pessoas em relação a outro. Apesar de ser criado pelo ser humano, é um produto do poder e o indivíduo comum não tem nunca hipótese de criar o seu próprio espaço. A sociedade moderna só produz assim o espaço requerido e pensado pelo capital e pelo investidor.
‘O desenho urbano, no processo de planeamento, (...) tende a substituir a atitude da prévia configuração integral e instantânea da cidade acabada por uma estratégia no desenhar da cidade que antecipa determinados elementos mais permanentes e espera certos momentos, para se completar...’, Nuno Portas em Planeamento Urbano: Morte e Transfiguração, 1988
Na semana passada foi visto que o modernismo trouxe a demasiada especialização, segregação e o isolamento dos espaços urbanos (habitação, vias, equipamentos e verdes), porém curiosamente defendendo uma totalidade/globalidade da sua composição e realização simultâneas. Para que se possam reunir os elementos, outrora segregados (tentando repor uma certa polifuncionalidade urbana, defendida por Lefebvre) através de padrões urbanos, de senso comum, facilmente transmissíveis - como a rua, a praça, o largo, a esquina, as rotundas, os parques urbanos (e que até podem ser realizados com independência e serem de autores e de tempos diferentes) - deve sobretudo regular-se as fronteiras dos espaços coletivos e dos espaços apropriáveis e privados.
O importante na cidade, sempre foi o traçado no chão, o risco que determina a delimitação (ilimitada) clara do espaço público. Por isso, são precisamente as ruas, as praças, os largos, as esquinas, as rotundas e os parques urbanos que constituem o núcleo estável, duradouro, que garantem a continuidade urbana e que é ‘capaz de suportar a liberdade e oportunidade das interpretações, ao longo do tempo de dos sítios.’ (Portas, 1988)
A cidade sempre viveu e deve sempre viver em função do fator tempo - um espaço urbano pode demorar décadas a consolidar-se e devem ser amplas as margens do seu desenho de adaptabilidade às incertezas e variações do grau de controlo institucional dos processos de edificação. A cidade não se concretiza através de soluções totais e instantâneas. Mas deve tentar, sempre que possível, promover flexibilidade, liberdade de escolha, articulação e continuidade entre as diferenças decorrentes das movimentações sociais, dos variados espaços e tempos de intervenção.
Para Nuno Portas, a incapacidade de responder com um só gesto e uma só solução unificadora, ao crescimento explosivo das cidades, resulta da autonomia relativa de três atos básicos que coexistem e se sucedem sob diferentes formas: a divisão do terreno ou parcelamento; a obra de urbanização e infraestrutura; e a edificação. O instrumento de desenho urbano, que permite articular os dois primeiros elementos é o traçado (que delimita o público e o privado). E a relação entre o traçado e a edificação também não é indiferente, nem arbitrária, porque têm de se encontrar consensos entre ambos através da configuração do espaço coletivo e da tipologia do construído (que agora fica mais reduzido do que em relação à cidade moderna porque tem de conseguir responder a alinhamentos e a uma limitação de alturas).
A reafirmação do espaço coletivo mais contido, contínuo e sem limite volta assim a ser suporte total da edificação. Portas escreve que a identidade coletiva ao retornar a padrões urbanos facilmente transmissíveis, mais sólidos, permanentes e persistentes permite o retorno em força do desenho planeado, relacional, intencional, estimulador e em expansão dos espaços coletivos que se articulam incessantemente com os tipos de edificado.
‘I really love this idea that a utopia should be categorized by the meaningful interactions between people, that a society is “perfect” not because of how well-off the inhabitants are, but because of the happiness they’ve found amongst one another.’, Henri Lefebvre
Henri Lefebvre afirma que o espaço urbano necessita de uma reforma capaz de harmonizar noções de tempo e de espaço e capaz de eliminar qualquer tipo de segregação. Na verdade nunca se assistiu a uma reforma urbana profunda, capaz de influenciar a sociedade, na sua ordem e na sua estrutura. Segundo Lefebvre, o urbanismo tende a ser fragmentário, de curto prazo e de consumo imediato - reduz-se a uma mistura de considerações ideológicas que resultam de um conjunto de medidas administrativas, tomadas entre o poder público e os interesses privados.
Para Lefebvre, o funcionalismo urbano modernista tudo separa. No passado, a cidade apresentava uma vida urbana intensa porque era polifuncional - por exemplo, a praça servia de mercado, de espaço de encontro, de espaço de expressão e de discussão de ideias e até de espaço de decisão política. O modernismo trouxe a especialização e o isolamento dos espaços. O funcionalismo corresponde à divisão do trabalho parcelar cada vez mais específico no conjunto da sociedade - um espaço especializado, é um espaço perdido, pois é preenchido apenas por uma determinada atividade em certo momento.
Como foi visto na semana passada, Lefebvre argumenta que são os gestos mais pequenos e simples do dia a dia que transportam todo o saber do ser humano e essa consciencialização deve ser o centro da sua existência, da sua vida. Como materializar então um espaço que acompanhe esta mudança e que elimine a tendência contemporânea de alienação e da falsa ideia de que a vida do dia a dia é aborrecida e que poderá destruir o ser humano? Mas é preciso não esquecer, que a vida do dia a dia que deve ser valorizada e a que Lefebvre se refere, não é a vida urbana desgastante que se encaixa entre a deslocação - o trabalho - o dormir. É uma vida que valoriza o ser humano como ser pensante (e até mesmo hesitante) que sonha, que se exprime, que está atento aos momentos de revelação, de claridade emocional, de presença do ser e que pode levar a um preenchimento e a uma totalidade. Sendo assim, ao mudar-se a vida e a sociedade, deve inevitavelmente revolucionar-se o espaço.
Por isso, para Lefebvre, o verdadeiro espaço urbano deve ser polifuncional, deve ser um compromisso físico social, cheio de significado, entre habitantes que vivem integrados numa rede interminável de relações, num determinado tempo e num determinado espaço.
Lefebvre, na verdade, pensa que os urbanistas e os arquitetos deveriam refletir mais sobre o que é um espaço habitável. Se na vida urbana se assiste a um desaparecimento do conceito espacial de habitar poderá paralisar-se o conhecimento e a imaginação do ser humano. Lefebvre deseja acreditar que o reencontro com o verdadeiro sentido do habitar poderá ser descoberto e resgatado através da poesia e da filosofia.
O espaço urbano deverá assim ser concreto e não absorto. Deverá ser um influenciador ativo nas relações sociais. Deverá ser uma centralidade que faz coincidir o espaço do pensamento, com o espaço vivido, com o espaço percecionado e com o espaço concebido. Deverá promover a heterogeneidade, a integração, a subjetividade, a criatividade e o divertimento. Lefebvre propõe acima de tudo criar um espaço urbano através da intuição humana mais próximo do sujeito e não através de uma mente altamente treinada, lógica e abstrata.
Uma mudança social só poderá vingar se o espaço onde vivemos nos permitir a liberdade de apropriar e de manipular - Lefebvre afirma mesmo que poder sobre o espaço é poder sobre a vida! E talvez seja através da presença física e do corpo que experiencia, que poderá concretizar-se a reforma urbana que se anseia. O corpo do ser humano é vibração, é frequência, é energia e está em constante comunicação com as energias que o circundam - tudo se transforma e influencia mutuamente numa relação constante (todas as vidas e todas as suas formas se intersecionam perpetuamente, como num fluir interminável). O corpo é o espaço físico último capaz de juntar espaço e tempo. Quanto mais liberto o corpo, mais presença e expressão física terá - mais facilidade haverá para que se crie uma nova linguagem espacial apropriada e múltipla. Quanto mais participado, mais heterogéneo, mais complexo, mais polifuncional for o espaço urbano, onde se desenrola a vida, mais adequado será para que o ser humano seja total.
'The meaning of life is not to be found in anything other than that life itself.', Henri Lefebvre
Henri Lefebvre em 'Critique of Everyday Life' escreve que é na vida real, na vida de todos os dias que a pessoa humana (corpo e espírito) encontra o verdadeiro significado da sua existência.
A ânsia de evasão da realidade concreta, o desejo de construção de uma outra vida (baseada na nostalgia pelo passado ou no sonho por um futuro super-humano) pode trazer a desumanidade mais extrema.
'Our search for the human takes us too far, too deep, we seek in the clouds or in mysteries, whereas it is waiting for us, besieging us on all sides.', H. Lefebvre
Ao abandonar-se o mundo obscuro da metafísica e a profundidade inatingível da vida interior, o ser humano poderá descobrir a imensa riqueza que, o mais humilde facto do dia a dia, contém. As descobertas científicas mais avançadas podem surgir do interesse pelo insignificante.
Lefebvre afirma mesmo que são os factos e as coisas mais familiares que nos abrem ao desconhecido e são os verdadeiros contentores de vida - não misteriosa ou mística, mas real.
A vida de todos os dias tem de ser vivida (com grande entrega) conscientemente no seu mais íntimo e nos mais repetitivos detalhes - só assim a existência será mais humana e haverá mais humanidade. E é através do desenvolvimento das condições humanas, quotidianas e reais, que se pode construir a pouco e pouco uma existência utópica concreta.
O dia a dia é o espaço palpável onde a vida de cada indivíduo ocorre e que fica por entre todas as atividades mais repetitivas, fragmentadas e mínimas.
Os detalhes contém em si toda a realidade da vida humana mais sincera - palavras, gestos, movimentos, pensamentos, ações.
'We have learned how to perceive the face of our nation on the earth, in the landscape, slowly shaped by centuries of work, of patient, humble gestures. The result of these gestures, their totality, is what contains greatness.’, H. Lefebvre