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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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PEÇAS POLÍTICAS E DE POLÍTICOS NO SÉCULO XX


Nesta altura de passagem de ano, e tendo em vista as mudanças radicais que ao logo do século XX se foram efetuando entre nós (e não só...) é interessante evocar aqui algumas intervenções dramatúrgicas de autores que marcaram a política, designadamente tendo em vista as mudanças profundas que entretanto ocorreram. E isto, destacando o conservadorismo que, como bem sabemos, marcou o longo período do então chamado Estado Novo.


Nesse sentido, desde logo assinala-se que alguns dos mais relevantes interventores da vida política nacional antes de 1974, no regime e na oposição como na época se classificava, exerceram também, ainda que esporadicamente, atividades de criação artística-dramatúrgica. As referências breves que aqui fazemos integram-se pois nessa evocação histórico-político-dramatúrgica.


E começamos pelo mais inesperado...


Com efeito, o próprio Oliveira Salazar é autor de pelo menos uma peça histórica a que chamou “Egas Moniz”.


Mas em contrapartida, digamos assim, Humberto Delgado é autor de pelo menos quatro peças: as radiofónicas “28 de Maio”, “A Marcha para a Índia” e “Mariana Alcoforado ”e ainda “Asas”.


Seria interessante recuperar estes textos, para ver até que ponto uns e outros consubstanciam as posições políticas, assumidas antes e depois.


Num plano distinto no que respeita à dramaturgia, encontramos uma lista de peças escritas por Henrique Galvão.


Temos desde logo sintomaticamente uma peça datada de 1932 e chamada precisamente “Revolução”. Ora é interessante assinalar que se trata de um texto marcado por uma vocação africanista em si mesma coerente com a intervenção política do autor. E é também interessante recordar que Galvão escreveu ainda pelo menos mais duas peças de temática africana: “O Velo de Oiro” (1936) e “Colonos”(1939).


E citam-se ainda mais diversas peças de Henrique Galvão: “Como se Faz um Homem” (1935), “Farsa de Amor” (1935 - em colaboração com Carlos Selvagem), “Comédia da Morte e da Vida” (1950) e “Um Caso Raro de Loucura” (1950), esta preconizando já, na crítica social e política inerente, o corte com o regime que se iria concretizar.


Ora, será também oportuno referir que o teatro de Henrique Galvão levantou reparos no que respeita à sua qualidade: e isto, sem qualquer preconceito de ordem política.


Luiz Francisco Rebello, na “História do Teatro Português” põe reservas à dramaturgia de Galvão. Evoca “A Farsa”, “Revolução”, e uma versão cénica do seu romance colonialista “O Velo de Oiro” e uma sátira de costumes de título e projeto ambiciosos mas de realização frustre, “Comédia da Morte e da Vida”...


Acrescentaremos que Henrique Galvão colaborou em “Farsa de Amor” (1950).


Ora bem. Dada a natureza e as implicações do espetáculo teatral, mais se registam intervenções criativas ou críticas no teatro português.

 

DUARTE IVO CRUZ

50 ANOS DA MORTE DE HENRIQUE GALVÃO

Henrique_Galvão_1934.jpg

 

Sem de modo algum pretender misturar esta análise teatral com outras opções, parece-nos adequado assinalar o teatro de Henrique Galvão (1895-1970) precisamente nos 50 anos da sua morte.

Independentemente de considerações de ordem histórico-política, importa efetivamente realçar, a propósito, a convergência e confluência de criações no plano teatral, numa abordagem genérica que de facto marcou a transição e modernização do teatro português a partir das tradições que vinham dos séculos anteriores, e que se generalizaram, e isto independentemente de quaisquer opções estéticas.

É de sublinhar que Luiz Francisco Rebello, na “História do Teatro Português” (1967), assinala designadamente uma peça escrita em colaboração com Carlos Selvagem, “A Farsa do Amor”. E cita esta colaboração referindo ainda mais três peças de Galvão: “Revolução” (1932), “O Velo de Ouro” (1936) e “Comédia da Morte e da Vida” (1950), “sátira de costumes de título e projeto ambicioso mas de realização frustre”, assim mesmo escreveu Rebello na “História” citada.

Mas mais se acrescenta que Rebello, no livro que dedicou a “100 Anos do Teatro Português (1880 - 1980)” publicado em 1984, cita com grande destaque a estreia da “Comédia da Morte e da Vida” no Teatro Nacional em 10 de maio de 1950. E remete para uma análise crítica que na época Armando Ferreira publicou, logo depois da estreia.

 Aí se lê que se trata “talvez da sua melhor peça de teatro, vista sob o lado da carpintaria teatral, de perfeição homogénea de caracteres e até a que melhor demonstra a observação fria do autor e o seu desejo de marcar com o ferrete da desaprovação pública uma sociedade hipócrita, egoísta e amoral”. Isto, note-se, publicado no Jornal do Comércio de 13 de maio de 1950!

Por minha parte, destaquei na “História do Teatro Português” (2001) precisamente a peça “Revolução”, referindo sobretudo (e cito) a capacidade de transladação, no segundo ato, do ambiente e da dinâmica passada obviamente na rua. E acrescentei que a peça ainda hoje se lê com agrado, pela engenhosidade de um conflito político e sentimental.
E em “Repertório Básico de Peças de Teatro” (1986) saliento sobretudo a fidelidade à corrente realista do nosso teatro dos anos 30.
Refiro mais duas peças de Henrique Galvão evocativas da temática africana: “O Velo de Ouro” (1936) e “Colonos “(1939). E mais acrescento que a “Comédia da Morte da Vida” (1950) envereda por um realismo teatralmente confuso, à volta de uma situação violenta que de certo modo se retoma em “A Mulher e o Demónio” (1950).

Independentemente pois do cinquentenário da morte de Henrique Galvão, o seu teatro merece projeção, pela qualidade e atualidade.

 
DUARTE IVO CRUZ