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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

OS GURUS DOS INTERESSES PESSOAIS

 

Teremos ajuda nas nossas necessidades se falarmos a quem as possa ajudar a eliminar, transmitindo-lhes com exatidão, quais as vantagens deles, nesse ato, já que a perseguição do interesse pessoal é a grande motivação para que tenham lugar eventuais ajudas, e apenas terão lugar essas ajudas, desde que guiadas pela maximização do interesse pessoal e não pela solidariedade, pela humanidade, pela generosidade, pela justiça, pela humanidade.

 

Mas as moscas, esta espécie de moscas infetadas que habitam o termo da história, minam ininterruptamente e de há muito, o último jardim cujos moinhos e canaviais contribuíam à distribuição das aguas de beber, e, por ali a origem fenoménica do Conhecimento enraizava-se na sua historial origem, uma origem, diria, anterior ao Pensamento ligada aos seres do porvir e do antevir que comungavam uma pululante vida, sem entropia, nem termo, nem destino inquieto, nem nirvana: apenas e bastante multiplicação de valores, de enigmas, de questionares que afinal poderiam conciliar o homem nas somas que abusam, e vão ao limite das possibilidades, e tal era sempre a nossa opção sem cansaço.

 

E os coletes amarelos e roxos e pretos e brancos, cor da súmula das cores, não surgem, parece-nos, como flores da ideia de Deus cujas emoções desamparadas no mundo os fazem acolher nos braços, essa emoção, e por ela lutarem. Diria sim, que também os coletes dos muros todos do mundo, parecem apenas ter como função equiparar preços de escravatura imperecíveis nas balanças dos gurus dos interesses pessoais, que vão admitindo existir, e bem sabem ser esse caminho da luta forte e vencedora pela eternização deste novo estar visível de há muito.

 

Mas os coletes também são sons primordiais de uma razão, de um lancinante grito que cresce apalpável na dor e na esperança.

 

Afinal estamos lançados num mundo no qual quanto mais nos debatemos mais nos enredamos na teia preparada a nos tolher; e a grande aranha ali nos deixa, ela, intocável, transparente mesmo, qual predador perfeito que apaga o caminho sem qualquer rastro.

 

E nós? Ficamos a esperar por paradoxo?

 

A economia do equilíbrio que tanto desejávamos casada com a filosofia moral se, incorreta, face ao princípio do seu comportamento por interesse pessoal, é causadora da deficiência consumada e sem retorno do pobre cada vez mais minguar e do rico medrar nicho a nicho numa existência facilitada.

 

Que eu saiba os sonhos também se aproveitam dos materiais de cada dia vivido, então pergunto: onde e como enfrento o pouco ou o nada desses dias que coincidem com os fins dos tempos? E como as sobremaneira arrogantes, ditatoriais, populistas, ignaras, são representantes do mando no mundo, mesmo que bastardas da condição humana?

 

Cada vez mais os viventes de superior razão e exemplar sentido são tratados, quanto muito, como silhuetas, e mesmo que tenham forma e dor de homens, a grande Coisa Absurda despe-os até que o senso se esvaia.

 

Depois, depois quando não se saiba já que ideia têm os outros de nós, que ideia poderíamos ter dos deuses e eles de nós, querem-nos fazer crer que é tempo de subir às arvores que existam, e, por lá deixarmo-nos cair bem fundo nos mediterrâneos do mundo, e tudo sem vergonha assumindo a irredenção da culpa.

 

Doravante as guerras e as torturas serão arbitradas entre medo e esperança devidamente codificados, sendo que poucos foram os que até aqui questionaram sequer se alguma vez tinham questionado.

 

A consciência faz-se densa e incendeia-se e descreve um círculo sobre um céu desbotado. Receia-se que ela, abutre, vagueie com algo ligado à morte ou aguarde em desmaio, um estado de rascunho perpétuo, por muito que queira acreditar nas realidades com unidade e sentido que lhe salvarão o coração de tão potentes e famintas aves negras.

*

Agora deixem-me, vou sozinha. Um qualquer inseto espera-me. Ou tenho-te a ti, no colo, na amizade dos meus joelhos.

 

Teresa Bracinha Vieira