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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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DEVES ORAR POR UMA VIAGEM LONGA…

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TU CÁ TU LÁ

COM O PATRIMÓNIO

Diário de Agosto * Número 26

 

Konstantinos Kavafis (1863-1933) escreveu sobre Itaca um dos poemas mais célebres da cultura moderna. A metáfora da viagem surge como a representação da própria existência. A procura e a descoberta, a atenção e experiência – tudo nos surge como uma procura permanente de sentido. “Que sejam muitas as manhãs de Verão, quando, com que prazer, com que deleite, entrares em portos jamais antes vistos!”. A versão que aqui apresentamos é da autoria de Jorge de Sena e constitui uma peça fundamental da poesia portuguesa. Só um grande poeta pode ser tão fiel ao espírito de Kavafis. E é o Mediterrâneo que aqui se encontra bem presente. Naturalmente, lembramo-nos perante este poema da amizade fecunda entre Sophia e Sena. Mais do que uma amizade, há uma fidelidade muito funda às raízes comuns da nossa cultura – encruzilhada de influências, Oriente e Ocidente, Sul e Norte, céu e mar… Ulisses é um símbolo que nos une – a paixão temperada pela medida. Ah! Importa reler ininterruptamente este poema. Todos vamos regressando a Ítaca. E o tema não pode ser mais português. Temos o gene de Ulisses dentro de nós… E não esqueço o especial afeto que o Alberto Vaz da Silva tinha para com este poema…

 

«Quando partires de regresso a Ítaca,
deves orar por uma viagem longa,
plena de aventuras e de experiências.
Ciclopes, Lestrogónios, e mais monstros,
um Poseidon irado - não os temas,
jamais encontrarás tais coisas no caminho,
se o teu pensar for puro, e se um sentir sublime
teu corpo toca e o espírito te habita.
Ciclopes, Lestrogónios, e outros monstros,
Poseidon em fúria- nunca encontrarás,
se não é na tua alma que os transportes,
ou ela os não erguer perante ti.
Deves orar por uma viagem longa.
Que sejam muitas as manhãs de Verão,
quando, com que prazer, com que deleite,
entrares em portos jamais antes vistos!

 

Em colónias fenícias deverás deter-te
para comprar mercadorias raras:

 

coral e madrepérola, âmbar e marfim,

 

e perfumes subtis de toda a espécie:
compra desses perfumes o quanto possas.
E vai ver as cidades do Egipto,

 

para aprenderes com os que sabem muito.
Terás sempre Ítaca no teu espírito,

 

que lá chegar é o teu destino último.
Mas não te apresses nunca na viagem.
É melhor que ela dure muitos anos,
que sejas velho já ao ancorar na ilha,

 

rico do que foi teu pelo caminho,
e sem esperar que Ítaca te dê riquezas.
Ítaca deu-te essa viagem esplêndida.
Sem Ítaca, não terias partido.
Mas Ítaca não tem mais nada para dar-te.
Por pobre que a descubras, Ítaca não te traiu.
Sábio como és agora,
senhor de tanta experiência,
terás compreendido o sentido de Ítaca».

 

   Agostinho de Morais

 

 

 

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A rubrica TU CÁ TU LÁ COM O PATRIMÓNIO foi elaborada no âmbito do 
Ano Europeu do Património Cultural, que se celebra pela primeira vez em 2018
#europeforculture