Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
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'Decay, disorder and conflict do not seem as predictable in environments of such visual clarity.', Otis Stevens and Mcnully
No livro 'World of Variation', de Mary Otis Stevens e Thomas Mcnully, lê-se que a cidade como conceito é muitas vezes descrita como sendo uma simples rede de comunicação. Como uma máquina ideal para acomodar uma conglomeração de necessidades físicas e psicológicas, ou como um determinado organismo composto por pessoas, veículos, edifícios, parques e meios de ligação.
As cidades com população mais elevada, densa e heterogénea, são ainda pensadas como cidades ideais e alguns estudos de planeamento preveem, num futuro próximo, áreas metropolitanas com 25 a 50 milhões de habitantes.
'To allow for time - time as a form that the future fulfills - is one of the new tasks of the architect and planner. Concern for the future, however, involves memories of the past and ideals of the present. As a race, men seem to display an inherent desire for permanence, to hold onto the minute that is passing, to preserve the environment that is changing.', Otis Stevens and Mcnully
Apesar das diferenças óbvias entre as sociedades estáticas do passado e a mobilidade e constante mudança dos padrões de vida tão característicos do presente, a geometria podem ainda ser um instrumento útil para visualizar situações conceptuais e sócio-culturais. Ao aplicar-se a geometria, nos dias de hoje, não é necessária a rigidez dos conceitos de outrora, mas utilizada como uma abstração pode estimular novas ideias.
Segundo Otis Stevens e Mcnully, as condições da vida atual pedem por um novo desenho urbano, que inclua constante crescimento e mobilidade contínua. Assim, surge a sociedade linear como conceito ideal.
A sociedade linear é uma resposta abstrata a emaranhados urbanos insolúveis e a crescimentos formais desmedidos. Na verdade, pretendem-se resolver todas as excessivas justaposições, de qualquer sociedade contemporânea, que deterioram a qualidade vida do homem. Nestes termos, a cidade deixa de ser uma forma visual e social isolada. A proposta empenha-se em organizar uma nova sociedade, que inclua e agregue várias e diferentes nações. A sua principal preocupação é articular mudanças de atividade, escala e topografia, tanto de regiões rurais como de concentrações urbanas.
'One can imagine feeling an ease, a pleasure, from understanding the relationship between activities as one moves through the distinct, expressive environments evolving on the different growth lines.', Otis Stevens and Mcnully
Embora a ideia de sociedade linear seja intuitiva, nas últimas décadas de explosão demográfica, o conceito foi-se tornando gradualmente mais concreto. É uma forma de organização social, não só imaginária, mas um padrão bem vísivel e real de fixação humana. Consiste num movimento de várias faixas de atividade que correm paralelas e sempre contínuas. Esta forma linear é capaz de lidar com as pressões de expansão produzidas por sociedades industriais avançadas e pode absorver as suas escalas e densidades urbanas de maneira ordenada e mais humana. É uma solução inerentemente supranacional. A geografia iria também influenciar a sua definição - sobre montanhas ou sobre o mar a forma linear iria quase desaparecer e em regiões ainda não desenvolvidas as linhas de crescimento poderiam ser simplesmente um direito de passagem que poderia modelar surtos de atividade futura.
A sociedade linear indica um planeamento a longo prazo, com o resultado de que áreas urbanas remotas deixariam de existir.
'One perceives inhabitants of such a society becoming visually oriented so that in time they see the abstract patterns created by the daily associations, and as a result develop environments sensitive to the tempo of movement and constantly changing scales of social relationship.', Otis Stevens and Mcnully
A Casa Lincoln e o movimento livre do espaço construído.
'The curves were throwing you out rather than holding you in. Each projected its energy into nature. We used the invisible power of the concave walls to relate the building beyond its site to the woods and fields of rural Lincoln — and beyond to the universe itself.', Mary Otis Stevens
Em 1965, a casa Lincoln, em Massachussets estava completa. Mary Otis Stevens (1928) e Thomas F. McNulty (1919-1984) conceberam este projeto único e experimental com o objetivo claro de aproximar o interior e o exterior, e eliminar a tradicional divisão doméstica, que separa as zonas sociais das zonas mais privadas.
Tal como Charles e Ray Eames, também o casal Stevens/MacNulty se propôs conceber uma casa para a sua família de maneira a viver e trabalhar num mesmo espaço.
A singularidade da casa Lincoln é construtiva, formal e social.
Construída com betão à vista, traz à memória obras de Le Corbusier, Smithsons, Giancarlo di Carlo, Louis Kahn e Paul Rudolph.
A cor do betão varia do branco a diversos tons de cinzento: 'The variation in the wall was closer to that of stone. It had highlights. It was very natural looking, not uniform like normal concrete.', Mary O. Stephens
Ao usar o betão, Stephens revela que houve uma vontade em alcançar um efeito semelhante à arquitetura grega e romana - porque relaciona a estrutura monolítica com a escala humana. Cada uma das paredes curvas é um elemento independente, e liga-se a outra parede através de um painel de vidro.
Formalmente a casa desenha-se através de sucessivas concavidades que envolvem a paisagem. O propósito das curvas, segundo Stephens, concretiza o desejo em criar um ambiente extrovertido. O objeto construído pretende alcançar e fazer parte da ordem natural do lugar. As curvas não são regulares e variam em comprimento e abertura - de modo a prevenir fechamentos e a permitir que se estendam indefinidamente na paisagem.
Como se de uma escultura viva se tratasse, Buckminster Fuller chegou mesmo a afirmar que a Casa Lincoln é o negativo do seu próprio positivo.
No entanto, o interior da casa contém também intencionalmente zonas introvertidas:
'In our daily living, we wanted experiences of both kinds - the inner and the outer life. The play and living areas were strongly tied to the outside. On the other hand, in the most private parts of the house - the sleeping areas, studio, and the library - the architecture reflected the need for intimacy.', M. O. Stephens
A procura pela intimidade explica movimentos e transições no interior, tal como acontece nas casas de Frank Lloyd Wright. Stephens concebeu a casa Lincoln como um microcosmos que associa intimidade a ideais de democracia, igualdade e liberdade. Cria-se assim uma nova definição para a vida doméstica, e por conseguinte para toda a vida em comunidade (nomeadamente a vida urbana), que associa espaços de movimento a espaços de hesitação (que promovem encontros nas intersecções). Por exemplo, o longo corredor que liga o quarto das crianças ao resto da casa, incentiva o fluir e a ligação livre e ininterrupta. Mas os pontos de intersecção do corredor com a entrada, com a sala de estar, com a sala de jantar e com as escadas que ligam ao quarto dos pais, são designados por pontos de hesitação, onde há possibilidade de escolha.
A casa não tem portas, só aberturas. Desenha-se através de uma constante continuidade entre os vários espaços do interior e entre o interior e o espaço exterior. Esta extrema mobilidade imparável permite ao homem deslocar-se em diferentes direções e caminhos, tal como acontece na cidade.
'You needed to keep moving in order to take it all in. The inherent movement in the curvilinear geometry kept pushing you dinamically through the space, rather than confining you to one vantage point. You might want to be in the extroverted piazzas, you might want the introverted spaces of the side streets. The important thing is that you have the chance to choose.' Mary O. Stephens
Ora, Stephens e McNulty sempre se interessaram pelo design como um meio com fins sócio-culturais - este interesse coincide com a exploração teórica que sempre acompanhou o desenvolvimento dos seus projetos mais inovadores. A investigação de Stephens e McNulty culminou com a publicação, em 1970, do livro 'World of Variation' - os diagramas apresentados neste livro têm propósitos simultaneamente formais e sociais. E sobretudo existe uma forte vontade, na sua obra teórica e construída em encontrar o equilíbrio ideal entre a liberdade e a intimidade, entre o movimento e a hesitação, entre a individualidade e a comunidade.
'What we were interested in was not just movement per se. We wanted to make the house into a kind of miniature city. It was very urban. The idea was to bring people together, not isolate them in boxes on different floors. You had choices all the time.', Mary Otis Stephens