Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

AS DUAS POLÍTICAS NACIONAIS

  


António Sérgio incluiu no segundo volume dos Ensaios (1929) a conferência proferida em 1925 em Lisboa com o título desta crónica e que tem constituído tema para muitos debates e reflexões no último século. Afinal, tratava-se de discutir as razões do nosso atraso. É um tema recorrente, que não pode, porém, ser alvo de simplificações. As nossas dificuldades ancestrais não podem resumir-se a uma causa, a um tempo ou a alguns protagonistas. Portugal sempre foi uma sociedade complexa e por isso coexistiram ao longo dos tempos razões várias, positivas e negativas, a determinar a nossa evolução. Na célebre conferência referida apontava-se a contraposição tornada célebre entre Fixação e Transporte, obrigando a uma leitura atenta capaz de associar uma cópia de razões que se completam e que até, por vezes se contradizem. Nas duas escolas encontramos “a política da Produção e a Política da Circulação; a política da Agricultura e a política do Comércio; a política nuclear e a política periférica; a política de D. Pedro e a política de D. Henrique; a política da boa capa e a política do mau capelo”. Contudo, o ensaísta não se ateve a ideias exclusivistas, porque a faina da periferia, “a corrente vital do exterior para o interior, ou centrípeta”, seria mórbida e extenuante se não fosse “forte e regular a vitalidade do seu núcleo, e saudável a corrente que vai de dentro para o exterior, ou centrífuga, na lida económica de Portugal”. No fundo, dizia Sérgio, “se não descobrisse o Oriente, falharia a nação o seu papel”. Mas cumpre reconhecer que realizámos obra muitas vezes em condições depauperantes – e assim se compreende a voz crítica de Camões, “com o maior prestígio nas falas do Velho do Restelo – timbre da honra, do saber, da experiência, da autoridade”. E quando lemos os economistas do séc. XVII como Luís Mendes de Vasconcelos, Severim de Faria e Duarte Ribeiro de Macedo compreendemos a importância da proteção e do fomento da riqueza nacional na agricultura e na indústria e num plano de hidráulica… Uma base europeia sólida defendida pelo Príncipe Perfeito, na linha de seu avô materno, o Infante D. Pedro, merecia a melhor atenção, para que o Transporte não destruísse a Fixação. A leitura de textos antigos obriga, porém, a muito cuidado para evitar as análises apressadas assentes nas referências impressionistas desta ou daquela medida nos últimos séculos.

Eis porque as explicações sobre o atraso português exigem séria ponderação.     

A complexidade tem sempre de ser considerada (com atenção especial à educação e ao conhecimento), como tem ensinado Jaime Reis. “O atraso económico, a falta de desenvolvimento social, o baixo nível de urbanização, mesmo a formação religiosa dominante poderão eventualmente constituir razões para a lenta alfabetização de todo o conjunto de países do Sul da Europa. Não servem contudo, como elementos diferenciadores do caso português relativamente aos demais membros deste conjunto, demasiado parecidos com Portugal nestes aspetos para se encontrar neles uma interpretação convincente para o nosso comportamento diverso em termos educacionais” (O Atraso Económico Português 1850-1930, INCM). De facto, a complexidade leva-nos a ter de compreender que qualquer decisão de política pública, em especial com relevo para a educação, a cultura ou a ciência, que tudo condicionam, tem sempre um cariz fortemente económico, sendo consensual e durável. É preciso assim mobilizar os meios humanos e materiais adequados. A consideração das políticas nacionais exige, portanto, a compreensão de que o atraso não pode ser uma fatalidade, e de que são indispensáveis a concertação, o planeamento, a accountability e a rigorosa avaliação de resultados (com critérios comummente aceites). Nos diversos campos referidos estão as razões do atraso, mas também a indicação do começo dos remédios para delas nos libertarmos.    


GOM