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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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PORTUGUESES NO JAPÃO

  


Luís Filipe Thomaz apresentou no Museu de Arte Antiga o seu livro Nanban-Jin – Os Portugueses no Japão. A curiosidade está no olhar de muitos. Simbolicamente junto da mesa onde se vai falar do livro, estão reproduzidos dois biombos Nanban do Museu onde se encontram imagens cheias de humor e realismo, nas quais os portugueses, acabados de chegar ao país do sol nascente, são representados de um modo caricatural, com os narizes longos, ora em exercícios rocambolescos, ora em equilíbrios impossíveis, algumas pessoas de cor negra, indumentárias largas e circunspectas, óculos para o sol, um burro, um elefante… Os recém-chegados causam espanto nas atitudes, nos costumes e nas artes de que são capazes. E Luís Filipe Thomaz diz-nos: “os Portugueses de Quinhentos nem eram, como por vezes se tem dito, candidamente admirativos de tudo quanto achavam, por esse mundão de Cristo, como se fossem desprovidos de qualquer escala de valores; nem, como em contrapartida se tem insinuado, etnocêntricos, fechados às demais civilizações e fanaticamente alérgicos, fechados a quanto não fosse cristão. Do Brasil, ainda neolítico, à China de civilização requintada e milenar, passando pela África bárbara e pela Índia mística, foram, aliás, tantos e tão diversos os povos com que lidaram que dificilmente poderiam deles colher uma impressão uniforme. De uma maneira geral, admiraram nas outras gentes os traços que mais os surpreenderam e as qualidades que mais em sintonia lhes pareceram com os seus próprios ideais e valores: no Brasil e na África a simplicidade ingénua dos nativos, na Pérsia a formosura das mulheres na Ásia do Sul e Sueste a piedade dos ascetas búdicos, na China a perfeição da máquina administrativa. Foram sem dúvida os japões o povo que globalmente considerado, lhes mereceu maior admiração”. E, em contrapartida, temos de lembrar, como o faz o prefaciador da obra João Paulo Oliveira e Costa, “no Japão, os portugueses são famosos e queridos porque os seus antepassados foram responsáveis pela descoberta do mundo pelos nipónicos”. E num mundo de pequenas singularidades luso-nipónicas – a introdução da espingarda pelos portugueses resolveu uma longa guerra civil e possibilitou a centralização política, enquanto foram os portugueses que introduziram a religião cristã no país, sob o impulso de S. Francisco Xavier, merecendo destaque a experiência dos cristãos escondidos, exemplo raro de permanência na fé.


O livro inclui duas partes, uma primeira, de Sagres a Tanegaxima, e uma segunda sobre os portugueses no Japão. Na primeira, temos a lenta aproximação de dois extremos, começando pela pré-história da expansão lusitana, juntando os ingredientes da Reconquista e da Cruzada, incluindo os primeiros passos da aventura expansionista, a política ultramarina de pendor mercantilista de D. João II, a dobragem do Cabo, o imperialismo messiânico manuelino, a criação do Estado Português da Índia, a queda de Albuquerque, o governo frouxo de Soares de Albergaria abriram campo  à mercancia, o golpe de 1518 e a nomeação de Diogo Lopes Sequeira ainda deram esperanças ao imperialismo, mas a consideração da China determinou o canto do cisne do imperialismo manuelino, antecipando as mudanças do reinado de D. João III. Estamos, assim, perante um processo complexo e longuíssimo da história da Humanidade, que na expressão do autor não deve ser confundida com a história do colonialismo. De facto, desde o século XVI, o império evoluiu de acordo com os estímulos locais e regionais mais do que por via de um planeamento central. Luís Filipe Tomaz assume um modelo interpretativo moderno de cariz globalizante, assente na complexidade, livre das amarras de quem não se dá conta de que o mundo não se explica apenas por uma visão eurocêntrica baseada na lógica colonialista dos descobrimentos. Um apaixonante modo de compreender a História sem preconceito.   


GOM