28.
Aberta a história
Espreitam-se os sonhos da humanidade
Ou do seu aniquilamento
Aberta a história
Não se descortina sequer a sua cronologia
Pensa-se então no fazer de novo
Como se na anterior história que espreitámos
Não tivesse havido um antes
Posto que não ouvimos nem lemos
Uma linguagem que o exprimisse
Então, dizia-se, abre-se uma nova história
Dotada agora, da vitória, logo no início
De nela se deixar ver uma absoluta liberdade
E eis num crescendo a lente baça do homem desvinculado
Do desafio do amor
Tão perto de nós e tão dentro do oráculo
Eis-nos de frente para o homem que desconheceu
O fascínio
Ou a tragédia do perdão
O caminho de Cristo em Deus
Ou o poema de Régio
Fechado na sua mão
Exposta e imitada a história
Ali
Numa idade de oiro seco
Que se contenta
Infinitamente
Em se deixar ver
Naquele vazio criador
Embrutecido em vícios isentos de méritos
E eis o homem na nova história
Aquele mesmo que mente sem respeito
Por si próprio
Aquele mesmo que é perito no governo
Do desprezo julgando ser poder
Desconhecer o seu buril
Nem tendo ouvido falar
Da escada que se chega às longas viagens
Da identidade do socorro
Socorro que enfim, desiste
Abraçado ao descompromisso
De conhecer que o mundo ou a história
Não são enganos
M. Teresa Bracinha Vieira
2015
27.
São submissas as palavras, sim
São
Não as leste tu conforme
Teu coração?
São submissas as palavras, são
Senhoras do inteiramente impossível
Com que se dão
À espera do mundo as ler
Numa travessia de interpretação
Permitida
A quem ousa ou não
Levá-las
Às travessias
A oeste do destino
Lá onde o significado do momento
Ou do eterno
Num haver-se realizado por várias formas
Vive num arquipélago a sul do equador
Do amor errante
Até ser tempo
Para de novo abrir os olhos
E esclarecer-se na esperança
De arder lenha, despedidas e segredos
Sonhando e crendo
Não serem submissas
As palavras
Com que ainda hoje te escrevo
Meu cupido não puro
De tão amado
Que nem o céu te quis na expedição
Das inexactidões
Aquelas tão inebriantes
De verdades
Aproadas
Conhecidas
Das palavras submissas
Ou não fossem caravelas
De dias e anos consentidos
Por correntes que atrás não voltam
Para não naufragarem mais amores
Na viagem
Naquele périplo
Em que há que tomar uma outra via
Da vida
Mesmo lhe não dando inteiro crédito
E volto a dizer-te, vem
Vem sem derrotas
Ler
A terra firme
Das palavras submissas
Indícios de muitas pressas
É certo
Mas testemunhas das léguas precisas
Ao título
De um poema
M. Teresa Bracinha Vieira
2015
26.
Acendeste a fé no centro
Do teu próprio lar onde vivias
Tua pátria, tua arma singular de protecção
Deixando aberta a janela
Por onde só eu te via
E o beijo abraçado se estendia
Escada
Até aos teus braços
Nos meus
Quais prémios de iguais dons
Excelentes no esclarecer-se e no oferecer-se
E assim acesos
A escuridão calava algo sagrado
Pois que não fora culpa tua eu não ser princesa
Nem tu príncipe sem parte, par ou reino
Ainda que resolvido
No propósito e firme efeito
Que tão pouco
Era possível
Na base deste erro colossal
Na base do contra nós pelejarmos
Em fúria extrema e magoada
Jeito de cerco que não consente ser sujeito
Quando o prazo
O prazo
É só troco
De um olhar inacabado
Longo canto
M. Teresa Bracinha Vieira
2015
25.
Foste nomeado glória
No tempo de tu em nós
Tanto me amares
Sem receios
De cessar o depois cuidando
Do inevitável onde já não morarias
Conhecerias aquela estranha história
Do não sempre?
Quando outrem ou em ti eu
Era já de alheio esforço?
Ou saberíamos no não dizer
O medo de tamanha verdade
Se esconder
Dentro do irei contra
Mas breve, breve
Que a ordem siga e leve
Ou deixe
Por ardente
Ser
A dor do meio
M. Teresa Bracinha Vieira
2015
24.
Quando me chamaste amor
Tinha ganho a guerra a própria morte
Da saudade
Não pude ouvir-te
No tom que usaste
Por te não saber no ainda
Meu tempo fora um tanger
Minuciosamente anotado
É certo
Mas nunca ancorado
Pois teu vagar não me bastara
E tu
Quando me chamaste
Nunca leras a repetida notícia
Que perguntava onde moraria
Aquele que diligente não fora
E se fazia
Terra, clima, região e beijo
Agora
Áureo, talvez, e já sem freio
Lá
Onde as ondas jazem
Desenganos
Teresa Bracinha Vieira
2015
23.
Embora possa ser verdade
Que os deuses me deram frota
E que eu à força da espada
Enfrentei a minha rota
Nada te pode fazer pensar ou sentir
Que a rocha me não rasgou
Que o machado me não feriu
Que a lança me não tocou
Pois no peito está sempre o coração
Aquele que tanto se rompe
Nas vitórias em que morre
Nas verdades em que habita
Aquele que depois de vencido
Chama a armada de volta
E tão perdido mal se nota
Como treme, geme
E não foge
Teresa Bracinha Vieira
2015
22.
Às vezes morrer custa muito
Se nos surpreendeu o local, nome e sinal
Do rio que nos abraçava
E que eras tu o vizinho
Do outro lado da margem
E se esticasse o braço
A ponte, mantimento
Do nascer, firmeza
A que a natureza foi
Presente
Ai!, Muita vida ficou
E tu ou eu
Teresa Bracinha Vieira
2015
21.
Não quero os leves lemes
Dos outros que se partem
Em mil pedacitos
De por dentro serem secos ou podres
Não quero
O grandemente dado por certo
Que não é sequer um carinho
Quanto mais amor de alguém
Não quero estes seres sem sinal
De qualquer réstia vital
Para além das invejas e posses
Propriedades, teatros, abutres
Reinos sem qualidade, ajuntamento
De sentires, cheiros de mau pescado
Almoços fartos de mentires
Temperados por obediências cobardes
Deus ! que há muito que não quero
O que por perto ainda gira numa ira
De carrossel desatinado, tonto e tão enfartado
Que morre pedindo emprestada a morte
De outro semelhante ou igual
Teresa Bracinha Vieira
2015
20.
Um dia, um dia de era uma vez
Vi-te
Pelos mares da índia
Tua ventura de então
Seguias como quem vem
Do Olimpo
E detém o remédio da busca
Onde mora o que se procura
Olhaste sem te deteres
Para a minha mão
Asinha
No meio do mar
Que tanto tempo há ou havia
Fria e a resistir
Pirata
Cantora
Daquela canção
Cuja letra começava:
Um dia, um dia de era uma vez
A lealdade na Índia
Dera à costa sem desvio
Seguias pelos mares dessa terra
Tua verdade
Indo
E o coração sem temer
Um dia
Peritíssima rota
E depois a longa
Curva
Teresa Bracinha Vieira
2015
19.
Rio acima
Surge a nau
Dentro dela
O soneto
Saboreava a viagem
Num profundo sentimento
Sem medo
Apenas curiosidade
Leve e atenta
Por esta experiência
De contra corrente
Se fazer em força
Por força do vento
E ele, o soneto
Que revolucionara
Mundo
Ali estava
Numa última atitude
De se fazer estrada
Não exactamente a mesma
Que conhecera e percorrera
Mas esta
De se deixar ir
Pela trovadora água
Pela redondilha de ar
Belas causas
Tão indispensáveis
E só agora chegadas
Ao entender-se
No já sem tempo
Teresa Bracinha Vieira
2015