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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

  


As pinturas geométricas de Richard Gorman são certezas manifestas.


A série de pinturas, que Richard Gorman (1946) concebeu para a exposição “Kin”, (MAC, Belfast, 2014) tem como começo 3 a 5 círculos que se intersectam.


Gorman revela que estas pinturas não são conceptuais, onde um conceito ou pensamento é ilustrado e explorado visualmente. As suas pinturas são antes puras evidências. São certezas manifestas de um processo que se dá ali no seu atelier.


Na solidão do atelier, Gorman resolve problemas que nunca existiram antes de se começar a pintar. Para si, uma pintura é um conflito com a desordem, com o inesperado, com o indesejado, com a lentidão e com as limitações materiais e físicas. Uma pintura, Gorman acredita, não tem de ter uma mensagem implícita, porque assim que se começa a pintar, o que quer que seja, o significado emerge por si só. E é completamente aceitável uma pintura não contar uma história, nem representar uma ideia.


A sua pintura não implica o escavar da superfície na expectativa de se encontrar um determinado significado. Para Gorman, a superfície é já o significado. A superfície em si contém toda a lógica e todas as perguntas que a pintura coloca. A sua pintura significa que é apenas aquilo que o pintor passou o tempo a fazer. A pintura só precisa disso para existir.


O ato de pintar carrega já em si todo o sentido. A pintura é sempre o resultado de todos os gestos, materiais e pensamentos que acontecem ao pintar. E obedece às mesmas regras, e tenta responder às mesmas questões que já vêm desde o inicio dos tempos. O processo, os movimentos são tão frágeis e débeis como antes.


Apesar da variedade de soluções, a coerência de cada pintura faz sempre sentido. As possibilidades geométricas, em cada pintura de Gorman, parecem sempre inacabadas. Os círculos permitem a sugestão de formas sempre novas que se definem através das cores. Gorman explica que a primeira cor é a mais fácil e intuitiva de decidir, a segunda cor torna-se mais difícil e a terceira cor é o verdadeiro problema. E é desse equilíbrio, que se estabelece entre as cores, as formas preenchidas e os limites da tela, que vive a sua pintura (e na verdade todas as pinturas, desde sempre.)


Assim que Gorman submerge no tempo, através do ato atemporal de pintar, os problemas que surgem são simplesmente relacionados com a cor e com a forma. Os problemas são resolvidos e ultrapassados somente pelo pintor, porque é ele que determina e constrói o método e o sistema do seu mundo. E tudo é perfeitamente aceitável, dentro desses princípios cujo pintor é criador e manipulador.


Gorman explica que muitas vezes a pintura que começa com três ou mais cores aleatórias será repintada vezes sem conta. E o seu objetivo é tentar pintar sempre na tentativa de encontrar um equilíbrio precário. Um equilíbrio ligeiramente desequilibrado de cor e de forma. De maneira a tentar manter tudo como se tivesse acabado de ser pintado com a primeira camada de cor, para que não se torne demasiado acabado, refinado e polido.


A consistência da pintura de Gorman, deseja ser aconcetual, onde os signos significam simplesmente aquilo que são e não mais além. Deste modo, o equilíbrio entre as forças opostas afirma-se com mais importância e a pintura pode surgir mais enfaticamente e despreocupada tal como uma outra ordem natural, particular e única. A pintura de Gorman é assim determinada e concebida objetivamente e é o que deve ser.


Ana Ruepp