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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

POEMS FROM THE PORTUGUESE

POEMA DE SARA F. COSTA 

  


Quartos


passaram alguns meses depois de ter decorado o teu rosto
passaram alguns dias depois de saber o teu nome,
passaram algumas horas depois de deixar o teu quarto.
do meu quarto ao teu quarto o tempo é um corredor sombrio
que flutua na margem das imagens.
encontro-me deitada sobre o manto suave da espera, encontro os meandros
de um academismo fétido
um manto suave ruidoso que me consome a espera, que me arde pela espera,
embora não esteja à espera de nada, concretamente, a não ser, talvez,
de mais espera.
por dentro atravessa -me uma canalização fragilizada pelos anos.
a pele do medo faz-me escorrer pelo quarto
ou serão estas paredes rachadas pela humidade que me inundam as ideias?
na voz sinto o peso dos móveis e o peso de todas
as impressões digitais de todos os outros estudantes que como eu os utilizaram.
na boca, a memória salgada de ti, ou a memória salgada
daquilo que penso que sejas,
daquilo que eu gostaria que fosses,
daquilo que eu gostaria de ser com aquilo que eu gostaria que fosses.
o medo a contrariar a idade, o elogio do pessimismo pousado sobre a cómoda
e já passaram alguns minutos depois de te começar a odiar.


in O Sono Extenso, 2011


Rooms


a few months have gone by since I learned your face by heart
a few days have passed since I knew your name,
a few hours have gone by since i left your room.
from my room to yours time is a sombre passageway
floating on the edges of images.
i find myself lying on the soft robes of expectation, i find the meanderings
of a fetid academicism
a soft roaring robe that devours my waiting, that burns through my waiting,
though i wait for nothing, in particular, except perhaps
more waiting.
arteries weakened by the years run through me.
the skin of fear slides with me across the room
or is it my ideas being flooded by the sampness of thesed cracked walls?
in my voice i sense the burden of the furniture and the burden of all
the fingerprints of all the other students who, like me, have used it.
in my mouth, i taste the salty memory of you, or the salty memory
of what i think you are,
of what i’d like you to be,
of wthat i’d like me to be together with what i’d like you to be.
fear is stifling age, delight in pessimism is perched on the chest of drawers
and some minutes have elapsed since I started hating you.


© Translated by Ana Hudson, 2013
in Poems from the Portuguese 

 

POEMS FROM THE PORTUGUESE

POEMA DE SARA F. COSTA

  


Inocência


as manhãs primitivas
queimam o sono
e a febre crepita pela parte mais vertical das palavras.
o teu dedo sobre o meu nome faz uma pressão insuportável
e há um espasmo que percorre este texto
enquanto o inferno nos nasce lentamente no peito
como uma cobra a rastejar junto às cavidades inseguras das horas.
dos livros soltam-se faíscas
e as fogueiras cicatrizam com urgência cada respiração menos voluntária
mas há designações menos doces que outras
e há sílabas que se propõem a tentar vibrar
até ao centro da mais funda inocência.


in O Sono Extenso, 2011


Innocence


rough mornings
burn away sleep
and fever fizzes up the most vertical of words.
your finger on my name exerts agonising pressure
and a spasm runs through this text
while hell is slowly hatching inside my chest
like a snake creeping into the unsteady hollows of the hours.
sparks fly out of books
and the flames urgently heal each less intended breath
but there are assignments less sweet than others
and there are syllables set to vibrate
in the core of the deepest innocence.


© Translated by Ana Hudson, 2013
in Poems from the Portuguese