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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

CENTENÁRIO DA MORTE DE VENTURA TERRA

 

Assinala-se nesta crónica o centenário da morte do arquiteto Ventura Terra (1866-1919) relevante na época e ainda hoje pela qualidade e variedade de projetos com que enriqueceu o país, no ponto de vista da construção, desenvolvimento e enriquecimento cultural e urbano. Sendo certo que a sua obra em muito transcende as áreas de produção artística e, designadamente, os teatros e casas de espetáculo cultural, importa em qualquer caso evocar este arquiteto, a quem muito se deveu e deve na valorização arquitetónica do país, até porque a sua obra foi e é descentralizada.


Ora importa então referir que Ventura Terra deixou uma obra prestigiante no ponto de vista da qualidade arquitetónica, mas também na adequação dos projetos à política de descentralização cultural/teatral que o país lhe ficou a dever e, em muitos casos, até hoje lhe deve...


E entretanto, importa frisar que Ventura Terra esteve ligado à projeção e construção de dois teatros de relevo: o curioso Teatro Clube de Esposende e o ainda hoje muito relevante Teatro (e depois cinema) Politeama de Lisboa. E sem querer de jeito nenhum salientar apenas a descentralização, pois a própria atividade da cultura amplamente assim o merece e exige, importa ter em vista o que representam e significam estes projetos.


E desde logo, tento então sobretudo (mas não só) o significado cultural do investimento em Esposende entre os anos de 1908, data do projeto, e 1916, data da inauguração, importa inclusive ter presente o que essa iniciativa dupla significou numa política de descentralização e produção cultural. Isto, tendo inclusive bem presente a relevância notável, em todos os aspetos, do Politeama em si.


O que não obsta a que se refira com relevo a obra de Esposende, sobretudo considerando a política de descentralização teatral que envolveu. Até porque o Teatro Clube de Esposende constituiu na época um significativo investimento de descentralização cultural e de espetáculo, sendo certo que o Teatro Clube de Esposende valorizou a região e prolongou a descentralização cultural já antes prosseguida por um Teatro de Santo António que vinha do século XVIII e ardeu em 1899, sendo depois "substituído" pelo Teatro Clube.


E é então de assinalar que este Teatro serviu para instalar, a certa altura, o Museu Municipal de Esposende, um projeto do arquiteto Bernardo Ferrão. E em qualquer caso, é de referir a atualidade e utilidade do edifício e a adaptação a Museu Municipal segundo projeto de Bernardo Ferrão. Estava-se em meados da década de 80 do século passado.


O edifício em si mesmo merece referência e a adaptação então ocorrida manteve os azulejos que Ventura Terra instalou.


Quanto ao Politeama importa aqui recordar a validade e a função cultural e recreativa do Cineteatro, que em ambas as funções arcou com destaque a sua atividade. Recordo que lá atuaram gerações de figuras determinantes da cultura de espetáculo. Se virmos os dramaturgos que lá estrearam peças, reconheceremos essa função cultural: peças de Alfredo Cortez, Ramada Curto, D. João da Câmara, Raul Brandão, Júlio Dantas, interpretados em épocas diversas por nomes como Amélia Rey Colaço, Ângela Pinto, Adelina e Aura Abranches, Chaby Pinheiro, António Silva, Filipe La Féria e tantos mais...


E aqui referimos a relação direta e específica de Alfredo Cortez, grande dramaturgo do século XX, com o Politeama. Aqui estreou peças de destaque como "O Lobo" (1923), "A La Fé!" (1924) e "Lourdes" (1927). Mas a minha geração apanhou sobretudo o Politeama (mas não exclusivamente) como cinema de qualidade.

DUARTE IVO CRUZ

NOVA REFERÊNCIA A VENTURA TERRA NO CENTENÁRIO DA SUA MORTE

 

Em diversos artigos, e designadamente no anterior, evocamos Ventura Terra (1866-1919) como arquiteto de edifícios vocacionados para o espetáculo teatral. Nesta celebração do centenário da sua morte, é oportuno pois referir o Tetro Politeama, e por diversas e óbvias razões.

 

Desde logo, por se tratar de projeto arquitetónico de excecional qualidade, como aliás são todos os que Ventura Terra criou. Mas neste caso concreto, é um teatro que, em boa hora, se mantém em plena atividade, marcando desde a origem a vida cultural de espetáculo de Lisboa: é teatro, como tal foi concebido, mas durante décadas funcionou como cinema, e conciliou essas atividades alternadamente dominantes com toda a abordagem das expressões de cultura e de arte. Quantas vezes lá se realizaram concertos e outros espetáculos musicais!

 

Mas mais: inaugurado em 1912, este Teatro-Cinema Politeama, não obstante as alterações no interior, desde logo se impôs pela imponência da fachada e pela harmonia da sala de espetáculos Sendo certo que aí se registaram alterações: e aqui evocamos as frisas.

 

Mas no conjunto, a sala tal como hoje se encontra, permite a justíssima evocação da sua qualidade, notável desde a origem. E nesse aspeto, justifica-se a referência à decoração do teto e da própria sala, projetos de Veloso Salgado e de Benvindo Seia. 

 

Vale a pena recordar alguns dados históricos do Politeama e a tradição cultural que trouxe até hoje. Basta enumerar os autores que lá foram representados, e os atores que os representaram: e reportamo-nos apenas e tão só a nomes que hoje constituem património “histórico”...

 

Pois, sem querer entrar em notícias mais recentes, aqui lembramos que pelo Teatro Politeama passaram, trabalharam e fora aplaudidos artistas como Amélia Rey Colaço, Ângela Pinto, Adelina Abranches, Aura Abranches, Palmira Bastos, Chaby Pinheiro, Vasco Santana, Laura Alves...

 

E foram representados textos de D. João da Câmara, Raul Brandão, Alfredo Cortez, Ramada Curto... e aqui só evocamos, propositadamente, nomes que são “históricos” no teatro português!

 

DUARTE IVO CRUZ

TEATROS DE VENTURA TERRA NOS 100 ANOS DA SUA MORTE

 

Ocorre este ano o centenário da morte do arquiteto Ventura Terra (1866 – 1919). Já por diversas vezes aqui referimos o muito que se lhe deve na renovação da estrutura arquitetónica das salas de espetáculo a que esteve ligado, pela conceção original dos edifícios e também na renovação e atualização de outros teatros que histórica e cronologicamente o antecedem.

 

Designadamente, referimos, em artigos diversos, tanto o Teatro Politeama, como sabemos em plena atividade, ao qual voltaremos, e o Teatro Club de Esposende, este projetado em 1908 por Ventura Terra, inaugurado como teatro em 1911 e convertido em Museu Municipal em 1993, segundo projeto de adaptação do arquiteto Bernardo Ferrão.

 

 Trata-se de um edifício de notável qualidade, na fachada estreita em arco, dominada por varanda. Em boa hora a Câmara Municipal o conservou e reconverteu, mantendo a vocação cultural.

 

Ora, é de assinalar desde já que Ventura Terra transcende e aplica a sua criatividade em sucessivas criações arquitetónicas de espetáculo e de convívio público. O que incluiu especificamente a reestruturação do próprio Teatro de São Carlos, exemplo incomparável em Portugal da arquitetura das salas de espetáculo.

 

Deve-se efetivamente a Ventura Terra obras de modernização do edifício, com destaque para a primeira grande obra de restauro do setecentista Teatro de São Carlos, inaugurado em 13 de junho de 1793 com a ópera “La Ballerina Amante” de Domenico Cimarosa:  traçou diversas alterações a este teatro, modelo das casas de espetáculo da época.

 

Designadamente, nas obras de restauro efetuadas em 1908, alterou o grande foyer de entrada do Teatro e as pinturas do teto, que se deviam a Cyrilo Volkmar Machado. Mas mais relevante até hoje é a restruturação do interior, e designadamente do chamado Salão Nobre, belíssima sala de produção musical e de convívio.

 

E é de assinalar que, nesta avaliação de projetos de salas de espetáculo, encontramos Ventura Terra nas comissões que avaliaram os projetos de restauro do Teatro São João do Porto e do Teatro- Circo de Braga. Já ambos aqui referimos.

 

Como aliás já referimos a notável recuperação do chamado Teatrinho do Palácio da Brejoeira de Monção, onde se concilia a sala de pequenas dimensões, cerca de 50 lugares, com a magnitude do Palácio, desta forma valorizado também na dimensão cultural do espetáculo.   

 

Voltaremos a evocar Ventura Terra, designadamente a propósito do Teatro Politeama: e esse, como bem sabemos, mantem-se em plena e pujante atividade!

 

DUARTE IVO CRUZ

VENTURA TERRA: EVOCAÇÃO DOS TEATROS E MAIS SALAS DE ESPETÁCULO

Teatro-Nacional-S.-Carlos.jpg
Salão de entrada do Teatro de São Carlos

 

Em diversos artigos, tivemos já ensejo de evocar os 150 anos do nascimento do arquiteto Ventura Terra, ocorrido em 1866. Retoma-se hoje o tema, agora em função da exposição patente no Torreão Poente da Praça do Comércio, organizada pelo Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa.

 

Dá-se especial relevo às intervenções de Ventura Terra diretamente ligadas às artes do espetáculo, como aliás temos aqui referido, mas não só: importa efetivamente enfatizar também algumas das conceções e intervenções de Ventura Terra em projetos, aliás quase todos devidamente construídos, destinados à abordagem de grande público.

 

“Do Util e do Bello” é a epígrafe do catálogo e da própria exposição em si, coordenada por Jorge Ramos de Carvalho. E nela se destaca, no conjunto da obra vasta e variada, o sentido e o objetivo de relacionamento com o público, seja em salas e edifícios de espetáculo propriamente duto, seja em edifícios destinados, não tanto a espetáculo, mas a receber “espetadores” / visitantes: desde logo, seguindo a cronologia da exposição, os dois Pavilhões de Portugal patentes na Exposição Universal de Paris de 1900.

 

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Estas não eram salas de espetáculo, é certo: mas tanto o chamado Pavilhão das Matas, Caça e Pescas como sobretudo o Pavilhão das Colónias Portuguesas constituíram, de acordo com o roteiro do exposição, uma notável criação de espaços públicos que, como tal, deixavam adivinhar o sentido de “espetáculo” que Ventura Terra iria ao longo da vida sucessivamente concretizar.

 

Em sucessivos textos que aqui já publicamos, faz-se referência detalhada ao Teatro Politeama, ao Teatro Clube de Esposende, ao átrio do Teatro de São Carlos (onde se suprimiram os frescos do teto de Cyrilllo Volkmar Machado) e ao Teatrinho do Palácio de Brejoeira (Monção). Mas o catálogo-guia da exposição que agora vimos citando, destaca ainda edifícios que, não sendo evidentemente salas de espetáculo, expressam uma vocação funcional de grande ajuntamento de participantes, e como tal exigem o sentido de “assistência coletiva”, chamemos-lhe assim, que as salas de espetáculo representam.

 

E desde logo o chamado na época Palácio das Cortes, em São Bento, como tal inaugurado em 1833 mas totalmente reformulado por Ventura Terra em 1885/1886, numa modernização epocal que dura até hoje e que incluiu o desenho do mobiliário e do equipamento, então extremamente atual.

 

Em 1902 surge a Sinagoga de Lisboa aliás muito próxima da casa do próprio Ventura Terra, casa que lhe valeu o Prémio Valmor de 1903.

 

O catálogo da exposição documenta também um esplendoroso projeto de Palácio do Congresso do Rio de Janeiro, que não chegou a ser construído.

 

E finalmente, refere os Liceus Camões (1907) e Maria Amália Vaz de Carvalho (1915), o que pode ser relacionado com o carater coletivo das “exibições” dos professores…

 

O catálogo da exposição, para além de estudos diversos, contem uma exaustiva tabela cronológica da vida e obra de Ventura Terra. Aí encontramos as funções político-administrativas que ao longo da vida desempenhou, com destaque para a Câmara Municipal de Lisboa, onde foi vereador por iniciativa de Bernardino Machado, de 1908 a 1913 e novamente em 1917.

 

No quadro dessas funções, remete-se para um documento da CML, datado de 28 de Agosto de 1909 e citado por Rute Figueiredo no seu estudo sobre “Arquitetura e Discurso Crítico em Portugal (1893-1918). – (ed. Colibri e HIA – FCSH da UNL págs. 252-252).

Lê-se no referido documento:

“Tendo a Câmara Municipal de Lisboa na sessão de 12 do corrente, tomado em consideração uma proposta do Ex.mo Sr. Vereador Ventura Terra a fim de melhorar quanto possível os serviços relativos à estética da cidade de Lisboa e o seu conforto sob o ponto de vista artístico, principalmente no que respeita à construção e conclusão de avenidas, praças, jardins, etc., e ao aproveitamento das suas magníficas perspetivas, foi pela mesma Câmara criada Cuma Comissão de Estética Municipal.

Ora, nessas “magníficas perspetivas” se inscrevem os teatros de Ventura Terra, e não só em Lisboa!...

 

ventura terra.jpg

 

DUARTE IVO CRUZ 

 

 

 

 

 

 

Evocação dos Teatros de Ventura Terra nos 150 anos do seu nascimento

 

Já tivemos aqui ocasião de referir o Teatro Politeama, obra referencial do arquiteto Ventura Terra no que toca a edifícios de teatro. Importa agora, no âmbito das comemorações dos 150 anos do seu nascimento, recordar outros projetos e edifícios relacionados com o espetáculo teatral.

Realça-se então a própria estrutura e vocação arquitetónica em si, mesmo nos casos em que os projetos e edifícios de Ventura Terra foram, ou alterados (caso do Politeama) ou pura e simplesmente reaproveitados para outras atividades: e menos mal quando se matem a vocação cultural e patrimonial respetiva.

Veja-se então o Teatro Clube de Esposende. O projeto de Ventura Terra é de 1908, mas só decorridos alguns anos o teatro entrou em funcionamento. Vale a pena recordar que a esplendorosa fachada do Politeama data de 1912/13. E é interessante o cotejo entre os dois edifícios. Muito mais pequeno o de Esposende, ainda assim a fachada em arco de janelas, independentemente da dimensão indicia, nos arcos e varandas, uma expressão arquitetónica semelhante. Mas a função cultural - social de ambas as salas converge: e assumiu obvia maior representação urbana no Teatro Clube, pois é o único na cidade.

E importa ainda salientar a convergência estilística de ambas as fachadas, independentemente das dimensões de cada um dos edifícios e da função cultural que na origem desempenharam. Isto, sem querer obviamente comparar a relevância de cada uma das cidades… Mas é notável, isso sim, a iniciativa arquitetónica e, repita-se, cultural convergente: e grande diferença obviamente marcava o cotejo socioeconómico de Lisboa e de Esposende no início do século.

Tenha-se no entanto presente uma curiosa tradição de edifícios de espetáculo teatral na então vila piscatória de Esposende, anteriores portanto ao Teatro Clube de Ventura Terra. Com efeito, assinala-se a existência de um Teatro de Santo António, destruído por um incêndio em 1899.

E mais: segundo recorda Manuel Albino Penteado Neiva, há registo de atividades para-dramáticas na então vila piscatória de Esposende desde pelo menos o século XVIII (in “Esposende- Paginas de Memórias” – ed. CM Esposende - 1991). E por seu lado, Ivone Batista de Magalhães realça a decoração arte-nova da fachada, referindo em particular os balcões sobrepostos e as mísulas que suportam expressões de máscaras tradicionais na arte do teatro (in “Um Programa de Conservação Preventiva para o Museu Municipal de Esposende” – Universidade do Porto - 2002).

O Teatro Clube de Esposende teve um destino no mínimo insólito. No início dos anos 80 do século passado funcionava como armazém de uma empresa de têxteis e confeções: mas houve o mérito de conservar a fachada e os frisos de azulejos que Ventura Terra instalou no interior. Entretanto a Câmara Municipal adquiriu o edifício e instalou lá Museu Municipal, segundo projeto do arquiteto Bernardo Ferrão, garantindo assim a vocação cultural, e salvaguardando a traça exterior de Ventura Terra.

E esclareça-se ainda que a intervenção de Ventura Terra no património de salas de espetáculo não ficou por aqui. Para além do Politeama, há que registar a colaboração na recuperação do Teatro de São Carlos, como aliás também já vimos nesta série. E mais: participou nas Comissões que avaliaram os projetos do Teatro Circo de Braga e do Teatro São João do Porto.

E finalmente: é-lhe atribuída a recuperação do chamado Teatrinho do Palácio da Brejoeira, em Monção, imponente edifício contruído entre 1806 e 1834, segundo a traça de Carlos Amarante, e posteriormente restaurado e valorizado pela inclusão do Teatro.

Cito, a terminar, o que escrevi sobre este pequeno teatro, atribuído, repita-se, a trabalhos de Ventura Terra.

“O Teatrinho, algo como 50 lugares em suave declive, além de mostrar os interesses culturais do proprietário, revela ainda hoje, por conta de um restauro e conservação exemplares, uma harmonia e uma ambiência que se concilia com a funcionalidade do palco, não obstante as reduzidas dimensões. E acresce, a reprodução em telão da própria fachada do palácio”  (in “Teatros em Portugal – Espaços e Arquitetura” ed. Mediatexto e Centro Nacional de Cultura – 2008).

Um comentário final de enquadramento histórico:

José Augusto França refere “uma invenção mais parisiense” no “ecletismo” da obra e do estilo de Ventura Terra (e de Norte Jr., que já referimos nesta série – cfr. José Augusto França – “O Modernismo na Arte Portuguesa” ed. ICLP). No contexto do que acima se descreveu, essa intervenção modernista marca e valoriza sobremaneira, até hoje, o estilo urbano de tantas e tantas cidades, como, neste caso, Esposende.

 

DUARTE IVO CRUZ