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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Da Arte de Maternar de Zuleide Duarte

 

Revisitando o livro «Da Arte de Maternar» de Zuleide Duarte  - Doutora em Letras e Professora de Literaturas Lusófonas.

Existe todo um edifício por Zuleide construído para que este seu livro se erga no contar dos contos – inquestionavelmente chegados ao mundo das perceções maduras - e no objetivo que os leve a que deles se retirem as coincidências, muitas delas verificáveis no agrupar de realidades só aparentemente distintas, pois que entre todas, a conotação de mundo é a oposição fundamental.

Creio que Zuleide Duarte agrupa, um conjunto de acontecimentos-sentires e doa-os à adivinhação de quem os lê, como prova de quem expõe uma visão até então oculta, mas provocadora. Materna, Zuleide Duarte expõe presenças astrais como manifestas redes de afeto, propícias ao código corajoso exposto no conto «Não era daqui».

Todavia, quando leio « Náufragos» encontro uma deslocação de palavras que se quedam antes de uma hipotética erosão que seria, no meu entender, profícua. Dito de outro modo, eventualmente, aos caminhos incontáveis, sem espias, sem censuras, as palavras do conto que me retém por ora, não seriam, por excesso, levedadas se levassem o leitor a uma ideia de maior viagem, de modo a que as suas interrogações o colocassem, sem receio, a admitir, o quanto   se encontraria disposto ao seu próprio questionar face à expressão com que se finaliza este conto: «como no princípio». E eis o desafio de Zuleide.

Insisto que se descobre neste livro de Zuleide Duarte uma imensidão de impulsos, deliberadamente contidos, e que os mesmos são fonte de uma itinerante exploração interior que, de tão madura, pressupõe em quem os escreve que, quem os lê, compreenderá que tal contenção é fruto de uma comunidade nativa de saberes que sobrevive intacta à visita dos olhos das palavras com que se exprime.

 Atitude arrojada esta. 

Tenho para mim que a extrema explicação subjuga fatalmente o cerne do explicar. Fatalmente também o discurso excessivamente analítico adulterará ou destruirá a vitalidade do seu objeto. Neste caso, a Escritora sabe-o. Mais: tem pleno conhecimento da barbárie narrativa que um conto pode conter e daí o deitar mão ao refreamento que a palavra também sustém se sustida num  hífen de precaução.

Jaci Bezerra, com quem partilho a noção precisa da capacidade de concisão vertida neste livro de contos, refere também um corrosivo senso de humor, tão refrescante à inteligência da escrita.

Deste modo, convivo com o humor que Zuleide Duarte utiliza nesta sua escrita, pois deste humor faz parte uma outra arte: refiro-me à da clareza do discernir em coragem.

Entendo dever referir ainda o quanto o título do último conto deste  livro «Da Arte de Maternar», nos oferece um contrato de esperança subtil pois, se esta rua fosse minha (...) por mais que apurasse o ouvido, não encontrava o fiu fiu nos sons que acudiam ao seu chamado.

E não será que no chamento da lua ao mar é como se a vida se demorasse num instante de sofreguidão e nos desse no peito de maternar um oceano, um mar, a agua imensa de uma lágrima que de timida se oferece à explicação?

 

Teresa Bracinha Vieira