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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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TRINTA CLÁSSICOS DAS LETRAS

 

"AS VIAGENS DE GULLIVER" DE J. SWIFT (XVII)

 

Jonathan Swift (1667-1745) foi um clérigo e polemista irlandês, Reitor da Catedral de S. Patrício em Dublin, que se celebrizou ao ter criado a personagem de Lemuel Gulliver, que está presente na literatura juvenil dos últimos séculos. No entanto, Swift não escreveu para deleite dos mais jovens, mas como severo crítico da sociedade em que viveu. À distância do tempo, não reconhecemos os que severamente procura atingir, mas fica o carácter irónico de uma sociedade de seres caricatos. Ora, são os seus contemporâneos que Swift considera quase desprezíveis, cheios de si, marcados pela soberba e pela inveja e incapazes de se aperceberem dos seus defeitos incorrigíveis. Por exemplo, o critério para dividir as opções políticas tinha a ver não com a razão, mas com o lado pelo qual cada um deveria partir um ovo… O título por que a obra ficou mundialmente conhecida é “Gulliver's Travels”, mas o título original da edição de 1726, alterada em 1735, é “Travels into Several Remote Nations of the World. In Four Parts. By Lemuel Gulliver, First a Surgeon, and then a Captain of Several Ships”. Trata-se de um romance satírico, escrito por alguém que esteve na esfera política dos Whigs (liberais) e depois passou para os Tories (conservadores). As edições mais popularizadas limitam-se a reproduzir a primeira parte da obra (sobre 1699), onde se fala de Lilliput, ilha fictícia que faz parte de um arquipélago algures no Oceano Índico, de que também faz parte a ilha de Blefuscu, com a qual os liliputianos estão em guerra. Aliás, Lemuel Gulliver ajuda os Lillipputianos a vencer os seus vizinhos de Blefuscu ao tomar a sua frota. Contudo, recusa a reduzir Blefuscu à condição de colónia de Lilliput, o que causa profundo desagrado ao rei e à corte. Tanto basta para que Gulliver caia em desgraça, sendo acusado de alta traição, pelo que é condenado a perder a visão. Todavia, com a ajuda de um amgo, dignitário da corte, consegue fugir para Blefuscu, onde encontra um barco abandonado e consegue ser salvo. A segunda aventura (1702-1706) passa-se em Brobdingnag, terra de gigantes, situada na América do Norte. Lemuel é exibido como um anão em espetáculos, que o deixam doente, e é vendido à rainha, ficando ao cuidado da filha do fazendeiro que o explorara. Como Gulliver é pequeno demais, a rainha de Brobdingnag ordena a construção de uma casa pequena para que ele possa ser transportado, a que chama "caixa de viagem". Depois de diversas peripécias, uma águia rouba a caixa e larga-a numa praia o que permite o retorno a Inglaterra. Entre 1706 e 1710, Gulliver passa por Balnibarbi, um reino governado por Laputa. A burocracia, a Royal Society e os excessos da procura científica são severamente criticados. Na Grande Academia de Lagado, muitos recursos são gastos em procuras absurdas, como a busca de raios de sol a partir de pepinos ou o desmascaramento de conspirações políticas pela análise do excremento dos suspeitos. Enquanto aguarda a partida para o Japão, visita em Glubbdubdrib a casa de um mago louco que discute história com fantasmas, como Homero, Aristóteles, Júlio César, Caio Bruto e até Descartes. Na ilha de Luggnagg, encontra os “struldbrugs”, que são imortais, e já no Japão consegue do Imperador o privilégio de não ter de abjurar o cristianismo. Por fim, entre 1710 e 1715, Gulliver volta ao mar, mas é vítima dum motim a bordo e é abandonado num bote. Encontra uma raça de humanoides selvagens e depois os Houyhnhnms, uma raça de cavalos falantes, que governam e subjugam os humanoides Yahoos. Swift é mestre das distopias e Gulliver é testemunha privilegiada dos defeitos da humanidade.

 

Agostinho de Morais